COSMOVISÕES COMPARADAS 2. Prof Ivan S Rüppell Jr, Seminário presbiteriano do sul - extensão Curitiba, IPB.
O PROBLEMA DO MAL. O filósofo Epicuro, cujos seguidores se encontravam no areópago na palestra do Apóstolo Paulo sobre o Deus Criador, Sustentador, Soberano, Pai e Juiz, foi um pensador que levantou as questões sobre a impossibilidade de Deus ser Bom e Todo Poderoso, e de sua Pessoa "conviver" com o Mal; pois segundo ele, ou Deus era Bom e fraco, ou Deus era Poderoso mas não era bom, já que a existência e atuação do mal na criação e existência comprovariam tal posição. Conforme Nash, ao tratar do Problema do Mal como tem sido elaborado nos últimos séculos pelos pensadores humanistas; "o mal faz a balança das probabilidades pesar contra o teísmo; a existência do mal torna a crença teísta improvável ou implausível." Nesse contexto, o pensamento cristão propõe desde que Deus "permite o mal para tornar possível um bem maior, ou para evitar algum mal maior", e também, se referem "ao valor e a importância do livre-arbítrio humano", posto que essa experiência dos homens é uma disposição aprovada por Deus, bem como suas consequências. Há ainda, cristãos que entendem que a humanidade vive "num universo organizado e governado por leis, como uma razão plausível para alguns tipos de mal", compreendendo que há tanto um ambiente ordenado e organizado, quanto uma humanidade com liberdade de ação, sendo uma situação em que uma realidade propicia a experiência da outra; conforme Michael Peterson: "essa mesma água que sustenta e refresca também pode afogar." Também é possível destacar o entendimento de que a experiência do mal faz parte de um processo de aprendizado em que Deus está gerando uma espécie humana virtuosa na história, sendo necessário haver um ambiente de "riscos, perigos e frustrações" para que as pessoas possam evoluir, sendo esse o motivo para Deus nos criar pra viver nessa situação. O pensador cristão reformado Plantinga Jr, faz o seguinte destaque em meio a essas reflexões: "Por que supor que se Deus realmente tem uma boa razão para permitir o mal, o teísta seria o primeiro a saber? Talvez Deus tenha uma boa razão, mas esta razão seja muita complicada para entendermos. Ou talvez ele não a tenha revelado por alguma outra razão. O fato de que o teísta não sabe por que Deus permite o mal é, talvez, um fato interessante sobre o teísta, mas, por si só, mostra pouco ou nada de relevante para a racionalidade em Deus." Em meio a essa intensa reflexão, que traz muitas outras abordagens e pensamentos, Plantinga Jr destaca que, "todos os oponentes do cristianismo histórico, ao que parece, levantam o problema do mal como uma forma de desafiar a crença cristã em Deus", ainda que muitos intelectuais defensores de certos tipos de movimento, como o naturalismo, não tenham qualquer condição racional de fazer esse tipo de argumentação, já que "bem e mal num universo naturalista não podem se referir a qualquer coisa transcendente, qualquer coisa que tenha posição fora da ordem natural das coisas." Da mesma forma, o pensadores contrários ao Cristianismo que defendem a visão panteísta, também chamado de movimento de Nova Era, incluindo religiões orientais, encontram-se no seguinte dilema: "se tudo é um, isto é, parte de um sistema integral, então esse Um ou Deus (ou como quer que se chame isso) acaba estando acima do bem e do mal. (assim), poderíamos nos perguntar como alguém influenciado pelo panteísmo pode consistentemente lançar contra os cristãos o desafio do problema do mal", já que para eles essa questão está distanciada e lançada ao acaso ou ao destino ou para a historia, conforme suas convicções. Portanto, "ao que parece, as únicas pessoas que podem consistentemente enfrentar o problema do mal são pessoas, como os cristãos, que acreditam que o bem e o mal não são nem relativos, nem ilusórios. Certamente parece que muitos defensores de cosmovisões não cristãs são culpados de inconsistências quando falam sobre o mal da forma que haveriam de falar se, de fato, algum problema existisse", conclue nosso autor.
(p 137-146, 2012)
Do excelente livro Teologia sistemática, histórica e filosófica de Alister McGrath, extraímos agora pensamentos e citações relevantes ao desenvolvimento do pensamento no Ocidente nos últimos cinco séculos, além de reflexões referentes ao Cristianismo e sobre movimentos intelectuais diversos. Sobre o modo como Deus age no mundo, e dessa forma, como se compreende a realidade e o movimento histórico e transcedente da realidade, destacamos posições variadas, como, o Deísmo, em que "Deus age por intermédio da natureza", de forma que a "posição deísta pode ser resumida" no entendimento de que Deus agiu criando o universo "de forma ordenada e racional", num espelho da pessoa divina, sendo que agora, toda ordem e regularidade do mundo está disponível para a compreensão do homem, pois "as leis da natureza foram estabelecidas por Deus; e apenas restava a um ser humano brilhante descobri-las", conforme declaração de Alexander Pope: "A natureza e suas leis escondem-se na noite. E disse Deus, que haja Newton, e tudo se transformou em luz." "O deísmo defendia a ideia de que Deus havia criado o mundo, dotando-o com a capacidade de evoluir e funcionar sem que houvesse a necessidade da contínua presença e interferência de Deus. Essa perspectiva", bastante influente especialmente no século 18, "via o mundo como um relógio, e Deus como um relojoeiro. Deus havia dotado o mundo como um modelo auto-sustentável para que pudesse funcionar sem a necessidade de sua contínua intervenção." E assim, diante da pergunta, "Como Deus agiria no mundo? A resposta para essa pergunta é bastante simples: Deus não age no mundo." Deus criou todo o sistema e o ordenou e o colocou em movimento, criando um mundo "completamente autônomo e auto-suficiente. Não é necessária nenhuma ação da parte de Deus." (...) Ainda sobre o tema de como Deus age no mundo, temos o "Tomismo", em que "Deus age por intermédio de causas secundárias". O entendimento do teólogo da Idade Média percebe que Deus age utilizando "causas primárias e secundárias", enfatizando que Deus não age diretamente, mas através dessas causas. Assim, para que um grande pianista possa realizar um grande concerto, é preciso tanto a causa primária, o pianista, como a causa secundária, um piano afinado: "a capacidade da causa primária para alcançar o efeito desejado depende da causa secundária a ser usada." Tomás de Aquino reflete a partir desse entendimento sobre o problema do mal: "O sofrimento e a dor não devem ser atribuídos à ação direta de Deus, mas sim à fragilidade e à debilidade das causas secundárias por meio das quais Deus opera. Deus, em outras palavras, deve ser visto como a causa primária, e os vários agentes que existem no mundo, como as causas secundárias a ele relacionadas. (...) O autor faz uma reflexão importante, pois destaca que no pensamento de Aristotéles, em que se baseia a compreensão inicial, mas não total, de Aquino, "as causas secundárias são capazes de agir por si próprias. Os elementos naturais são capazes de agir como causas secundárias em virtude de sua própria natureza", sendo importante salientar que teólogos renomados eram contra essa concepção aristotélica, inclusive Aquino, "que alegava ser Deus o "impulso ontológico inicial", a causa principal de toda ação, sem a qual nada poderia existir... Assim, a interpretação teísta das causas secundárias apresenta a ação de Deus no mundo da seguinte forma. Deus age de maneira indireta no mundo, por meio das causas secundárias. Pode-se notar a existência de uma grande cadeia de causalidade, que aponta para Deus como o impulso originário e principal de tudo o que acontece no mundo. Entretanto, ele não age diretamente no mundo, mas por meio de uma cadeia de eventos que Deus inicia e controla." Aquino parece entender que Deus inicia uma cadeia de ações sob sua orientação, e que a partir daí, Deus "delega a ação divina às causas secundárias existentes dentro da ordem natural. Por exemplo, Deus pode mover a vontade do homem de forma que alguém que esteja doente receba assistência"; assim, uma ação que é da vontade divina será realizada de forma indireta, sendo que a mesma será causada por Deus, mediante uma causa secundária. Nessa visão, Deus age e se mantém atuante durante todo o processo, embora surjam reflexões diversas sobre o modo como isto ocorre. Nesse contexto, iremos estudar nas últimas aulas a compreensão de Calvino nas Institutas e citações da Bíblia de Genebra, sobre o Governo de Deus e as causas secundárias etc. (McGrath, p 222, e 336-338, 2006).
Segue breve síntese de todo o movimento em que os fundamentos do conhecimento da humanidade no ocidente vieram a ser transformados gravemente, gerando transformações e novidades nas Cosmovisões ocidentais: "A Renascença ou Renascimento foi um movimento de renovação cultural que surgiu no século 14 na Europa, vindo a formar a cosmovisão ocidental da Idade Moderna a partir de elementos clássicos greco-romanos. A maior mudança ocasionada por este movimento foi colocar o ser humano no centro da sociedade, com suas reflexões e aspirações, capacidades e projeções, retirando das mãos da Igreja a condição de definir a maneira como a civilização deveria entender a realidade e organizar o mundo. Foi neste contexto que a Europa viu surgir o humanismo, um movimento de “retorno às fontes”, que buscava entender o modo como os clássicos se expressavam culturalmente. (...) Analisamos a teoria do conhecimento; a Epistemologia, que deseja compreender o modo como a humanidade pode conhecer a realidade, sendo que a Idade moderna foi marcada pelos debates entre dois ramos com pensamentos distintos acerca desta teoria: o racionalismo, de René Descartes, que entendia que o conhecimento pode ser apreendido somente pela razão humana, na perspectiva de Platão; e o empirismo, de John Locke, que acreditava que o conhecimento é oriundo da observação do mundo exterior, com bases em Aristóteles.
As proposições racionalistas que entendiam que a lógica compreensão da realidade traria um conhecimento definitivo para a humanidade acerca da existência, foram colocadas em dúvida pelo filósofo Immanuel Kant, que buscou levantar dados acerca da complexidade e dos limites do alcance da teoria do conhecimento.
Ao mesmo tempo, enquanto os intelectuais e filósofos da modernidade buscavam explicar racionalmente a existência de Deus, o movimento cultural do Iluminismo, que seria preponderante no século 18 na Europa, iria confrontar radicalmente tanto a autoridade da Igreja, quanto da monarquia; pois desenvolvia um projeto intelectual que buscava superar as concepções de mundo medievais, vindo a formatar os valores do pensamento moderno da humanidade.
A publicação da obra “Enciclopédia”, por Denis Diderot, tornou-se um dos marcos do Iluminismo, sendo que a orientação era de que fosse utilizado somente o raciocínio lógico na feitura de seus textos acerca dos temas mais diversos. Essa proposição se tornou uma importante distinção deste movimento em contraponto às reflexões do Renascimento, pois o pensamento iluminista buscou questionar e criticar amplamente as doutrinas da Igreja Cristã; sendo que o Cristianismo buscou responder tais indagações através de formulações mais racionais, através de um movimento que ficou conhecido historicamente como “protestantismo liberal”." (Ruppell Jr e Andrade, 2020)
REFERÊNCIAS. Goheen, Michael W e Bartholomew, Craig G. Introdução à Cosmovisão Cristã. São Paulo, Vida Nova, 2016. McGrath, Alister. Teologis sist, hist e filosófica. Sheed Publicações, São Paulo SP, 2005. Nash, Ronald. Cosmovisões em conflito. Brasília, Edit Monergismo, 2012. Leite, Carvalho e Cunha (org). Cosmovisão Cristã e Transformação. Carlos Souza, artigo. Viçosa,MG, Edit Ultimato, 2006. Kuyper, Abraham. Calvinismo. São Paulo, Edit Cultura Cristã, 2003. Ruppell Jr, Ivan Santos e Andrade, Marli. O Cristianismo e a Civilização Ocidental. Edit Intersaberes, Curitiba Pr, 2020.
Esse texto tem objetivo didático na disciplina de Símbolos de Fé no Seminário Presbiteriano do Sul extensão Curitiba. Daí a utilização de resumos e citações mais longas no interesse de oferecer aos alunos o conteúdo apropriado para o entendimento necessário aos debates e explanações em aula. CONTEÚDO de Aula: CONTEXTO HISTÓRICO DA ORGANIZAÇÃO DOS SÍMBOLOS DE FÉ DA IGREJA PRESBITERIANA DO BRASIL. TEOLOGIA REFORMADA. "Trata-se da teologia oriunda da Reforma (calvinista) em distinção à luterana. O designativo "reformada" é preferível ao calvinista... considerando o fato de que a teologia reformada não provém estritamente de Calvino." (Maia, p. 11, 2007). OS CREDOS E A REFORMA. "Os credos da Reforma são as confissões de fé e os catecismos produzidos nesse período ou sob sua inspiração teológica. Os séculos 4 e 5 foram para a elaboração dos credos o que os séculos 16 e 17 foram para a feitura das confissões e dos catecismos. A razão parece evidente: na Reforma, as...
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