terça-feira, 31 de julho de 2018

DEUS GOVERNA O MUNDO ATRAVÉS DOS BONS E DOS MAUS: as INSTITUTAS do Cristianismo de J CALVINO, Vol 6, um resumo do Resumo de JPWILES

A obra teológica “Institutas” do reformador protestante João Calvino contém uma explicação completa do conhecimento de Deus segundo o Cristianismo. O tema deste sexto e último volume do Livro I é: DEUS GOVERNA O MUNDO ATRAVÉS DOS BONS E DOS MAUS. O texto a seguir é o volume 06 de 20, deste breve resumo extraído do Resumo de J. P. Wiles, escrito no ano de 1920 (Ensino sobre o Cristianismo – uma edição abreviada de AS INSTITUTAS DA RELIGIÃO CRISTÃ, Publicações Evangélicas Selecionadas, São Paulo/SP) As citações em destaque são do Resumo de Joseph Pitts Wiles. 17: O EMPREGO DA DOUTRINA DA PROVIDÊNCIA DIVINA. “Ao controlar todas as coisas pela Sua providência, Deus às vezes opera mediante causas secundárias, às vezes sem elas, outras vezes até mesmo contra elas.” (p 93). Deus governa toda a humanidade através das bênçãos e disciplinas de Sua providência, em especial a sua Igreja, embora seus atos ocultos transmitam a ideia de que tudo acontece por acaso. O que não deveria nos impedir de reconhecer junto com Davi que Deus tem o controle completo de todas as coisas: “Quão grandes, Senhor, são as tuas obras! Os teus pensamentos, que profundos! Que preciosos para mim, Senhor, são os teus pensamentos! E como é grande a soma deles! Se os contasse, excederiam os grãos de areia: contaria, contaria, sem jamais chegar ao fim.” (Sl 139. 17-18). Sempre que sofremos alguma aflição é necessário procurar a causa em nossos pecados, buscando logo o arrependimento, embora Jesus ensine que Deus sempre supera o ato de transformar nossas aflições em disciplinas, quando ensina acerca do cego de nascença: “Nem ele pecou, nem seus pais; mas foi para que se manifestem nele as obras de Deus”. (João 9.3). Eis uma situação em que vemos a glória do Pai como se a enxergássemos por um espelho, pois não se pode exigir que Deus preste contas a nós, ao contrário, devemos honrar os seus conselhos e a sua vontade soberana. A doutrina da Providência de Deus requer humildade para aqueles que a estudam, pois trata-se da Personalidade e caráter do próprio Deus do Universo. Observe que muitos homens não aceitam que Deus governe o mundo desta maneira, pois a razão deles é contrariada nisto, e por isso atacam o nome do Senhor. Até buscam não fazer isto diretamente, afirmando somente que não concordam com a exposição das Escrituras que temos feito; porém, ao negar que o Senhor governa tudo que existe, não conseguem explicar como a própria Palavra de Deus reconhece o quão profundas são estas verdades: “Ó profundidade da riqueza, tanto da sabedoria como do conhecimento de Deus! Quão insondáveis são os seus juízos e quão inescrutáveis os seus caminhos!”. É necessário entender que muitos mistérios da Lei e do Evangelho são revelados ao povo de Deus assim que o Senhor nos ilumina na caminhada, como se fossemos amparados por uma lâmpada. Pois o que é profundo e insondável acerca do conhecimento do Senhor - na verdade, é o modo admirável como Deus governa o mundo. Conforme Moisés: “As coisas encobertas pertencem ao Senhor nosso Deus; porém as reveladas nos pertencem a nós e a nossos filhos.” (Dt 29.29). “A mente assim temperada para a reverência e a humildade não murmurará contra Deus por causa das calamidades que sobrevieram à humanidade em tempos passados; nem culpará Deus por crimes que o homem cometeu, dizendo com Agamenom na Ilíada: “A culpa não é minha; Os culpados são o Céu e o Destino.” O homem de coração humilde preferirá buscar a vontade de Deus, e cumpri-la mediante a ajuda do Seu Espírito.” (p 95). Salomão ensina que os projetos futuros do homem operam em conjunto com a providência de Deus: “O coração do homem traça o seu caminho, mas o Senhor lhe dirige os passos.” (Pv 16.9). E aqui aprendemos que é necessário exercer providência por nós mesmos, ao mesmo tempo em que colocamos toda nossa existência nas mãos de Deus. Pois Deus também nos responsabilizou por ela, para que cuidemos dela com precauções e toda assistência. “Se Deus entregou a nós o cuidado da nossa própria vida, devemos zelar por ela; se fornece meios, devemos usá-los; se nos adverte de antemão dos perigos, não devemos temerariamente correr ao encontro deles; se fornece remédios, não devemos negligencia-los.” (p 95). Mas cuidado com a falsidade e o engano acerca deste conhecimento, pois todo homem que roubar alguém que Deus colocou em pobreza, e todo homem que assassinar aquele para quem o limite da vida definido por Deus já chegou; pois bem, saibam que estes criminosos não estão “sujeitos à vontade de Deus”. Mas sim, a seus próprios desejos malignos. Um coração cristão sempre irá reverenciar o Senhor em primeiro lugar pois sabe que tudo está sujeito ao seu governo. Mas não irá ignorar as causas secundárias. Pois Deus irá mover e direcionar, fazer acontecer e frustrar os planos dos bons e dos maus, cuidando sempre da segurança dos cristãos: “Confia os teus cuidados ao Senhor, e ele te susterá; jamais permitirá que o justo seja abalado (Sl 55.22); e igualmente conforme 1 Pedro 5.7, Salmo 91.1, Zacarias 2.8 e Isaías 49.15. Pois Jesus afirma que nem um pardal cai por terra a não ser pela vontade de Deus, só para esclarecer que maior cuidado o Senhor do Universo tem pelas nossas vidas, sempre! Os corações dos homens estão sob o controle de Deus, pois “Ele deu aos israelitas graça aos olhos dos egípcios. Derrotou o conselho de Aitofel quando este ameaçava destruir Davi. O diabo nada podia fazer contra Jó sem a permissão divina.” (p 97). “O conhecimento de tais verdades como estas, nos tornam gratos na prosperidade, pacientes na adversidade e maravilhosamente confiantes da nossa segurança futura.” Quando os homens são bondosos conosco, sabemos que Deus lhes moveu assim para nós. E durante as boas colheitas, saberemos que Deus igualmente agiu nos céus, na terra e nos seus produtos (Oséias 2.21-22). Durante as dificuldades, iremos olhar para Deus e seu governo delas, a fim de andar com paciência e submissão; como fez José, que ao viver suas lutas debaixo da providência de Deus, perdoou seus irmãos, reconhecendo que Deus transformara todo aquele mal em bem. “Mas embora a vontade de Deus seja a grande causa primária, assim como está escrito; “Eu formo a luz, e crio as trevas; faço a paz, e crio o mal; eu o Senhor, faço todas estas coisas.” (Isaías 45.7), nenhum homem piedoso fechará seus olhos às causas secundárias.” Ao mesmo tempo em que honramos a Deus pela bondade dos homens, também seremos gratos às pessoas que são boas conosco. “Se sofrer perda mediante sua própria negligência ou descuido, culpará a si mesmo, embora reconheça nisto a mão de Deus.” (p 97). Pois ainda que Deus determine o tempo de duração da vida dos homens, a negligência pela falta de cuidado com os doentes é uma responsabilidade humana. “Não fará abuso da doutrina da providência de Deus para apresentar desculpas por nenhum pecado.” O cristão deve ficar atento às causas secundárias especialmente quanto ao seu futuro, aproveitando o que a bondade de Deus lhe oferece para se proteger, cercando-se de conselhos e toda assistência, utilizando tudo que a providência divina fornece à existência humana. Somente assim ficaremos livres da presunção da soberba, voltando-nos para a oração e para a confiança que nos coloca junto de Deus em meio aos perigos. “Nisto aparece a felicidade inestimável daqueles que temem a Deus. A vida do homem é ameaçada por inúmeros perigos.” (p 98). Nosso próprio corpo carrega milhares de germes e doenças, e em qualquer lugar e situação a morte está por perto – nos meios de transporte e viagens, caminhando ao sair de casa ou utilizando talheres. Até dizemos que raramente tais desgraças ocorrem conosco, mas a verdade é que elas acontecem neste mundo, sim. Eis o motivo pelo qual não devemos viver debaixo do medo do acaso, pois seria uma existência miserável. Nesta cosmovisão, o homem cristão irá buscar refúgio da opressão emocional nas próprias mãos de Deus, a fim de se consolar no governo da vontade e do poder daquele que faz tudo se cumprir conforme sua ordenação. Diz o salmista: “Pois ele te livrará do laço do passarinheiro e da peste perniciosa. Cobrir-te-á com as suas penas, sob suas asas estarás seguro...”. (Sl 91). E ainda, “O Senhor é o meu auxílio, não temerei; que mal poderá fazer o homem?” (Hb 3.6). Devemos lembrar que tanto o diabo quanto os homens maus somente irão pensar e agir maldosamente contra nós “na medida em que Deus permite, ou melhor, ordena.” (p 99). Eis a razão pela qual ignorar a Providência de Deus é a maior das infelicidades! Agora, “é necessário notar algumas passagens das Escrituras que parecem subentender que o propósito de Deus é mutável. Às vezes o arrependimento é atribuído a Ele: “Então se arrependeu o Senhor de ter feito o homem.” (Gn 6.6). “Arrependo-me de haver constituído rei a Saul.” (1 Sm 15.11). “Se a tal nação se converter da maldade contra a qual eu falei, também eu me arrependerei do mal que pensava fazer-lhe.” (Jr 18.8). Pois parece que ao tomar conhecimento de que Deus cancela seus decretos - como para a cidade de Nínive, ou quando informa para Ezequias que ele iria morrer - e então lhe acrescenta outros 15 anos de vida; logo entendemos que as ações de Deus parecem não estar bem definidas; e que Ele prefere governa-las momento a momento, segundo o transcorrer das situações. “Devemos, no entanto, lembrar-nos que o arrependimento, no sentido rigoroso do termo, subentende a ignorância, o erro ou a falta de poder.” (p 100). Portanto, será que iremos chamar Deus de ignorante, incapaz ou precipitado? “Mas isto está tão longe de ser a mente do Espírito Santo, que no próprio trecho em que fala do arrependimento divino, diz: “Também a Glória de Israel não mente nem se arrepende; porquanto não é homem, para que se arrependa.” (Samuel 15.11, 29). É preciso entender que a expressão “arrependimento” quando se refere a Deus, tem mais a ver conosco do que com a Pessoa do Senhor, pois “Ele é descrito de uma maneira adaptada à nossa capacidade. Ele Se representa a nós, não conforme é em Si mesmo, mas conforme nos parece que Ele é.” Pois embora Deus não tenha sentimentos apaixonantes, nós lemos que Ele tanto se ira quanto se zanga, só para nos recordar como a descrição d´Ele mesmo se adapta ao nosso entendimento. “Assim também quando se diz que Deus Se arrepende, devemos entender que o significado é que visivelmente Ele altera Seu curso de ação.” (p 100). Veja que ainda que Deus jamais modifique seu propósito e sempre faça cumprir plenamente seus decretos, aos nossos olhos irá parecer que houveram algumas mudanças. Quando Deus enviou Jonas aos ninivitas e Isaías ao rei Ezequias, a vontade do Senhor era a reforma da cidade e o livramento do rei – pois estes eram os objetivos da profecia de Jonas e da mensagem de Isaías. A real satisfação do Senhor era despertar nos homens de Nínive o arrependimento para livra-los do juízo. “E assim, o desafio de Isaías (Is 14.27) sempre permanece irrespondível: “Porque o Senhor dos Exércitos o determinou; quem, pois, o invalidará? E a sua mão estendida está; quem, pois, a fará voltar atrás?”. 18: DEUS EMPREGA DE MODO JUSTO OS AGENTES ÍMPIOS. “Uma dificuldade maior nos é apresentada por aquelas passagens das Escrituras onde se diz que o próprio Satanás e todos os ímpios são controlados e dirigidos pela vontade de Deus.” (p 101). É muito difícil compreender a partir da razão humana como Deus opera através das atitudes dos maus, sendo que a culpa de seus atos será totalmente deles, e que caberá ao Senhor julga-los justamente pelo que praticaram. “Para enfrentar esta dificuldade, alguns inventaram uma distinção entre aquilo que Deus faz e aquilo que Ele permite.” Mas esta boa intenção é desprezada por Deus, posto que o próprio Senhor assume ter ordenado que estas coisas deveriam acontecer deste jeito. Pois tudo ocorre segundo os decretos de Deus, cfe diz o salmista: “No céu está o nosso Deus, e tudo faz como lhe agrada.” (Sl 115.3). Veja como as ordens que Satanás recebe acerca de Jó provém de Deus, igualmente ao que acontece com os santos Anjos do Senhor. Uma verdade reconhecida por Jó: “o Senhor o deu, e o Senhor o tomou.” E foi da vontade de Deus que um espírito saísse para enganar Acabe, pois lhe disse o Senhor: “Tu o enganarás, e ainda prevalecerás; sai, e faze-o assim.” “Se a cegueira e a estultícia de Acabe lhe sobrevieram como julgamento da parte de Deus, a teoria de uma simples permissão é vã; porque seria absurdo para um juiz meramente permitir a execução de uma sentença, e não decretar que fosse executada.” (p 102). E ainda que os judeus desejassem a morte de Jesus, assassinato que ocorreu através de Pilatos e dos soldados, eis “que os ímpios fizeram somente o que a mão de Deus e o Seu propósito predeterminaram (At 4.27-28).” (p 102). Salomão ensina que ocorre no coração do rei uma ação divina que Deus realiza em todos os homens, inclusive ao tratar dos interesses pelos quais orientamos nossos pensamentos. “Nada pode comprovar isto mais claramente do que o fato de que Deus tão frequentemente nos diz que cega as mentes dos homens, aflige-os com delírio, derrama sobre eles o espírito do sono, fere-os com loucura, endurece seus corações (Romanos 1.26 e 11.8).” Veja que não se trata da “vontade permissiva de Deus”, pois o Espírito Santo declara que a loucura dos maus é uma sentença do juízo do próprio Deus. O importante deste assunto é que somente dissemos o que está claramente exposto nas Escrituras. Portanto, quem despreza este conhecimento alegando que está acima da nossa compreensão rebela-se contra a própria autoridade de Deus, pois assume que decidiu pensar diferente ou que prefere nada saber desta doutrina. “Tais insolentes descobrirão que as palavras de Davi são verídicas, que Deus “será tido por justo... no seu julgar.” (Sl 51.4). “Tem-se argumentado que, se nada acontece senão segundo a vontade de Deus, então Ele deve ter duas vontades contrárias, pois secretamente decreta o que na Sua lei abertamente proíbe.” (p 103). Trata-se de um engano fácil de resolver, mas antes, é importante lembrar que foi o próprio Espírito Santo que ensinou Jó a dizer: “O Senhor o tomou”, quando salteadores o despojaram de seus bens.” É importante compreender que os filhos de Eli desobedeceram a seu pai porque o Senhor resolveu que os dias de suas vidas deveriam terminar, e que Herodes e Pilatos conspiraram juntos para fazer o mal, a fim de realizar um propósito determinado por Deus (Atos 4. 27-28). A vontade de Deus é única e jamais se modifica, portanto, qualquer confusão que fizermos terá origem, sim, na pequenez do nosso entendimento. Agostinho: “Alguns homens têm bons desejos que não estão de acordo com a vontade de Deus, e outros têm maus desejos que estão de acordo com a vontade de Deus.” Observe que um filho bom agrada ao Senhor quando deseja que seu pai viva, embora a vontade de Deus seja sua morte. E um filho mau desagrada a Deus quando deseja a morte de seu pai, embora está seja a vontade do Senhor. Veja como “Deus às vezes cumpre Seus propósitos justos mediante os maus propósitos dos ímpios.” Agostinho disse que tanto os anjos apóstatas quanto os homens ímpios praticaram o que era contrário à vontade de Deus, mas não agiram contra a vontade da Onipotência de Deus – pois isto é impossível! Eis a maneira como eles praticam atos contrários a Deus ao mesmo tempo em que cumprem a vontade do Senhor. “Acrescenta que um Deus bom não permitiria que o mal fosse feito, a não ser que um Deus onipotente pudesse transforma-lo em bem.” (p 104). Mas, “se Deus não somente emprega a instrumentalidade dos ímpios, como também governa seus planos e paixões, porventura não seria Ele o autor de todos os seus crimes? E quanto aos homens que estão sujeitos à sua vontade, não estariam injustamente condenados por cumprirem seus decretos? Este falso raciocínio confunde a vontade de Deus com Seu mandamento, embora fique evidente por muitos exemplos que há uma diferença muito grande entre eles.” (p 104). Veja que o adultério de Davi foi vingado pela imoralidade de Absalão conforme a vontade de Deus, mas o Senhor não ordenou que Absalão praticasse tal corrupção. E “quando o rei disse: “Deixai-o, que amaldiçoe, pois o Senhor lhe ordenou;” (2 Sm 16.11) de modo algum recomendava Simei por sua obediência a Deus,”. Mas sim, se submetia ao que sabia ser um juízo da vontade de Deus para com ele. Precisamos estar convictos de que os ímpios que desobedecem aos mandamentos do Senhor não se tornam inculpáveis em razão de Deus ter se utilizado deles para cumprir os juízos de seus decretos. “É sábio abraçarmos com mansidão e humildade tudo quanto é ensinado nas Sagradas Escrituras.” (p 104). (páginas 93 a 104)

DA MANEIRA COMO DEUS GOVERNA O UNIVERSO: as INSTITUTAS do Cristianismo de J CALVINO Vol 5, um resumo do Resumo de JPWiles

A obra teológica “Institutas” do reformador protestante João Calvino contém uma explicação completa do conhecimento de Deus segundo o Cristianismo. O tema deste quinto volume do I Livro é: DA MANEIRA COMO DEUS GOVERNA O UNIVERSO. O texto a seguir é o volume 05 de 20, deste breve resumo extraído do Resumo de J. P. Wiles, escrito no ano de 1920 (Ensino sobre o Cristianismo – uma edição abreviada de AS INSTITUTAS DA RELIGIÃO CRISTÃ, Publicações Evangélicas Selecionadas, São Paulo/SP) As citações em destaque são do Resumo de Joseph Pitts Wiles. 16: DEUS, QUE CRIOU O UNIVERSO, SUSTENTA-O PELO SEU PODER E GOVERNA TODAS AS SUAS PARTES MEDIANTE A SUA PROVIDÊNCIA. “Seria simplesmente uma noção fria e vazia pensar que Deus criou os mundos em certa época e depois abandonou a obra das Suas mãos.” Não adianta nada reconhecer a existência de um Deus Criador ao enxergar a grandeza da natureza, pois a diferença entre os que tem fé e os ateus surge de sabermos que a manutenção do mundo até os dias de hoje depende das mãos de Deus, tanto quanto dependia na origem da terra. “Por isso está escrito: “Pela fé entendemos que foi o universo formado pela palavra de Deus” (Hb 11.3). A doutrina da Providência de Deus é o entendimento que diferencia os que tem fé daqueles que não acreditam em Deus – ainda que saibam algo sobre Deus em suas mentes e digam isto com seus lábios. Pois reconhecer o poder divino na criação e pensar que Deus agiu algumas vezes na história é uma convicção somente humana das verdades de Deus – não provém da fé! “A fé deve penetrar mais profundamente; tendo aprendido que Deus é o Criador de todas as coisas, deve concluir que Ele é o Governador e Preservador constante delas, e que Sua providência especial sustenta, guarda e cuida de cada uma de Suas criaturas, até ao menor dos pardais.” (p 86). “O Senhor olha dos céus; vê todos os filhos dos homens; do lugar de sua morada observa todos os moradores da terra, ele que forma o coração de todos eles, que contempla todas as suas obras.” (p 87). “Na realidade, ninguém acredita seriamente que Deus criou todas as coisas, a não ser que acredite também que Deus continuamente Se importa com todas as coisas que criou.” A diferença entre a filosofia que ensina que a vida é um “acaso” e a palavra da fé está no conhecimento da providência de Deus. Pois acreditar no acaso ou na sorte obscurece a verdade da providência divina. Afinal, o que se sabe é que tanto as vítimas dos ladrões como de acidentes trágicos, ou daqueles que se perdem ou ainda dos que são achados, e dos que escapam da morte por um fio ou chegam seguros em seus lares, bem; “todos estes eventos... são atribuídos pela razão carnal à sorte.” “Mas aquele que aprendeu de Cristo que os cabelos de sua cabeça são contados... concluirá que os eventos de todos os tipos são governados pelo conselho secreto de Deus.” (p 87). O atributo divino da Onipotência significa que Deus governa o mundo e tudo que nele existe de maneira vigilante, eficaz e continuamente ativa. Deus é onipotente porque governa diariamente o céu e a terra através da sua Providência; e não porque tudo acontece como Deus espera que ocorra, ou porque o mundo se mantém “vivo” porque foi criado com esta energia vital. “Quando, pois, o salmista diz (Sl 115.3) que Deus “tudo faz como lhe agrada” refere-se a um propósito fixo e deliberado.” (p 88). A filosofia entende que Deus pode ser a causa primária de todas as coisas, negando assim a verdade essencial da fé que afirma que toda bênção e também toda dificuldade da humanidade acontece “pela decisão e decreto d´Aquele sob cuja mão se acham.” Pois, ao contrário, “aqueles que atribuem a devida honra à onipotência de Deus são movidos a prestarem-Lhe obediência, e a descansarem seguros sob Sua proteção.” (p 88). “O profeta Jeremias (10.2) proíbe os filhos de Deus de ficarem espantados diante dos sinais dos céus, como ficam os pagãos.” A preocupação do profeta não é que exista um certo temor sem profundidade entre os homens, mas sim, pôr saber que é pura superstição imaginar que a criação e as criaturas de Deus movem-se por si mesmas. A doutrina da Providência não ensina que Deus está ocioso após criar tudo que existe, mas sim, afirma que Deus controla e governa todos os eventos do Universo. “Pois quando Abraão disse ao seu filho: “O Senhor proverá”, não queria dizer que Deus tinha presciência do futuro, mas que ele próprio estava lançando seu cuidado sobre Aquele que livra da perplexidade e da confusão. Segue-se que a providência de Deus significa ação.” (p 88). Outro grave engano é acreditar que há somente um governo geral de Deus sobre a vida e o mundo – uma certa providência universal, que não impede as criaturas e os homens de se moverem com certo livre arbítrio segundo suas próprias naturezas. Tal ideia divide o governo da existência humana entre Deus que dá forças e o homem que irá decidir como governa-las. Veja que este tipo de conhecimento admite que o curso ordeiro da natureza - em que após o dia vem a noite e após o verão vem o inverno, é uma obra de Deus. Mas, que, assim que há calor ou frio demais, chuvas de pedra e tempestades de areia, então, eis o momento em que Deus está ausente! “Isto, porém, não deixa lugar para o exercício da generosidade paternal de Deus, nem para Seus retos juízos.” (p 89). Acreditar que a generosidade de Deus ocorre somente pelo fato d´Ele ter criado terra e sementes que por si só irão sustentar a criação, é negar que as boas colheitas de determinada estação são bênçãos especiais d´Ele; como igualmente irão negar que a falta e a fome são atos de seu justo juízo. “As Escrituras, no entanto, frequentemente testificam que quando a terra é refrigerada com o orvalho e a chuva, Deus assim mostra Seu favor; que pela Sua ordem os céus se tornam como ferro, e as colheitas estão consumidas pelo crestamento e pelas pragas...”. (p 89). E não se pode afirmar que a Providência de Deus existe só para situações específicas e necessárias, pois Jesus ensina que nem um pardal cai na terra sem que seja da vontade de Deus. “Sabemos, porém, que Deus criou o mundo para o homem; portanto é de esperar-se que Deus o governe com um propósito especial quanto ao benefício da humanidade.” Segundo Jeremias: “Eu sei, ó Senhor, que não cabe ao homem determinar o seu caminho, nem ao que caminha o dirigir os seus passos” (Jr 10.23); e conforme Salomão: “Os passos do homem são dirigidos pelo Senhor, como, pois, poderá o homem entender o seu caminho?” (Pv 20.24). Se entendemos que Deus dá as condições, mas é o homem que decide seus passos – os caminhos do homem seriam governados segundo seu próprio critério, “enquanto que Jeremias e Salomão atribuem a Deus não somente o poder, como também a escolha e o propósito no que diz respeito aos caminhos dos homens.” (p 90). Salomão repreende os homens que rápido correm atrás do que desejam, pois desprezam Deus ao esquecer que pelo próprio Senhor serão guiados: “O coração do homem traça o seu caminho”, diz ele, “mas o Senhor lhe dirige os passos”, dando a entender que é estultícia ridícula que os homens planejem suas ações independentemente de Deus...”. Até algo que parece bastante natural de ocorrer, foi obra de Deus, pois “se um homem acidentalmente foi morto por outro, o Senhor declara que Ele mesmo entregou a vítima na mão de quem o matou (Êx 21.13).” E a própria condição dos pobres e ricos deste mundo é designada pela Providência de Deus: “O pobre e o seu opressor se encontram, mas é o Senhor que dá luz aos olhos de ambos” (Pb 29.13). “Além disso, eventos específicos são provas da providência universal de Deus.” Ele enviou ventos tanto para trazer codornizes ao povo (Nm 11.31), quanto para lançar Jonas ao mar na tempestade, o que nos ensina que os ventos começam e terminam segundo sua ordem, conforme o Salmo 104. 3-4. E que os mares também são movidos pelos ventos do Senhor para dar prova do seu poder e da sua presença entre nós: “Pois ele falou, e fez levantar o vento tempestuoso, que elevou as ondas do mar. Fez cessar a tormenta, e as ondas se acalmaram”. (Sl 107. 25-29). Ainda que pareça natural termos filhos, há os que recebem filhos de Deus e os que não, pois “o fruto do ventre é seu galardão”. E até o pão diário que parece chegar para nós direto da natureza depende de uma encoberta bênção de Deus até que possa nos alimentar, o que nos motiva a orar ainda mais para que nos seja dado o pão nosso de cada dia. Acerca desta doutrina do Soberano governo de Deus pela sua Providência, há acusações de que ensinamos o dogma estóico da fatalidade, o que já disseram até de Agostinho. Mas tal expressão é um engano profano, e uma tentativa de falsear a verdade de Deus. “Os estóicos imaginaram uma “necessidade”, surgindo de uma cadeia perpétua de causas sucessivas contidas na natureza; mas não sustentamos tal crença.” (p 92). “Ensinamos que Deus é Árbitro e Controlador de todas as coisas, que na Sua sabedoria decretou desde a eternidade o que faria, e agora realiza pelo Seu próprio poder aquilo que Ele decretou.” Eis como Deus governa toda a natureza e cada um dos seres humanos, e todos os eventos e situações da história e do cotidiano a fim de direciona-los a um determinado fim. Sim, é isto mesmo: não há espaço para o acaso ou para a sorte. “Um ditado de Agostinho merece consideração: “Lastimo que, ao escrever contra a escola acadêmica de mestres, eu tenha usado tão frequentemente a palavra “Fortuna”... É verdade que também disse: “Aquilo que é comumente chamado fortuna é talvez sujeito a algum método oculto, e o acaso é meramente aquilo do qual a razão ou a causa é secreta, pois percebo que os homens tem o hábito nocivo de dizer: “Assim quis a fortuna”, quando deveriam dizer: “Assim quis Deus.” Veja que nada consideramos fortuito ou fruto do acaso, ao contrário, “mas as coisas que indubitavelmente procedem da vontade nos parecem fortuitas, porque sua ordem, razão, finalidade e necessidade são ocultas nos conselhos de Deus e não são captadas pela mente do homem.” (p 92). Observe que um homem que se afasta de seus amigos e perde-se no caminho, vindo a ser assaltado e até morto – saiba que esta morte foi tanto prevista por Deus como pelo Senhor foi decretada, pois foi Ele quem previu a duração da nossa vida e definiu seus limites; embora, porém, tal morte nos traga a ideia de ter sido só um acidente. A história de Davi é notável para revelar o controle de Deus sobre tudo que acontece, pois quando Saul cercou Davi no deserto de Maom, Deus enviou os filisteus para invadir Israel, fazendo Saul partir dali, acabando por livrar Davi: “a fé reconhecerá que aquilo que nos pareceu um acaso foi, na realidade, o efeito do poder secreto de Deus.” (Esse texto não contém o resumo completo, mas parcial do tópico de Calvino nas Institutas). Autor. Ivan Santos Rüppell Júnior é Ministro Presbiteriano, Professor e Advogado.

quarta-feira, 25 de julho de 2018

a ÉTICA Protestante e a TRANSFORMAÇÃO da Sociedade no Pensamento de J CALVINO

A REFORMA PROTESTANTE E O ESPÍRITO DE JOÃO CALVINO: QUAL A INFLUÊNCIA DO PENSAMENTO CALVINISTA NAS TRANSFORMAÇÕES SOCIAIS GERADAS PELA REFORMA PROTESTANTE? RESUMO: Qual a importância de João Calvino para que a Reforma Protestante se tornasse um movimento religioso renovador da sociedade ocidental nos últimos cinco séculos? O presente texto busca responder esta questão a partir das doutrinas calvinistas acerca do conhecimento do homem e da criação social da humanidade. A partir de pensamentos do líder protestante, compreende-se que a contribuição de Calvino foi distintiva na história do Cristianismo para que o Protestantismo assumisse a vida em sociedade como um local essencial para que o fiel religioso cristão desenvolvesse sua vocação cristã no mundo. PALAVRAS CHAVE: Ética e Religião; Progresso Social e Pensamento Reformado; João Calvino e Reforma Protestante; Devoção Secular e Vocação Cristã. INTRODUÇÃO. Lançado no início do século 20, o livro A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo tornou-se obra clássica da Sociologia da Religião ao desenvolver um método de análise social a partir da percepção da influência da religião na estrutura da sociedade. Como a análise recaiu sobre comunidades de fé reformadas, e como a dedicação ao trabalho secular gerou um progresso e desenvolvimento diferenciais nas sociedades analisadas, utilizou-se o termo “espírito” do capitalismo para designar esta ética protestante que orientava o trabalho do homem enquanto uma devoção religiosa na sociedade. A Reforma Protestante gerou igualmente, transformações culturais inegáveis na sociedade ocidental nos últimos cinco séculos, enquanto uma força religiosa de proporções únicas na história da humanidade. A partir desta realidade, eis a questão: Qual seria o “espírito” pessoal e doutrinal gerador desta dedicação espiritual secular distintiva na economia e sociedade europeia e das Américas, a qual surge de modo tão avassalador e peculiar segundo alguns princípios e ações do protestantismo? Este artigo busca demonstrar que a doutrina precípua do Protestantismo enquanto um movimento de ação religiosa transformador da sociedade humana origina essencialmente de princípios reformados observados por João Calvino nas Escrituras, os quais vieram a se tornar o “espírito” do progresso social Protestante através da história. 1. O ESPÍRITO DO CAPITALISMO NA ÉTICA PROTESTANTE. No início do século 20 o sociólogo alemão Max Weber publicou sua obra clássica da Sociologia da Religião: A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo, analisando a formação do capitalismo ocidental a partir de influências religiosas reformadas na sociedade. Suas análises demonstraram a realidade de uma interação profícua entre os valores religiosos dos homens e a estruturação de seu meio social. O título de Weber relacionando a Ética religiosa ao ramo Protestante advém do grupo social base de sua análise, já que ele se serviu do ramo reformado puritano ambientado na Nova Inglaterra dos séculos 17 e 18, para realizar suas avaliações sociológicas. O que ele percebeu foi a existência de um forte sentimento de origem divina no fiel reformado. Devoção que gerava uma especial dedicação ao trabalho secular, que quando associada à necessidade interior de comprovação da salvação pessoal relacionada à doutrina da eleição, determinava uma vivência econômica dos cristãos protestantes como se fora uma premissa essencial da fé. Eis o tema base que orienta a obra mais conhecida de Max Weber: A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo. O propósito da obra foi analisar o capitalismo moderno que avançava pelo mundo, a partir de uma origem norte-americana e posicionamento diferencial em relação à atitude capitalista comumente observável em sociedades econômicas ativas no decorrer da história. Segundo Mcgrath, "Weber... defendia que um novo espírito do capitalismo havia surgido no século XVI. Portanto, não é bem o capitalismo, mas uma forma específica de capitalismo que precisa ser explicada." (2005, p. 539). Este novo capitalismo que Weber reconheceu apresentava-se sem inibições à conquista sequencial de riquezas, e igualmente sem desperdício dos ganhos já adquiridos, gerando uma progressão econômica contínua a partir do trabalho do homem, o que promovia um movimento novo dentro da história. "Mas nos tempos modernos, o Ocidente conheceu uma outra forma de capitalismo: a organização racional capitalista do trabalho (formalmente) livre do qual não se encontra em outra parte senão vagos esboços." (WEBER apud SANTOS, 1967, p. 487). O elemento que destacava este capitalismo moderno tornando-o único e revelador da existência do que Weber iria definir como o novo espírito do capitalismo é o de uma perspectiva racional em relação ao trabalho secular profissional livre. Uma perspectiva que direcionava as conquistas da atividade econômica para seus fins específicos, definidos e determinados para a continuidade do progresso e geração de riquezas: “Weber irá demonstrar que o que possibilitou a formação do capitalismo dessa ordem, foram: uma contabilidade racional, uma separação legal da propriedade das empresas e da propriedade pessoal, o desenvolvimento das possibilidades técnicas, bem como uma organização racional do trabalho capitalista, havendo entre esses fenômenos e o capitalismo uma influência recíproca." (WEBER apud SANTOS, 1967, p. 487). Eis os princípios estruturais da distinta dedicação reformada às atividades de trabalho secular e suas consequentes atitudes racionalmente gerenciadas rumo a um objetivo de progresso. Valores geradores de um processo contínuo e crescente de acúmulo de riquezas para a sociedade, cujos homens nela labutavam à luz de alguns dos pensamentos cristãos do maior teólogo da Reforma, João Calvino. Eis como a ética protestante acabou por integrar, então, um novo “espírito” ao capitalismo, posto que este se desenvolveu na sociedade dos homens a partir de princípios doutrinários reformados. O objetivo deste artigo é semelhantemente perceber a existência dos diferenciais fundamentos protestantes geradores da atuação cristã na sociedade, a partir de uma origem reformada. No caso, busca-se resgatar o “espírito” peculiar não somente do calvinismo histórico, mas sim, dos escritos de João Calvino, pois é a partir de suas doutrinas que desejamos reconhecer como a Reforma Protestante se tornou uma das maiores forças culturais a transformar e fazer progredir a sociedade humana através dos últimos 500 anos. Neste sentido, iremos nos debruçar neste artigo pela busca de pensamentos singulares calvinistas que se tornaram definidores do modo protestante de ser e pensar, enquanto valores de uma atuação social cristã junto da humanidade. 2. DO CONHECIMENTO DE DEUS. O BOM CONHECIMENTO DO HOMEM. João Calvino nasceu na França e tornou-se um notável líder da Reforma Protestante do século 16 a partir tanto de seu tratado teológico “As Institutas da Religião Cristã”, bem como por sua atuação enquanto líder religioso e social na cidade de Genebra, até sua morte em 1564. Fundador da Universidade de Genebra, humanista cristão, dedicado estudioso da Bíblia e reconhecido como literato entre acadêmicos, Calvino irá fomentar através de sua doutrina e liderança o início de um movimento de transformação da religião e sociedade que permanece relevante na atualidade. As Igrejas Reformadas e igualmente a Igreja Presbiteriana do Brasil carregam consigo as doutrinas deste reformador, ao mesmo tempo em que qualquer movimento protestante jamais possa negar as influências teológicas e éticas que saíram do entendimento deste que, junto de Martinho Lutero, notabilizou-se como líder mor da Reforma Protestante. O supremo princípio doutrinário que irá mover o Protestantismo como um movimento cristão singular é aquele pelo qual Calvino objetivamente propõe uma reforma religiosa que atua em aproximação ao mundo: "Se houve qualquer movimento religioso, no século 16, que tenha tido uma atitude afirmativa em relação ao mundo, esse foi o Calvinismo. "(Mcgrath, 2004, p. 249). Esta é a perspectiva que dá unidade e rumo às práticas dos fiéis cristãos calvinistas enquanto uma reação de devoção religiosa diante de Deus e a partir de seus mandamentos. Trata-se de uma atitude afirmativa para com o homem e seu mundo que se realiza através de um olhar cristão reformado que percebe o ser humano “positivamente”, a partir de dois momentos: quando criado pôr Deus, e assim, bom, como toda a criação no seu início. E num segundo momento, evangelicamente, quando o homem é renovado pôr Deus em Jesus Cristo, e assim transformado para viver novamente junto e submisso ao Criador – aqui, o cerne do propósito religioso salvífico do cristianismo. O reconhecimento da existência destes dois momentos da vida do ser humano é o que irá prover à religiosidade protestante, especialmente ao calvinismo reformado, a perspectiva de que o homem e seu mundo errantes não devem ser renegados através da condenação, mas sim, respeitados e reconquistados ao propósito inicial do Criador. Pois um mundo e seres humanos originalmente criados por Deus não devem ser abandonados em seu estado de imperfeição e rebeldia, mas sim, observados à luz de sua origem e visualizados na esperança do dia em que tudo irá existir conforme somente o bom propósito de Deus. Uma proposição do evangelho que se cumprirá no fim dos tempos, mas que já está no meio de nós, e a religião cristã deve apregoar agora e viver desde sempre, os primeiros passos deste ideal último de Deus à criação e humanidade. São estas as razões, segundo Knudsen, em Calvino e sua influência no mundo ocidental, pelas quais "o Calvinismo teve em mira não a reforma na doutrina, na vida individual e na vida da igreja, mas também a transformação de toda a cultura, em nome de Cristo." (1990, p. 12) Eis como, segundo Calvino, uma gerência cristã da conduta humana em sociedade é um projeto da redenção dos talentos e capacidades especificamente entregues à humanidade conforme um propósito divino determinado desde a criação. Portanto, o Protestantismo entende a partir de Calvino que a mesma perspectiva que não amaldiçoa definitivamente o que é humano e secular neste mundo; ao contrário de proposta regular em outras religiões, que afirmam o afastamento do homem do mundo desgraçado, pois somente assim se fazem dignos de Deus. Torna-se, igualmente, uma perspectiva e princípio que visualiza e projeta um tratamento distinto e abençoador de toda a existência humana no planeta. Pois é um posicionamento que ocorre a partir do que lhe é originalmente bom - a vontade primeira de Deus para a humanidade e sua vivência social. Afinal, a existência cultural do homem não origina do homem sem Deus, mas bem ao contrário; nasce sim, da essência do ser humano que foi criado pôr Deus. E que junto de Deus já conviveu em completude e harmonia no início dos tempos. Calvino assim esclarece esta peculiar distinção representativa do momento em que a raça humana foi criada: “Deste conhecimento há dois ramos, a saber, o conhecimento do homem conforme originalmente foi criado, e o conhecimento da condição do homem desde a queda de Adão (...). Pois antes de tratarmos do estado miserável ao qual o homem caiu, vale a pena lembrar-nos daquilo que ele era originalmente (...). “(CALVINO, 1984, p. 80) 3. A GRAÇA COMUM. A CULTURA E A SOCIEDADE DOS HOMENS. Assim, é a partir deste entendimento reformado da criação do Ser humano que João Calvino irá desenvolver a doutrina que irá se tornar um dos princípios teológicos de maior relevância religiosa na história sócio cultural da humanidade. Trata-se da percepção calvinista que reconhece que nem tudo que há no mundo requer ser redimido, para só então obter algum valor, como se nada de bom carregasse em si naturalmente. Pois há humanidades e artifícios do agir do homem que conseguem ser edificados à luz da boa vontade de Deus, mesmo se reconhecidos como existentes dentro da premissa que afirma estar o homem distante e contrário ao plano original do Criador, a partir da Queda: “Atribuir ao homem total cegueira, que não lhe deixa inteligência alguma, não é apenas contrário à Palavra de Deus, mas também contrário à experiência e ao bom senso (...) Lembremo-nos, portanto, desta distinção: o conhecimento de assuntos terrestres é uma coisa, o conhecimento de assuntos celestiais é outra. Por assuntos terrestres quero dizer os que se referem à vida presente (...).” (CALVINO, 1984, p. 112). Calvino adverte que a situação de rebeldia do homem para com o Criador não impede a humanidade de viver debaixo da ação providencial de Deus, que tem o bom propósito de manter a continuidade e a boa vivência dos homens - é a Graça Comum de Deus, que permanece sobre todos os homens e as suas ações nesta vida: “Visto que o homem por natureza é de disposição social, está inclinado pelo instinto natural a estimar a sociedade e a conservá-la (...) Além disso, todos nós temos alguma aptidão para aprender as artes liberais e mecânicas; e esta é outra prova do vigor da mente humana (...) E embora a razão seja uma bênção comum que é outorgada a todos nós, cada um deve reconhecer que sua participação nela é um favor especial que Deus lhe conferiu.” (CALVINO, 1984, p. 112 – 113) Eis os princípios e alguns dos pensamentos de João Calvino que foram os promotores de uma distinta valorização da cultura humana por parte da religião, fatores que tornaram o protestantismo em um movimento que propiciou grande progresso à humanidade nos últimos séculos. Segundo Knudsen, as artes liberais e as ciências exatas eram percebidas com premissa positiva pelo Calvinismo, ao contrário de outros movimentos religiosos cristãos que as declaravam totalmente renegadas ou inicialmente percebiam-nas sob um olhar majoritariamente negativo. Dentro desta perspectiva, a cultura do homem não apenas se permitia ser redimida para continuar sendo uma abençoada, cultura - pois não se nega ao homem a vivência de suas humanidades enquanto ele busca sua santidade. Como, ainda, tornava possível a observação de que mesmo uma cultura desenvolvida em um mundo caído, era igualmente eficaz e necessária em muitos aspectos – um entendimento positivo e tanto enquanto premissa religiosa que deseja propor uma orientação devocional à vida do fiel em sociedade. Importa ressaltar a realidade de uma proximidade e complementaridade entre os pensamentos de nossos mais distintos reformadores, Lutero e Calvino, acerca desta visão cristã protestante da sociedade humana, conforme anotada por Andre Biéler, em sua obra: A Força Oculta dos Protestantes. Pois nesta, o autor reconhece uma diferença maior de ênfase, apenas, entre o pensamento de ambos. Algo que ocorre mais em razão do peculiar momento histórico, tanto religioso quanto social, com que cada um deles se deparou. E assim, perante tais e distintas ocasiões buscaram oportunamente atuar, e responder, enquanto teólogos e líderes do novo movimento religioso que ambos gestavam, a histórica Reforma Protestante do Cristianismo. CONSIDERAÇÕES FINAIS A partir desta convicção teológica acerca da criação do mundo e do ser humano, o teólogo João Calvino vai desenvolver as mais amplas possibilidades de vivência social cristã ao fiel reformado, perfazendo uma experiência religiosa dentro do mundo que resultará naquilo que Henri Hauser denominou de "secularização do sagrado" e, que, segundo Mcgrath, "envolvia trazer toda a esfera da existência humana para dentro do âmbito da santificação divina e da dedicação humana." (2004, p. 250). Eis, portanto, o fundamento da doutrina calvinista que oportuniza ao cristão protestante uma atuação ativa em sociedade, a qual irá se desenvolver enquanto ética abençoadora na cultura da humanidade – um reconhecimento do próprio chamado de Deus ao homem para viver no mundo a partir do governo soberano do Criador. Um princípio reformado responsável por realizar uma grave e contínua revolução social na história, a qual a Reforma Protestante protagonizou exatamente a partir do “espírito” de João Calvino. Pois o que Calvino bem compreendeu foi o quanto um compromissado relacionamento do homem com Deus pode socialmente transformar o mundo. Eis a origem de sua essencial Ética Protestante, que se baseia na força da própria Presença de Deus no homem cristão. Comunhão divinal que o desafia e conduz para gerar vida, e Vida em abundância, em todo lugar e relacionamentos sociais que o fiel reformado vier a experimentar no mundo, assim como prometera Jesus ocorreria através da vida de seus discípulos. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BARBOSA, Maria Ligia de Oliveira e QUINTANEIRO, Tania. Um Toque de Clássicos. Marx, Durkheim e Weber - Belo Horizonte, Editora UFMG, 2002. BIÉLER, André. A Força Oculta dos Protestantes. Tradução de Paulo Manoel Protasio - São Paulo: Cultura Cristã, 1999. BIÉLER, André. O Pensamento Econômico e Social de Calvino. Tradução de Waldyr Carvalho da Luz. São Paulo: Casa Editora Presbiteriana S/C, 1990. CALVINO, João. A verdadeira vida cristã. Tradução Daniel Costa. São Paulo: Editora Cristã Novo Século, 2000. _______________João. As Institutas da Religião Cristã: edição especial com notas para estudo e pesquisa / tradução Odayr Olivetti. São Paulo: Cultura Cristã, 2006. COSTA, Herminsten M. P. Raízes da Teologia Contemporânea. São Paulo: Cultura Cristã, 2004. COSTA, Herminten M. P. Calvino de A a Z. São Paulo: Editora Vida, 2006. DE LIBERAL, Márcia de Mello Costa. Liberal. A religião como fonte de ética: revisitando alguns paradigmas. 2002 / pg 65-68, (Revista Portuguesa de Ciências das Religiões, ano 1, nº 2). GOMES, Antonio Máspoli de Araújo. Ética Cristã, educação e responsabilidade social em Lutero e Calvino. Ética: reflexões contemporâneas / De Liberal, Márcia Mello Costa e Souza Neto, João Clemente (Org.): Arauco Editora, 2005. McGRATH, Alister E. Teologia Sistemática, histórica e filosófica: uma introdução a teologia cristã. Tradução Marisa K. A de Siqueira Lopes. São Paulo: Shedd Publicações, 2005. McGRATH, Alister E. A Vida de João Calvino. Tradução de Marisa Lopes, São Paulo: Editora Cultura Cristã, 2004. MENDONÇA, Antonio Gouvêa. Editor . O Pensamento de João Calvino - São Paulo: Editora Mackenzie, 2000 - (Série Colóquios; v.2) KNUDSEN, Robert D, REID, W. Stanford (Ed.). Calvino e sua influência no mundo ocidental. São Paulo: Casa Editora Presbiteriana S/C 1990. WEBER, Max. A Ética Protestante e o "Espírito" do Capitalismo. Tradução José Marcos Mariani de Macedo; revisão técnica, edição de texto, apresentação, glossário, correspondência vocabular e índice remissivo Antônio Flávio Pierucci. - São Paulo: Companhia das Letras, 2004. (este ARTIGO foi publicado originalmente na REVISTA TEOLÓGICA FATESUL, n 1 vol 1, 2018)

sexta-feira, 20 de julho de 2018

A ORIGEM DOS ANJOS e A CRIAÇÃO DO HOMEM. as INSTITUTAS do Cristianismo Vol 4, de J CALVINO, um resumo do Resumo de JPWiles

A obra teológica “Institutas” do reformador protestante João Calvino contém uma explicação completa do conhecimento de Deus segundo o Cristianismo. Os temas deste quarto volume são: A ORIGEM dos ANJOS e a CRIAÇÃO do HOMEM. O texto a seguir é o 04 volume de 20, deste breve resumo extraído do Resumo de J. P. Wiles, escrito no ano de 1920 ( Ensino sobre o Cristianismo – uma edição abreviada de AS INSTITUTAS DA RELIGIÃO CRISTÃ, Publicações Evangélicas Selecionadas, São Paulo/SP) As citações em destaque são do Resumo de Joseph Pitts Wiles. 14: AS ESCRITURAS, NO SEU REGISTRO DA CRIAÇÃO, DISTINGUEM O DEUS VERDADEIRO DE TODOS OS DEUSES FALSOS. "A história da Criação nos é dada nas Escrituras a fim de que os membros da Igreja possam confiar nela e não procurar nenhum outro Deus... .” (p 71). A criação do mundo em seis dias revela o cuidado de Deus pela humanidade pois tudo Ele preparou para que pudéssemos viver com total abundância e harmonia, conforme nos disse pelo testemunho fiel de Moisés. Ainda que não haja informação da origem dos Anjos no relato da criação do mundo, as Escrituras explicam em outros textos como ocorreu esta obra gloriosa de Deus. Trata-se de uma revelação fundamental de Deus para nós, pois alguns erram ao pensar que os anjos são seres divinos, enquanto outros falham ao dizer que Deus é a origem do bem e o Diabo é a origem do mal, baseados no princípio de que Deus jamais criou qualquer coisa má. Porém, a verdade é que toda a criação no início era boa e justa, e que a maldade dos homens e dos demônios surgiu não a partir de sua origem, mas sim, de atos que corromperam a sua natureza original. Moisés escreveu acerca da criação dos anjos, ainda que não tenha definido o tempo de sua origem: “Assim, pois, foram acabados os céus e a terra, e todo o seu exército.” E já tenho ensinado que a sobriedade e a modéstia são valores essenciais para todo aquele que deseja aprender da Palavra de Deus, pois o “desígnio do Senhor é instruir-nos, não em questões de curiosidade frívola, mas na verdadeira piedade, no temor do Seu nome, na fé verdadeira e nos caminhos da santidade.” (p 72). “Frequentemente lemos nas Escrituras que os anjos são espíritos celestes por meio de cujo serviço obediente Deus executa Seus decretos; daí seu nome: anjos, ou seja, mensageiros, por intermédio dos quais Deus Se revela aos homens.” (p 72). Também são chamados de exército celestial, pois vivem ao redor do Monarca do Universo, e são denominados Principados e Potestades, pelo fato de Deus exercer sua autoridade através deles. Quando as Escrituras definem os anjos como “deuses”, isto faz porque carregam em seus atos alguma imagem de poder. “Estou bem disposto a concordar com aqueles que consideram que “O Anjo do Senhor” que apareceu a Abraão, a Jacó, a Moisés e a outros fosse Cristo.” (p 73). Porém, o uso da palavra “deuses” para os anjos em geral, os iguala aos governantes humanos que em sua autoridade agem como representantes de Deus, o Soberano Juiz. O melhor conhecimento que devemos ter acerca dos anjos é que eles existem para o nosso consolo, pois “os anjos são espíritos ministradores cuja obra é transmitir a nós as beneficências de Deus”; zelando por nossas vidas e assumindo nossa proteção. Não creio que exista um anjo para cada cristão pois isto não está escrito na Bíblia, mas entendo que todos eles “vigiam pela nossa segurança de comum acordo.” (p 73). Não há como saber o número de anjos que existem, mas certamente sabemos que são espíritos obedientes a Deus, tanto para nos proteger quanto para fazer chegar aos homens os cuidados de Deus. “Lembremos da declaração de Eliseu: “mais são aqueles que estão conosco do que os que estão contra nós.” (p 74). Veja que Deus utiliza os anjos como seus servos, ao mesmo tempo em que não se confunde com eles e nem compartilha com eles o seu poder e sua glória. “Os próprios demônios são criaturas de Deus; mas não devemos atribuir sua maldade à sua natureza original, e sim ao fato de que sua natureza tem sido corrompida pelo pecado.” (p 74). A Bíblia nos adverte a ficar atentos aos demônios e a buscar proteção na armadura de Deus. “Por exemplo: Satanás é chamado o deus deste mundo, o dominador deste mundo, o valente armado, o príncipe do poder dos ares, o leão que ruge; todos estes títulos visam tornar-nos cuidadosos, mais vigilantes, mais prontos a entrar na luta.” (p 74). Pedro ensina que o diabo é como um leão que ruge ao nosso redor procurando nos devorar, e logo orienta que é preciso resistir aos seus ataques através da fé. Paulo anuncia que a nossa verdadeira luta não é contra as pessoas e o corpo humano, mas sim, que deve ser contra as forças espirituais do mal neste mundo tenebroso, pelo que imediatamente nos convoca a vestir toda a armadura de Deus. “Temos sido advertidos que estamos constantemente ameaçados por um inimigo que é ousado, forte, astuto, diligente, incansável, plenamente preparado com todos os instrumentos de guerra e totalmente treinado na arte de guerrear.” (p 74). Portanto, é necessário guardar este ensino no coração sabendo que iremos combater espiritualmente pela fé até a morte, deixando de lado a preguiça ou a covardia. Devemos invocar sempre os cuidados de Deus, pois somos fracos e inexperientes se ficamos distantes do Senhor. A Escritura orienta que não se deve relaxar nesta batalha ou pensar que o inimigo desistiu, já que a nossa luta pode ocorrer contra diversos demônios, e até diante de uma legião como foi com Maria Madalena. “Além disso, devemos ser despertados para travar uma guerra incessante contra o diabo devido ele ser não somente nosso inimigo, como também ser o inimigo de Deus.” (p 75). Pois se a honra de Deus importa para nós e desejamos que o reino de Jesus avance, saibamos que o diabo continuamente tanto desonra a Deus quanto subverte a propagação do Evangelho – eis a razão pela qual não devemos ficar neutros nesta batalha. O diabo luta contra a verdade de Deus com suas mentiras e conduz os homens pela escuridão da cegueira espiritual, enquanto utiliza do engano e alimenta ódios e contendas. “Por conseguinte, fica claro que o diabo é por natureza depravado, maligno e malicioso.” (p 75). “Todavia, como já foi dito, visto que ele é uma criatura de Deus, devemos atribuir sua maldade, não à sua natureza original, mas sim ao fato de que sua natureza foi corrompida pelo pecado. Sua atual condição execrável é inteiramente o resultado da sua própria apostasia e queda.” (p 75). Esta orientação bíblica nos lembra que as maldades de Satanás não originam da Personalidade de Deus, conforme Jesus Cristo ensinou, ao dizer que o diabo não permaneceu na verdade, mas se assumiu como o Pai da mentira: pois, quando “profere a mentira, fala do que lhe é próprio, porque é mentiroso e pai da mentira.” “O que mais precisamos saber acerca dos demônios? Basta isto: pela sua criação original eram anjos de Deus, mas pela apostasia se arruinaram e tornaram-se instrumentos na ruína dos outros.” (p 76). “Já tenho dito que o diabo luta contra Deus; mas deve ser lembrado que, sem o consentimento de Deus, ele nada pode fazer.” (p 76). Pois, para ser capaz de praticar maldades contra Jó, Satanás se apresenta antes diante de Deus e somente age após receber permissão. Quando Acabe vai ser enganado, é Satanás quem se oferece para ser um espírito de mentira na boca dos profetas. Igualmente, o espírito que vai perturbar Saul era “um espírito maligno da parte do Senhor”. “Assim, também Paulo testifica que a cegueira dos que não creem não é somente obra de Satanás, e sim obra judicial de Deus. (2 Tes 2.9-12).” (p 76). “Ora, visto que Deus é capaz de mudar o curso dos espíritos imundos de lá para cá conforme Sua vontade. Ele os governa de tal maneira que lhe é possível provar os crentes com conflitos, colocar armadilhas no seu caminho, perturbá-los com ataques, lutar contra eles, podem frequentemente abater, desnortear e aterrorizá-los, e às vezes feri-los; mas nunca lhes permite que os conquistem ou esmaguem.” (p 76). Paulo reconheceu que o próprio diabo lhe atacava em razão deste conflito, sabendo, também, que Deus governava tais ataques no propósito de que houvesse o amadurecimento espiritual do apóstolo. Veja que os demônios não podem ser confundidos com paixões malignas do coração ou pensamentos perturbadores da mente dos homens, pois são chamados de “espíritos imundos” - seres pessoais plenos de senso e entendimento. Razão pela qual os demônios estão destinados a existir numa condenação eterna. Agora, é necessário que fiquemos maravilhados e sejamos reverentes a Deus por Suas obras a partir do momento que sabemos que Ele criou tudo que existe! “Por meio deste registro aprendemos que Deus, pelo poder da Sua palavra e do Seu Espírito criou do nada o céu e a terra; que fez trazer à existência todas as criaturas animadas e inanimadas; que distinguiu umas das outras... deu a cada coisa sua própria natureza peculiar, atribuiu-lhes suas várias funções e colocou-as nas suas várias posições... algumas espécies Ele conserva de modo misterioso... a outra dá o poder de procriação... Desta maneira, adornou o céu e a terra com todas as coisas em maravilhosa abundância... Finalmente, ao criar o homem e distingui-lo com tão excelente formosura e tantas grandiosas capacidades, Deus exibiu nele a mais ilustre das Suas obras.” (p 77). A verdade é que não há palavras capazes de tratar das obras de Deus com a dignidade que merecem, “para demonstrar quão inestimável sabedoria, poder, justiça e bondade brilham no sistema do universo...”. (p 78). Porém, Deus deseja que haja boa contemplação de suas obras pois a criação é como que um espelho das infinitas riquezas da Sabedoria e virtudes do Senhor. Portanto, é necessário saber que jamais iremos honrar a Deus como Criador, se ignorarmos Seus atributos visíveis na criação. E também, que tal conhecimento precisa chegar ao nosso coração a fim de que estimule nosso bom conhecimento do Senhor. Vamos considerar a grandeza do Criador desde que Ele colocou nos céus as estrelas, definiu suas posições e seu curso, governa seus movimentos de maneira a medir dias, semanas, meses e anos. E vamos atentar para o poder d´Aquele que sustenta toda a estrutura da natureza e controla a evolução dos astros nos céus, pois são alguns exemplos dos milagres do poder de Deus que se encontram igualmente por todo o mundo. “Pela fé percebemos que Deus designou todas as coisas para nosso proveito e bem-estar, e assim aprendemos a erguer nosso coração a Ele em confiança, oração, louvor e amor.” (p 78). Afinal, Deus criou o mundo cuidadosamente a fim de nos preparar uma existência bendita, razão pela qual jamais devemos duvidar de Sua Paternidade amorosa. Ele nos abençoou grandemente ao criar tudo de que necessitamos antes de nascermos, sujeitando toda a criação ao nosso proveito. “Portanto, sempre que falamos de Deus como o Criador do céu e da terra, lembremo-nos que Ele retém o domínio de todas as obras das Suas mãos, e que nós somos Seus filhos, aos quais Ele se empenhou em nutrir, sustentar e proteger.” (p 79). A partir disso, vamos confiar em Deus, esperando unicamente n´Ele e pedindo-Lhe tudo de que precisamos, já agradecidos pelo que temos recebido. E constrangidos por tanto amor e cuidado, “esforcemo-nos a amar e adorá-Lo de todo o nosso coração.” (p 79). 15: A CRIAÇÃO DO HOMEM. “Agora devemos falar da criação do homem... porque, conforme já dissemos, não podemos ter um conhecimento claro e real de Deus sem algum conhecimento de nós mesmos.” “Deste conhecimento há dois ramos, a saber, o conhecimento do homem conforme originalmente foi criado, e o conhecimento da condição do homem desde a queda de Adão.” (p 80). É fundamental recordar quem era o ser humano quando estava em seu estado original assim que foi criado por Deus, para que a maldade da humanidade não recaia sobre o Autor da natureza. Pois desde sempre o homem procura arranjar desculpas para os seus atos, e mesmo quando trata Deus com reverência, não deixa de atribuir à natureza do homem a razão das nossas corrupções. Por isso é preciso falar da ruína dos seres humanos a fim de anular as falsas desculpas dos pecadores. “Não pode ser contestado com razão que o homem consiste em corpo e alma; e com “alma” quero dizer uma essência imortal, embora seja criada, que é a parte mais nobre dele.” Sabemos que a palavra espírito quando é usada isoladamente significa alma, como “quando Salomão diz que o espírito volta para Deus que o deu”, da mesma forma como Cristo entregou seu espírito ao Pai e Estevão entregou seu espírito a Cristo, “o que significa que quando a alma é liberta da prisão (o corpo) Deus é seu guardião constante.” (p 81). Pois o fato é que os homens se entregam de tal modo ao materialismo que esquecem que irão viver após a morte, mas até mesmo nas trevas deste entendimento limitado, ainda carregam consigo traços da imortalidade. “A consciência, que reage ao julgamento de Deus e assim discerne entre o bem e o mal, é uma indicação segura da imortalidade.” Pois o temor da morte e culpa do juízo não ocorre no corpo, mas está na alma; “segue-se daí que a alma está dotada de essência ou existência pessoal.” (p 81). A imortalidade da alma é comprovada pelo conhecimento de Deus que ela mantém consigo, e o intelecto humano também percebe que na alma existe o carimbo de Deus. Pois “a atividade da mente humana atravessa o céu e a terra, penetra os segredos da natureza, compreende e se lembra do curso das eras e infere coisas futuras baseadas nas coisas passadas, o que prova claramente que alguma coisa distinta do corpo jaz oculta no homem.” “Sabemos o que é certo, o que é justo, o que é honroso; e a sede de tal entendimento deve ser o espírito.” (p 82). As Escrituras ensinam que a alma tem uma existência própria pois revelam que “habitamos em casas de barro”, e que deixaremos o tabernáculo da carne na morte ao nos livrarmos deste corpo corruptível. Desta forma, tanto distinguem a alma do corpo, quanto a percebem “como se fosse a própria pessoa, e assim indicam que é sua parte principal.” (p 82). Paulo exorta para que haja purificação tanto do corpo quanto do espírito, reconhecendo que o pecado corrompe a ambos, esclarecendo sua distinção. “Pedro chama Cristo o Pastor e Bispo das almas, que seria uma declaração absurda se não existissem almas para Cristo cuidar.” (p 82). Jesus mesmo falou da alma de Lázaro que descansava em Abraão, ao mesmo tempo que a alma do rico sofria tormentos, e ainda recordamos que a negação da existência de espíritos foi considerada um grave erro dos saduceus (Atos 23.8). A declaração de que os seres humanos foram feitos à imagem de Deus trata de nossas almas, pois até as marcas externas das virtudes de Deus em nós tem um caráter espiritual. “As faculdades excelentes que o homem originalmente possuía, e que refletiam a glória de Deus, podem melhor ser conhecidas ao considerarmos a renovação da imagem de Deus no homem por Cristo...”. (p 83). Os aspectos principais desta renovação, são: “Primeiramente, o conhecimento (Col 3.10), em segundo lugar, a justiça e a verdadeira santidade (Ef 4.24); mediante o que concluímos que, antes da queda, a imagem de Deus consistia na luz que enchia a mente do homem, na retidão do seu coração, e na integridade das suas faculdades todas.” (p 84). Não se deve buscar conhecimento acerca da alma nos filósofos, pois exceto Platão, eles são unânimes em limita-la ao mundo terreno. A alma dos homens tem uma essência imaterial e não física, e anima o corpo humano inteiro para agir, governando assim a vida humana. “Não somente governa as ações comuns do homem, como também o desperta para adorar a Deus.” (p 84). O próprio desejo corrompido que move os homens pecadores em busca da fama, origina do conhecimento dentro deles de que foram criados para a justiça. É certo que alguns pensamentos dos filósofos são interessantes e úteis, porém, sempre são acompanhados da ideia de que o homem é capaz de governar-se: “Não sabiam que a natureza do homem havia-se corrompido pela queda (no pecado) e, portanto, confundem duas coisas que são inteiramente diferentes: o estado do homem conforme foi criado e o estado do homem conforme é depois da queda.” (p 85). “Visando nosso presente propósito, basta dizer que a alma humana tem duas partes, o entendimento e a vontade; e que é do âmbito do entendimento discernir entre o bem e o mal, e da vontade fazer sua escolha entre os dois.” “Na retidão original do homem, a vontade estava livre, e, mediante a liberdade da sua vontade, poderia ter chegado à vida eterna.” Estou falando da natureza original dos seres humanos, pois Adão era capaz de permanecer junto de Deus, mas pela sua própria vontade decidiu cair. Adão podia escolher entre o bem e o mal, tinha sua mente e vontade perfeitas, e todos os órgãos e membros do seu corpo cumpriam a orientação que lhes dava, “até que se arruinou, corrompendo assim todas as suas faculdades.” (p 85). Mas, acerca deste conhecimento os filósofos tateavam no escuro, “apegavam-se ao princípio de que o homem não seria um ser razoável, a não ser que fosse livre para escolher entre o bem e o mal.” (p 85). Argumentavam que um homem que não consegue governar sua vida a partir de seus princípios, é um ser incapaz de distinguir entre a virtude e o vício. Um pensamento que seria válido caso a natureza humana não tivesse se transformado completamente. Portanto, ao ignorarem a queda, sua compreensão da humanidade tornou-se totalmente confusa. Eis a razão pela qual os seguidores de Cristo que acreditam no livre arbítrio acabam por dividir “sua lealdade entre os dogmas dos filósofos e a doutrina do céu” – tornando-se como tolos que não irão prosperar em nenhum dos dois lugares. (p 85). (resumo das páginas 71 a 85)

quinta-feira, 5 de julho de 2018

as INSTITUTAS do Cristianismo, de J CALVINO: para Grupos de ESTUDO (1)

INTRODUÇÃO AS INSTITUTAS DO CRISTIANISMO, de J CALVINO. A obra teológica “Institutas” do reformador protestante João Calvino é uma instrução básica, profunda e completa acerca do conhecimento do Cristianismo. A partir das premissas de Santo Agostinho e Martinho Lutero, Calvino apresentou a Fé Cristã segundo o pensamento dos Apóstolos e Pais da Igreja, desenvolvendo o formato do Credo Apostólico em edições sucessivas iniciadas em 1536 e finalizadas no ano de 1559. O Credo dos Apóstolos contém quatro divisões principais temáticas, que são: a crença em Deus como o Criador de todas as coisas; a crença em Jesus Cristo, o Filho de Deus; a crença no Espírito Santo; e a crença na Igreja Universal. De modo semelhante, a “Institutio” de J Calvino consiste em quatro livros: Livro I. Do conhecimento de Deus, o Criador. Livro II. Do conhecimento de Deus, o Redentor. Livro III. Da maneira de receber a graça de Cristo, e os efeitos que se seguem. Livro IV. Dos meios externos da graça. Este caderno de estudos para escola bíblica e grupos diversos contém citações das “Institutas” de J Calvino (*) e do Resumo das Institutas de J P Wiles. ESTUDO 1. Leitura Semanal: Domingo: Juízes 13.22; Segunda: Isaías 6.5; Terça-feira: Ezequiel 1.28; Quarta-feira: Daniel 8.18; Quinta-feira: Daniel 10.16-17; Sexta-feira: Romanos 1.22; Sábado: Romanos 1.19. Texto Bíblico básico: Romanos 17.22-31. LIVRO I - 1: SOBRE O CONHECIMENTO DE DEUS, O CRIADOR. O CONHECIMENTO DE DEUS E O CONHECIMENTO DE NÓS MESMOS. Ninguém é capaz de ter uma boa compreensão de si mesmo se continuar ignorando a Pessoa de Deus. Pois não somos autossuficientes na nossa origem e nem conseguimos sobreviver no mundo por nossa própria capacidade. “A soma total da nossa sabedoria... abrange estas duas partes: o conhecimento que se pode ter de Deus, e o de nós mesmos.” A observação da majestade de Deus e das maravilhas da Sua criação propicia que reconheçamos a nossa pequenez, sensação que nos faz buscar a Deus com o correto temor, o que também nos faz deseja-lo intensamente para que nos abençoe ainda mais. Pois somente a boa compreensão da nossa pobreza e das limitações da humanidade nos indicará que a fonte de toda sabedoria está em Deus. E que é preciso desprezar todo conhecimento parcial para receber a verdade completa acerca de Deus. “Por outro lado, está certo que ninguém adquire qualquer conhecimento certo de si mesmo até ser trazido face a face com Deus.” O nosso orgulho naturalmente ensina que somos superiores, de tal forma que somente a perfeição do Senhor irá revelar a pequenez da nossa natureza humana. Nossa hipocrisia natural logo nos satisfaz com algo que é falso, e qualquer coisa que não é de todo ruim já consideramos boa e perfeita. “Até que olhemos mais alto do que a terra, pareceremos semideuses para nós mesmos." É necessário considerar as perfeições de Deus a fim de que nossa pretensa sabedoria seja percebida como uma tolice. “Surge daí aquele temor e espanto que tem caído sobre os que tem fé cada vez que tiveram consciência da presença de Deus. E frequentemente clamavam: “Com certeza vamos morrer, pois vimos a Deus” (Jz 13.22, Is 6.5, Ez 1.28, 3.14, Dn 8.18, 10.16-17). As experiências de Jó, Abraão, Elias e Isaías confirmam que somente a majestade de Deus revela a nossa verdadeira ignorância. Pois qual deveria ser a reação dos homens quando os próprios Querubins de Deus cobrem o rosto cheios de temor diante d´Ele? Eis as razões para saber que o melhor aprendizado indica que devemos aprender primeiro acerca do conhecimento de Deus, para só depois realmente aprender algo a partir do conhecimento de nós mesmos. LEITURA e DEBATE: "O nosso orgulho naturalmente ensina que somos superiores, de tal forma que somente a perfeição do Senhor irá revelar a pequenez da nossa natureza humana. Nossa hipocrisia natural logo nos satisfaz com algo que é falso, e qualquer coisa que não é de todo ruim já consideramos boa e perfeita. “Até que olhemos mais alto do que a terra, pareceremos semideuses para nós mesmos." É necessário considerar as perfeições de Deus a fim de que nossa pretensa sabedoria seja percebida como uma tolice.". 2: O QUE SIGNIFICA CONHECER A DEUS. Para que seja possível saber verdadeiramente quem é Deus, é preciso obter um conhecimento d´Ele que seja para o nosso bem e que nos faça honra-lo de modo adequado. Um conhecimento básico e real como aquele que Adão tinha antes da queda que afastou a humanidade de Deus. Ainda que o conhecimento da Pessoa de Deus que temos em Jesus Cristo seja essencialmente maior, pois não apenas sabemos que fomos criados e somos sustentados pra viver, e ainda agraciados por Deus em tudo nesta criação. Mas, bem mais do que isto, em Cristo nós percebemos como Deus governa a história dos homens com sabedoria e um cuidado amoroso inigualáveis – um entendimento que nos faz reconhecer como dependemos d´Ele para tudo, o que só aumenta a nossa gratidão. Pois qual é a utilidade de saber que Deus existe, se como afirma Epicuro, Ele deixa a vida nos levar de qualquer jeito? Ora, o conhecimento correto de Deus é aquele que nos faz busca-lo para d´Ele receber cada uma de suas bênçãos excelentes. Será possível ter algum conhecimento verdadeiro de Deus, caso esqueçamos que fomos criados por Ele e de que hoje mesmo Ele está sustentando todo este mundo? E de que toda a vida deve ser guiada pelas mãos d´Ele, pois toda a nossa história lhe pertence? A religião sincera surge quando o homem se afasta de qualquer pecado em razão de ter percebido o amor de Deus, e não por causa do medo do castigo. Eis a razão pela qual há muita gente religiosa no mundo, pois há pouca sinceridade de coração na alma dos homens. LEITURA e DEBATE: A religião sincera surge quando o homem se afasta de qualquer pecado em razão de ter percebido o amor de Deus (...)". 3: O CONHECIMENTO DE DEUS É IMPLANTADO NO CORAÇÃO DO HOMEM DE MODO NATURAL. A consciência da existência de Deus está em todos os seres humanos. O escritor Cícero disse que não existe um povo ou nação tão bárbaros a ponto de não saberem da existência de um Deus. A própria idolatria isto comprova, já que os homens preferem adorar pedaços de madeira e pedras a se declararem ateus. Eis a razão porque se diz que a religião não é uma invenção humana, ainda que homens espertos dela se utilizem para submeter as pessoas. Pois até estes enganadores tem a sua crença e junto deles também alguns dos piores homens, como Caio Calígula, que despreza a Deus, mas treme diante do Altíssimo ao menor sinal da ira divina. Eis porque se sabe que a existência de Deus é uma verdade que nenhum homem consegue arrancar de seu coração. 4: ESTE CONHECIMENTO É ABAFADO OU CORROMPIDO, PARCIALMENTE PELA IGNORÂNCIA E PARCIALMENTE PELA MALDADE. Embora todos os homens tenham esta semente religiosa em si mesmos, nenhum deles sequer consegue faze-la amadurecer corretamente, de modo que não há piedade verdadeira no mundo. Mas esta tolice gravíssima não os livra, porém, de serem responsabilizados por sua rebeldia e de serem culpados por sua vaidade. Pois rapidamente analisam Deus a partir de si mesmos enquanto único padrão de avaliação. Eis como naturalmente se afastam do Deus verdadeiro a fim de se apaixonarem por um sonho do próprio coração, conforme afirma Paulo: “Dizendo-se sábios, tornaram-se tolos.” (Rm 1.22). As palavras de Davi: “Os tolos dizem em seu coração: “Não há Deus”; trata destes homens que sufocam em si mesmos a luz da revelação natural da grandeza de Deus. Davi afirma que eles negam Deus totalmente quando desacreditam em seu governo ao dizer que o Senhor está ausente da história. E explica que não há temor algum em seus corações, pois até se orgulham de suas maldades. Mas ainda que desprezem a Deus, eis que o Senhor os chama para seu tribunal vez ou outra pela voz das suas consciências. Tal entendimento esclarece o grave engano de toda religiosidade comum dos homens a partir de seus próprios fundamentos. Pois esquecem que a religião verdadeira precisa ser completamente definida tendo por base o verdadeiro ensino de Deus. Eis porque Paulo disse aos Efésios que continuariam distantes de Deus, caso permanecessem sem um conhecimento correto do único Deus verdadeiro. A culpa dos seres humanos é gravíssima, então, pois somente buscam a Deus quando seu próprio medo a isto lhes obriga. E rápido praticam suas próprias regras e ritos num projeto religioso enganoso tentando agradar a Deus, esquecendo que estas atitudes os tornam ainda mais desobedientes à luz das verdades divinas. Eis como no cotidiano de suas vidas tornam-se regularmente desobedientes, procurando sempre ficar de bem com Deus através de uma falsa religiosidade – maneira pela qual acabam apagando de seus corações as fagulhas do conhecimento de Deus que naturalmente carregam consigo. Desprezam Deus na riqueza e correm atrás d´Ele nas dificuldades. E revelam através de falsas orações curtas que não desconhecem o Senhor, mas sim, escondem de si mesmos o conhecimento de Deus que existe em seus corações. LEITURA e DEBATE: Eis como no cotidiano de suas vidas tornam-se regularmente desobedientes, procurando sempre ficar de bem com Deus através de uma falsa religiosidade (...)". 5: O CONHECIMENTO DE DEUS RESPLENDE NA ESTRUTURA DO UNIVERSO E NO GOVERNO CONTÍNUO DO MESMO. “Como a sua natureza essencial é incompreensível e está oculta à inteligência humana, ele gravou em cada uma de suas obras certos sinais da sua gloriosa majestade, pelos quais ele se dá a conhecer segundo a nossa diminuta capacidade.”(*) É impossível abrir os olhos para enxergar a natureza da criação e ainda ignorar a Pessoa de Deus. Pois Ele se revela na estrutura do mundo, ainda que seu Ser essencial permaneça oculto. Eis o motivo para que o Salmo 19 descreva a natureza e o mundo em um movimento que deseja apresentar o próprio Deus, algo que o Apóstolo Paulo explicou ser o modo como Deus revela seu grandioso poder através das coisas que foram criadas. (Romanos 1.19). “Estamos cercados por todos os lados pelas provas da maravilhosa sabedoria do Criador.” Existem obras de Deus que estão visíveis a todas as pessoas e há outras que somente os cientistas conseguem entender, como as órbitas e movimentos dos planetas e estrelas – que são segredos da sabedoria divina. A própria anatomia do corpo humano revela a destreza e exatidão do Criador da humanidade, o que motivou filósofos a definirem o “homem (como) um microcosmo, um pequeno mundo, porque ele é uma amostra tão maravilhosa do poder, da bondade e da sabedoria de Deus.” Enfim, Deus não está longe de cada um de nós (Atos 17.27), mas é preciso buscá-lo além do conhecimento que temos quando apenas analisamos o nosso próprio organismo e toda a criação. LEITURA e DEBATE: É impossível abrir os olhos para enxergar a natureza da criação e ainda ignorar a Pessoa de Deus. Pois Ele se revela na estrutura do mundo, ainda que seu Ser essencial permaneça oculto. CONCLUSÃO Eis a vergonhosa ingratidão dos seres humanos diante da Pessoa de Deus, pois cada vez que percebem algum traço de grandeza e sabedoria em si mesmos ou na criação, rapidamente exaltam a si próprios ou correm para valorizar outra "obra" da natureza. Eis a maneira como desprezam Deus e o conhecimento que Ele está revelando. “Que coisa! Todos os tesouros da sabedoria divina hão de conspirar para dirigir um “verme” de 1,60 de altura, e Deus não há de ter voz ativa no governo do Universo?” Homens enganadores ensinam que a própria alma humana tem uma existência controlada e restrita somente ao corpo do homem, desenvolvendo falsamente a afirmação de Aristóteles de que a alma teria seus próprios órgãos assim como o corpo. Negam a grandeza de Deus e exaltam a natureza em seu lugar. Ignoram tanto o conhecimento científico quanto as sensações do espírito humano que sempre superam a nossa natureza biológica elementar. “O que devemos dizer acerca de tais coisas, senão que as marcas da imortalidade são indelevelmente impressas sobre a natureza humana? Aquilo que alguns tagarelas falam acerca de uma inspiração secreta que vivifica o universo inteiro não é apenas fraco – é totalmente ímpio. Como pode a piedade ser produzida e nutrida nos corações dos homens por esta vã especulação acerca de um intelecto que anima e vivifica o universo?” O correto seria dizer que o próprio Deus estabeleceu e organizou a natureza a fim de jamais confundirmos o Criador com suas obras. “Ademais, quantas manifestações ilustres do poder de Deus nos compelem a pensar n´Ele! Ele sustenta pela Sua própria palavra este arcabouço ilimitado do céu e da terra...”. Deus faz brilhar os céus com trovões e tempestades enquanto movimenta as ondas fortemente e as controla pelas mãos para que fiquem quietas. O Livro de Jó e as profecias de Isaías dão diversos testemunhos acerca do poder de Deus que visualizamos na natureza. Deus revela seu poder enquanto governa as atitudes dos homens e a história da humanidade através da sua Providência! E todos os dias Ele abençoa a todos, ao mesmo tempo que declara sua bondade para com os justos e juízo com os maus. Ao mesmo tempo sabemos que Deus castiga certos crimes hoje, enquanto outros somente serão penalizados no futuro. “Esta providência de Deus é ensinada no Salmo 107.” Deus ajuda os aflitos e protege os perdidos, cura enfermos e levanta os humildes para derrubar os orgulhosos. Tudo que os homens consideram obra do destino ou acaso são provas do cuidado providencial de Deus no mundo. E como o verdadeiro conhecimento de Deus é aquele que deve servir ao nosso bem, a orientação é investigar a vida e a criação para engrandecer a Deus, não para saber mais do mistério de Sua personalidade gloriosa essencial. É importante não esquecer que este conhecimento de Deus que estou apresentando é apenas uma prévia da vida futura completa que ainda existe. Todas as desgraças e injustiças que vemos dia a dia serão tratadas e julgadas por Deus no tempo oportuno, pois conforme diz Agostinho, se todo pecado fosse castigado hoje, não haveria juízo futuro e nem providência no tempo presente. Mas a ignorância dos homens permanece, já que rapidamente passam a acreditar no acaso da vida e esquecem que Deus governa a história diária da humanidade pela sua providência. Eis o motivo pelo qual Paulo afirma que negar a verdadeira religião da revelação de Deus é rejeitar a fé – sempre! Pois somente o Evangelho irá oferecer o conhecimento verdadeiro e uma consequente adoração digna de Deus aos homens. Eis a razão essencial pela qual sabemos que o maravilhoso brilho da criação sobre a humanidade não é capaz de nos orientar pelo caminho correto diante da Pessoa de Deus. Todos “precisamos de outro guia, de uma luz mais brilhante, para nos trazer ao verdadeiro conhecimento do nosso Criador.” LEITURA e DEBATE: a) Embora todos os homens tenham esta semente religiosa em si mesmos, nenhum deles sequer consegue faze-la amadurecer corretamente, de modo que não há piedade verdadeira no mundo. Mas esta tolice gravíssima não os livra, porém, de serem responsabilizados por sua rebeldia e de serem culpados por sua vaidade. Pois rapidamente analisam Deus a partir de si mesmos enquanto único padrão de avaliação. Eis como naturalmente se afastam do Deus verdadeiro a fim de se apaixonarem por um sonho do próprio coração, conforme afirma Paulo: “Dizendo-se sábios, tornaram-se tolos.” (Rm 1.22). b) E como o verdadeiro conhecimento de Deus é aquele que deve servir ao nosso bem, a orientação é investigar a vida e a criação para engrandecer a Deus, não para saber mais do mistério de Sua personalidade gloriosa essencial. (Próximo Estudo) 2: A FIM DE CHEGAR A UM VERDADEIRO CONHECIMENTO DO SEU CRIADOR, O HOMEM PRECISA DA ORIENTAÇÃO E DO ENSINO DAS SAGRADAS ESCRITURAS.

terça-feira, 3 de julho de 2018

as INSTITUTAS do Cristianismo Vol 3, de J CALVINO, um resumo do Resumo de JPWiles

A obra teológica “Institutas” do reformador protestante João Calvino contém uma explicação completa do conhecimento de Deus segundo o Cristianismo. Os temas deste terceiro volume são: NÃO TERÁS OUTROS DEUSES e A TRINDADE DE DEUS. O texto a seguir é o terceiro volume de 25, deste breve resumo extraído do Resumo de J. P. Wiles, escrito no ano de 1920 ( Ensino sobre o Cristianismo – uma edição abreviada de AS INSTITUTAS DA RELIGIÃO CRISTÃ, Publicações Evangélicas Selecionadas, São Paulo/SP) As citações em destaque são do Resumo de Joseph Pitts Wiles. 11: É ILÍCITO ATRIBUIR A DEUS UMA FORMA VISÍVEL; E TODOS AQUELES QUE FABRICAM ÍDOLOS PARA SI, SEPARAM-SE DO DEUS VERDADEIRO. “Devemos firmar-nos solidamente neste princípio: sempre que atribuirmos qualquer forma ou formato a Deus, Sua glória é maculada por uma falsidade ímpia.” Pois Deus decidiu que a glória divina seria somente Sua, proibindo qualquer representação visível de Sua figura, já que são todas inapropriadas: “Não faça para si espécie alguma de ídolo ou imagem de qualquer coisa no céu, na terra e no mar.” (Êx 20.4). “Tenham muito cuidado! No dia em que o Senhor lhes falou no meio do fogo no monte Sinai, vocês não virão forma alguma. Portanto, não se corrompam fazendo ídolos de qualquer forma, seja de homem ou de mulher.” (Dt 4.15-16). Assim como Moisés, Isaías também afirma que é uma ofensa assemelhar “aquele que é imaterial a alguma forma material, aquele que é invisível a uma imagem invisível, aquele que é infinito a um pedaço finito de madeira, pedra ou ouro.” Um pensamento compartilhado pelo Apóstolo Paulo: “E, por ser isso verdade, não devemos imaginar Deus como um ídolo de ouro, prata ou pedra, projetado por artesãos.” (Atos 17.29). Eis a razão pela qual afirmamos que é um insulto à majestade divina fazer qualquer estátua ou quadro para representar Deus. Afinal, quando Deus foi visto face a face fazendo-se representar por sinais, estes eram adequadamente apropriados para transmitir como Sua pessoa é incompreensível: “As nuvens, a fumaça e as chamas, embora simbolizassem a Sua glória, ao mesmo tempo refreavam as mentes de todos os homens de procurarem penetrar mais profundamente.” Um esclarecimento que foi dado a Moisés: “Mas você não poderá olhar diretamente para minha face, pois ninguém pode me ver e continuar vivo.” (Êx 33.20). A própria aparição do Espírito Santo em forma de pomba durou pouco tempo a fim de que a crença n´Ele propiciasse satisfação a partir de Seu poder e Sua graça, jamais pela sua forma. “Os ídolos das nações não passam de objetos de prata e de ouro, formados por mãos humanas.”(Sl 135.15). O salmista está argumentando acerca da imagem dos falsos deuses, pois são feitos de minérios, e esclarece que o brilho dos metais não irá lhes tornar objetos dignos de reverência, pois “nenhuma matéria morta pode ser transformada em deuses. Realmente, como pode o homem, que é uma criatura de um só dia, conferir divindade a um pedaço de metal?” Segue a repreensão do Profeta de Deus: “O ferreiro trabalha na forja para criar uma ferramenta afiada; martela e modela com toda a força. De tanto trabalhar, sente fome e fraqueza, fica sedento e desfalece (...) Corta cedros, escolhe ciprestes e carvalho, planta um pinheiro no bosque, para que a chuva o faça crescer. Então, usa parte da madeira para fazer fogo e com ele se aquece e assa o pão. Depois, pega o que resta e faz para si um deus para adorar.” (Isaías 44. 12, 14-15). “Um ídolo pintado é tão proibido quanto uma imagem esculpida. Os membros da igreja grega, pois, consideram-se livres de toda a culpa porque não tem imagens esculpidas; no entanto, no seu uso de quadros vão a excessos maiores do que os idólatras.” Eu sei que Gregório disse que “as imagens servem de livros para o povo comum.” "Mas se Gregório tivesse aprendido acerca do assunto com o Espírito Santo jamais diria isso.” Jeremias assevera que “ensino de vaidades é o madeiro” (10.8), e Habacuque (2.18), que “a imagem de fundição é mestra de mentiras.” Eis como os Profetas condenam a ideia de que as imagens são os livros do povo comum, pois Deus deseja instruir os homens através do ensino de Sua Palavra e pela ministração de Suas ordenanças. É necessário saber que aqueles que Deus chama para serem seus discípulos não devem ser considerados um “povo comum”, que somente serão capazes de aprender de Deus através de imagens. Mas este povo comum será considerado tolo caso deixe de escutar a doutrina que pode lhes tornar sábios, pois Paulo mesmo adverte que “é mediante a pregação da Palavra que Jesus Cristo é representado como crucificado.” (Gl 3.1). Ora, caso “os homens tivessem sido ensinados fiel e honestamente que Cristo morreu para carregar nossa maldição na cruz”, não haveria necessidade de encher as igrejas com cruzes diversas de todos os tipos. “Não importa se os homens simplesmente adoram uma imagem, ou adoram a Deus na imagem; é idolatria quando honras divinas são atribuídas a uma imagem sob qualquer pretexto.” Veja que até os pagãos utilizavam os mesmos argumentos para sua idolatria que ora encontramos entre alguns cristãos. Pois eles negam a acusação de idolatria “dizendo que prestam às imagens “serviço” (dulia), mas não “adoração” (latria); e alegam que tal serviço pode ser prestado a estátuas e quadros sem qualquer ofensa a Deus... Como se o serviço não fosse algo mais que adoração!... Mas para um grego, o significado daquela palavra é tal que a desculpa se torna a seguinte: “Adoramos imagens sem adorá-las.” Acerca do Sínodo de Nicéia (787 d.C), “o qual decretou que as imagens não somente deveriam ser colocadas nas igrejas, como também deveriam ser adoradas”; desejo aqui apresentar alguns de seus argumentos: um delegado de nome João disse: “Deus criou o homem à Sua imagem; logo, concluo que é correto ter imagens... E outro preletor defendeu assim a colocação de imagens nos altares: “Nem se acende uma candeia, para coloca-la debaixo do alqueire”. Mas o argumento mais engenhoso de todos foi este: “Como temos ouvido dizer, assim o vimos (Sl 48.8). Concluímos, que aprendemos a conhecer a Deus não somente ao ouvir Sua palavra, mas também ao olhar para as imagens.” Enfim, “estou cansado de referir-me a tais absurdos... (pois) que confiança pode ser dada às declarações destes reverendos pais, que manuseiam as Escrituras com tal tolice infantil?...” 12: DEUS É DISTINGUIDO DOS ÍDOLOS, A FIM DE QUE O CULTO SEJA PRESTADO SOMENTE A ELE. “Já dissemos que o conhecer a Deus não pode consistir em vã especulação, mas sim implica em adoração ao Deus a quem conhecemos (...) (e) repito que quando as Escrituras asseveram que há um só Deus, e somente um, elas não estão argumentando em prol do mero nome, e sim, ordenam que nenhuma parte da honra que pertence a Deus seja dada a outro. Nisto vemos quanto a religião pura difere da superstição.” Observe como a religião é corrompida a partir da falsidade e do erro, pois “qualquer licença que tomemos no culto, devido a um zelo apressado e sem consideração, é de natureza supersticiosa.” Não adianta reconhecer estas faltas e permanecer ignorando o fato de que a prática destas atitudes deixam-nos distantes de Deus, além de pouco nos ensinarem acerca de como se deve adorar ao único Deus verdadeiro. O fato é que Deus afirma seus direitos enquanto única Majestade dos céus, e revela seu zelo pela sua disposição de punir todos que O confundem com ídolos. Ao mesmo tempo, Ele próprio define a maneira correta de Lhe oferecer um culto legítimo. Pois a lei de Deus também tem o objetivo de nos desviar de uma adoração corrupta. Veja que a superstição adota certos subterfúgios para seguir deuses falsos, embora busque conservar a aparência de que está servindo ao Deus verdadeiro; pois “concede-Lhe o lugar mais alto, e O cerca com uma multidão de deuses menores, entre os quais distribui suas prerrogativas e atributos; e, assim, com dissimulação astuciosa, a glória da divindade, que deve ser reservada somente para Deus, é mutilada e dispersada.” Foi a partir desta ideia que alguns idólatras e judeus compartilharam poderes do Altíssimo com o maioral dos deuses dos homens na antiguidade. E agora, observamos igualmente que os santos que morreram são exaltados ao lado de Deus. Eis o princípio que se aplica para que sejam utilizadas as expressões “latria (adoração), e dulia (serviço), fazendo uma distinção que os libera para transferir honras divinas a anjos e defuntos." Porém, ambos os termos são usados sem distinção nas Escrituras. "Ademais, todos devem reconhecer que o serviço é algo mais do que a adoração; e é uma distinção imprópria prestar aos santos aquilo que é maior, e a Deus aquilo que é menor.” Veja que o Apóstolo Paulo condena os cristãos da Galácia por servirem aos que sequer eram deuses, (Gl 4.8) denominando tal atitude de uma vã adoração. E nem mesmo Cristo permitiu tal distinção, pois logo respondeu ao tentador: “Adorarás o Senhor teu Deus, e só a Ele servirás.” O próprio Apóstolo João foi reprovado por oferecer ao anjo uma servidão indevida, posto que tal reverência deveria ser demonstrada somente para com Deus. Eu entendo que existe um certo tipo de honra que foi prestada a alguns homens na história, mas somente como uma obediência cívica e cidadã. Pedro igualmente proíbe Cornélio de se prostrar diante dele, pois tal postura é orientada somente para a pessoa de Deus, e a ninguém mais. “Se, portanto, desejamos ter um só Deus, e somente um, lembremo-nos que não deve ser roubado da mínima partícula da Sua glória.” 13: AS ESCRITURAS ENSINAM QUE A ESSÊNCIA (OU SEJA, O SER) DE DEUS É UNA, E QUE CONTÉM TRÊS PESSOAS. "As Escrituras nos informam que Deus é um Ser infinito e que Ele é Espírito." Mas acontece que um antigo teólogo confundiu o Ser divino "ao dizer que tudo quanto vemos e tudo quanto não vemos é Deus." Eis a razão pela qual Deus fala pouco de Sua Pessoa, revelando somente sua grandeza para que não procuremos medi-lo nas mãos, esclarecendo ainda, que é "Espírito", a fim de que não procuremos compreende-lo a partir do que é terreno. O Senhor também afirma que habita nos céus para elevar nossos pensamentos acerca de Si mesmo, ainda que muitos homens tenham "pensamentos antropomórficos acerca de Deus; ou seja, atribuem a Ele uma forma humana porque as Escrituras falam d´Ele como tendo boca, olhos, mãos e pés." Mas tais expressões não tratam de Deus, pois só existem em razão da nossa dificuldade para compreender Sua natureza. Eis o motivo pelo qual estes termos são utilizados pra apresenta-LO para nós. "Mas há outra característica especial por meio da qual Deus Se faz mais distintamente conhecido a nós. Ele não somente nos diz que é Uno, mas sim que três pessoas devem ser conhecidas e distinguidas nEle." O conhecimento desta afirmação é essencial para todo aquele que deseja realmente conhecer o Deus verdadeiro! Observe que "quando o autor sagrado chama Cristo de a expressa imagem da pessoa do Pai, sem dúvida atribui ao Pai uma certa subsistência na qual é diferente do Filho - se posso assim traduzir a palavra grega hypostasis empregada em Hebreus 1.3." Pois o escritor não fala neste texto da essência de Deus - que é indivisível, essência que tanto o Pai como o Filho tem completamente em si mesmos. O que se pretende ensinar é que "visto que o Pai se expressou completamente no Filho, diz-se muito corretamente que o Filho é a expressa imagem da pessoa do Pai." Portanto, o texto bíblico indica que há uma essência particular de Deus Pai que resplandesce no Filho, dando a entender que há uma essência particular no Filho que igualmente o faz uma Pessoa distinta do Pai. "O mesmo argumento se aplica ao Espírito Santo, que é Deus, mas mesmo assim deve ser distinguido do Pai. Portanto, recebemos o testemunho escriturístico de que há três pessoas (hipóstases) em Deus." Alguns desprezam o uso da expressão "pessoas" para distinguir as três personalidades do único Deus, posto que tal termo não está nas Escrituras. "Mas como pode ser ilícito explicar em palavras mais claras aquelas passagens das Escrituras que, para nossa compreensão, são difíceis e obscuras?" Pois homens tementes a Deus foram instigados na história a expor com precisão e clareza a nossa crença, para que homens maus não causassem confusão. Veja que Ário afirmava que Cristo era Deus e Filho de Deus, ao mesmo tempo que negava sua eternidade, declarando que havia sido criado junto de outras criaturas. Daí a necessidade de esclarecer que o Filho é da mesma essência do Pai! Sabélio declarou que os termos Pai, Filho e Espírito Santo são somente maneiras distintas de expressar atributos diferentes de Deus. "Ele mantinha que o Pai era o Filho, e o Espírito era o Pai, sem ordem ou distinção." Eis a razão porque foi necessário definir que há três pessoas distintas em Deus e que na unidade de Deus há uma trindade de pessoas. É necessário saber que a expressão "pessoa" deseja definir o que é peculiar e particular à uma das pessoas divinas, perante as outras. "E com a palavra "subsistência" quero dizer alguma coisa diferente da "essência" ou do "Ser". Pois se o Verbo fosse simplesmente Deus, e nada de particular tivesse em Si, João não poderia ter dito que "o Verbo estava com Deus." E ao dizer que, "e o Verbo era Deus", ele orienta nossos pensamentos de volta à unidade da essência divina." "Concluímos, portanto, que quando a palavra "Deus" é usada de modo simples e indefinida, ela pertence ao Filho e ao Espírito tão verdadeiramente quanto pertence ao Pai." E quando o Pai é colocado ao lado do Filho, ao falar que O ama ou O enviou, cada pessoa divina se torna distinta em sua subsistência pessoal. "Agora passarei a dar provas da Deidade do Filho e do Espírito Santo." Veja que ao ler nas Escrituras acerca da "Palavra de Deus", não somos informados simplesmente de que Deus declarou algo, mas sim, que se trata daquela eterna Sabedoria que está com Deus! Ora, aprendemos de Pedro (1 Pd 1.11) que tanto os profetas antigos quanto os apóstolos falavam pelo "mesmo" Espírito de Cristo. E como o Cristo ainda não havia sido manifestado entre nós, eis que Pedro utilizava a palavra Cristo para designar o Verbo eterno do Pai. Realidade que Moisés observou no momento da criação; "pois atribui à Palavra uma participação na Criação ao dizer expressamente que Deus disse em todas as suas obras, haja isto ou haja aquilo." Os Apóstolos interpretam as Escrituras ensinando que o mundo foi feito pelo Filho (Hb 1.2), igualmente ao que Salomão (Pv 8.22) e o próprio Cristo afirmam: "Meu Pai trabalha até agora, e eu trabalho também." (Jo 5.17). E no princípio de seu evangelho, João "claramente demonstra como Deus, ao falar, criou o mundo." E ensina que o Verbo é causa primária de tudo que existe, sendo eterno como o Pai, mas também distinto na pessoa de Filho. "Seria bom dar aqui uns testemunhos bíblicos à divindade de Cristo." Salmo 45: "Teu trono, ó Deus, permanece para todo o sempre." Em Isaías, o Cristo é "Deus forte, Pai da eternidade, Princípe da Paz" e Emanuel: "Deus conosco". Em Jeremias 23.6: "E este será seu nome: "O Senhor é nossa justiça." "É especialmente digno de nota que as predições no Velho Testamento sobre os atos de Deus são consideradas pelos apóstolos como tendo sido cumpridas em Cristo... Isaías disse que o Senhor dos Exércitos seria uma pedra de tropeço para Judá e Israel". Sentença que Paulo afirma ter se cumprido em Cristo, diante de quem iremos comparecer no tribunal divino, cfe Rm 14.10-11. João testifica que a glória de Jeová vista por Isaías era a glória do próprio Cristo (Is 6). E o próprio Tomé adorou a Cristo com estas palavras: "Senhor meu e Deus meu!" Todos os milagres de Jesus são prova de sua divindade, pois os realizava a partir de um poder inerente a si mesmo, ao contrário dos apóstolos. "Nas mesmas fontes documentárias devemos procurar a prova da Deidade do Espírito Santo." Moisés apresentou esta verdade no registro da criação, ao dizer que o Espírito de Deus pairava sobre as águas, manifestando seu poder sobre o caos. Outro testemunho vêm de Isaías: "Agora, o Senhor Soberano e seu Espírito me enviaram com esta mensagem..."; enaltecendo a presença do Espírito na autoridade dos Profetas e evidenciando sua majestade divina. Mas creio que a melhor confirmação desta verdade acontece em nossa experiência como cristãos, ao reconhecer no Espírito os atributos santos da divindade, sabendo que Ele está em todos os lugares, e ainda nos sustenta e dá vida, como igualmente nos renova para uma vida incorruptível. "Ora, as Escrituras nos ensinam em muitos lugares que por uma energia que não Lhe foi emprestrada, e sim que pertence a Ele mesmo - Ele é o Autor da regeneração. E não somente da regneração, mas também da futura imortalidade." É o próprio Espírito Santo quem nos capacita a sermos sábios e termos eficácia no falar - que são poderes próprios de Jeová. "Vem d´Ele o poder, a santificação, a verdade, a graça e toda bênção concebível."; cfe palavras de Paulo, atribuindo poder divino ao Espírito a fim de esclarecer que Ele é uma pessoa divina: "Tudo isso é distribuído pelo mesmo e único Espírito, que concede o que deseja a cada um." (1 Co 12.11). Agora, há "um testemunho que requer atenção especial": Paulo afirma que somos o templo de Deus, e a promessa do Espírito em nós é que realiza isto, cfe Agostinho: "Se tivéssemos sido ordenados a edificar um templo de madeira e de pedra para honrar o Espírito, essa teria sido prova clara da Sua Deidade: quanto mais clara então a prova que diz que não devemos edificar, mas sim, ser o templo d´Ele! E o Apóstolo Paulo diz num lugar que somos templo do Espírito Santo, com o mesmo significado. Além disso, quando Pedro repreende Ananias por ter mentido ao Espírito Santo, acrescenta: "Não mentiste aos homens, mas a Deus". (At 5.3-4). Veja que o Autor das profecias é verdadeiramente Jeová, reconhecido pelos profetas como o Senhor dos Exércitos, ao mesmo tempo que é confirmado por Cristo e pelos Apóstolos como sendo o Espírito Santo. A majestade do Espírito se revela pela rebeldia do povo que o entristece (Is 63.10) e pelo pecado contra Ele ser uma blasfêmia sem perdão (Mt 12.31; Mc 3.29; Lc 12.10). "Quando Cristo veio ao mundo, Deus Se revelou mais claramente do que nunca e, portanto, ficou sendo mais intimamente conhecido a nós no que diz respeito às Suas três pessoas. Dentre muitas passagens relevantes no Novo Testamento, bastará uma. (Ef 4.5): "Há um só Senhor, uma só fé, um só batismo, um só Deus e Pai de tudo, o qual está sobre todos, em todos, e vive por meio de todos.". O argumento é muito claro: "visto haver uma só fé, pode haver um só Deus; e visto haver um só batismo, pode haver uma só fé." Eis porque somos todos batizados no nome do único Deus verdadeiro, o qual, segundo Cristo ordenou, será em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo. "Além disso, as Escrituras distinguem entre o Pai, o Verbo e o Espírito; mistério este que é tão grande que deve ser tratado com a máxima reverência e sobriedade." Gregório de Nazianzo: "Logo que contemplo um, estou cercado pela glória dos três; logo que meus pensamentos distinguem os três, são levados de volta ao um." Por isso é fundamental saber que reconhecer a Trindade é honrar a unidade do Deus único - sempre, pois o ensino das Escrituras indica distinção sem divisão. O Verbo esteve com Deus e desfrutou de Sua glória porque era distinto d´Ele. O Pai igualmente criou todas as coisas pelo Verbo porque é distinto d´Ele, sendo que não foi o Pai que desceu ao mundo, morreu e ressuscitou, mas sim, aquele que foi enviado pelo Pai. "Cristo infere que há uma distinção entre o Espírito e o Pai, ao dizer que o Espírito procede do Pai; e distingue o Espírito de Si mesmo ao chamá-LO "outro" - "O Pai vos dará outro consolador". Não desejo tratar deste mistério através de ilustrações naturais, ao mesmo tempo em que não posso me calar sobre uma distinção tão claramente definida nas Escrituras. "É da seguinte natureza: ao Pai é atribuído o começo da operação, a fonte e origem de todas as coisas; ao Filho, a sabedoria e o conselho, a dispensação de todo o governo; ao Espírito, o poder e a eficácia demonstrados na ação." E ainda que todos sejam igualmente eternos, como o próprio e único Deus é eterno; "no entanto, a observância de uma certa ordem em falar das pessoas divinas não é vã nem supérflua: o Pai é assim considerado o primeiro, o Filho é da parte do Pai, e o Espírito é da parte de ambos. Nossa mente pensa instintivamente em Deus como sendo o primeiro, e depois, da Sua Sabedoria que procede da parte d´Ele, e finalmente, do poder do Espírito pelo qual os decretos do Seu conselho são executados... Em nenhum lugar é isto mais claramente apresentado do que no cap 8 de Romanos, onde o mesmo Espírito é primeiramente chamado o Espírito de Cristo, e depois, o Espírito d´Aquele que ressuscitou Cristo dentre os mortos." Pedro confirma isto, pois esclarece que os Profetas falaram pelo Espírito de Cristo enquanto as Escrituras ensinam que foi pelo Espírito de Deus Pai que eles falaram, o que os torna igualmente Um. "E esta distinção entre as pessoas em vez de ser oposta à unidade da essência divina fornece uma prova disso. A unicidade do Filho com o Pai aparece nisto: que Eles tem um só Espírito; e o Espírito não pode ser algo diferente do Pai e do Filho por esta mesma razão que Ele é o Espírito do Pai e do Filho. De fato, em cada pessoa está a Deidade inteira, ao mesmo tempo que cada uma tem Sua própria personalidade distinta." Segundo Agostinho: "Cristo, quando considerado somente em relação a Si mesmo, é chamado Deus; em relação ao Pai, é chamado o Filho. E, outra vez, o Pai, considerado em Si mesmo, é chamado Deus; com respeito ao filho, é chamado o Pai. O Pai não é o Filho, e o Filho não é o Pai, mas o Pai e o Filho são o mesmo Deus." Portanto, é necessário afirmar com sobriedade que cremos em um só Deus,"único e indiviso, em quem há três pessoas; e, portanto, quando usamos o vocábulo "Deus" de modo indefinido, queremos dizer o Filho e o Espírito tanto quanto o Pai." Acerca do bom respeito à ordem da Trindade, sempre que citamos o nome do Pai junto do Filho, a palavra Deus servirá somente ao Pai, já que dizemos: o Filho de Deus e o Espírito de Deus. Pois quando honramos a ordem das Pessoas nós reverenciamos a essência Una de Deus, ao mesmo tempo em que não desprezamos a Divindade do Filho e do Espírito. (pgs 51 a 71 do Resumo das Institutas de J P Wiles)