sexta-feira, 19 de maio de 2023

O AUMENTO DA SOLIDÃO E A CRISE DA RELIGIÃO NO SÉC. 21.

Esse texto é um breve resumo com citações e estatísticas do artigo de Guilherme de Carvalho, teólogo e cientista da religião, para o jornal 'A Gazeta do Povo'; "E se a 'crise da religião' não for uma crise da religião?", (17/11/2023). O autor inicia refletindo sobre pesquisa do cientista político Ron Inglehart acerca do 'declínio da religião', que revela um grande desinteresse da população pela religiosidade neste século, algo que nega o pensamento do sociológo Peter Berger, que entendia que o avanço da modernidade não iria prejudicar a religião. Nesse contexto, "Ron Inglehart descobriu que, em todos os países nos quais temos uma desregulamentação das leis e mudança dos costumes nos campos do sexo, fertilidade e família, segue-se um estonteante colapso da religião organizada, em apenas uma geração". A partir daí, Guilherme de Carvalho destaca o que entende ser mais verdadeiro sobre essa 'grande crise da religião'. "A tese de Inglehart é a de que a pertença religiosa está ligada a um tipo de ética de comunidade com regras estritas de engajamento e compromisso.", e quando há abandono ou mudança drástica destas regras, a própria religião enfraquece na sua condição de gerar socialização entre as pessoas. Neste sentido, percebe-se que junto da crise da religião vemos a ocorrência de "uma crise geral da sociabilidade", portanto, para Carvalho, "a crise da religião é tão somente um aspecto da crise da comunidade na contemporaneidade". Evoluindo sobre o tema, Carvalho traz o resultado de uma pesquisa da revista The Atlantic acerca dos níveis de apego relacionais da América, o que de forma resumida apresenta que o 'apego seguro' (que depende dos outros e se deixa depender) está 15% menor, enquanto que os apegos 'evitativos' (que se fecha ao outro e evita a relaçao social) cresceram 56% e o 'apego' desorganizado (que busca intimidade, mas manipula e cria confusões) cresceu 18%. No período de divulgação desta pesquisa, a maior autoridade do sistema de saúde norte-americano, cirurgião geral Vivek Murthy "advertiu sobre o impacto devastador da 'epidemia de solidão e isolamento social nos EUA', junto de um relatório apresentando essa epidemia e "discutindo 'os efeitos curadores da conexão social e da comunidade'. Uma situação em que a fragilidade dos relacionamentos sociais devido "a pobreza de conexões sociais" foi relacionada com o aumento das seguintes enfermidades na humanidade neste século 21: + 29% de doença do coração, + 32% de infarto, + 50% de demência em adultos, + 60% de morte prematura, "além do aumento da depressão, inclusive em 'crianças'. Esses estudos e análises chegaram a seguinte conclusão: "a atual geração de jovens tem agora o dobro de risco de sofrer de solidão do que idosos com mais de 65 anos". As más notícias continuam, pois junto disto tudo, há uma grave 'queda do índice de confiança generalizada no país', sendo que a 'confiança entre as pessoas é um dos maiores indicadores de alto capital social e de associativismo criativo em qualquer sociedade'. Como resultado disto, os norte-americanos não confiam mais uns nos outros e o número de horas em que passam com os amigos diminui junto. Ainda, os números ruins estão presentes em diversos outros aspectos da vida dos americanos, pois o tempo dedicado a vivências sociais junto da família, amigos e outras pessoas tem caído, junto da queda do número de casamentos, enquanto os divórcios aumentam, "bem como o número de pessoas vivendo sozinhas". Nesse contexto, Carvalho anota e reflete que, "como era de se esperar, caiu a frequência à igreja, de 70% em 1999 para 47% em 2020. Será possível que a "crise da religião" não seja, na verdade, da religião?". Até porque trata-se de uma questão mundial, pois a denominada 'epidemia da solidão' é tanto uma queixa geral como ainda, um tema de estudo sem números comprováveis, e em meio à essa situação, a revista Lancet decidiu estudar o tema e publicar o artigo, "A solidão como questão de saúde". Neste tema, o Brasil encontra-se em situação grave, pois em pesquisa junto a 28 países, estamos no penúltimo lugar, com 52% de reclamações sobre solidão e 46% de sofrimento mental, enquanto a média mundial é de 41%. Nesse contexto de crise relacional e aumento da solidão, percebe-se que há um certo 'apagão sexual' ocorrendo na geração Z, de 18 a 24 anos, que pratica menos sexo que as gerações antecedentes; o que ocorre também com outras gerações, sendo algo já anotado na Inglaterra, numa realidade diagnosticada como "uma tendência internacional", em que cada vez se pratica menos sexo. Alguns motivos seriam a pornografia e relações virtuais tomando espaço das pessoais, muito entretenimento e também o cansaço, com as mulheres dedicadas às carreiras profissionais cada vez praticando menos sexo. Esse apagão sexual está junto da ocorrência de um grave "apagao nas amizades - menos encontros face a face com amigos", com jovens entre 15 a 24 anos sofrendo mais que as outras gerações, já que o tempo com amigos caiu 70% neste século 21, sendo que "entre 2012 e 2018 a solidão adolescente dobrou ao mesmo tempo em que o smartphone se universalizava". O aspecto destacado como uma das razões desta realidade é a mudança das relações sociais, em que atualmente se busca o "perfil moral W.E.I.R.D, que é basicamente sentimentalista e individualista, afastando-se da psicologia moral mais conservadora e moderada, que, segundo o psicólogo social Jonathan Haidt, tem uma direção sociocêntrica". Em meio a tudo isso, Guilherme de Carvalho retoma seu ponto inicial, entendendo que a denominada 'crise da religião talvez não seja, fundamentalmente, a crise da religião... talvez a questão seja outra: à medida que a composição do Estado de bem-estar social, entretenimento tecnológico e individualismo expressivo torna as pessoas mais autocentradas e menos sociais, a religião perde seu apelo". "A cultura do Self é incompatível com o cristianismo e, por isso, com a felicidade humana. A morte solitária dos modernos não é um mistério inexplicável, mas o resultado previsível do abandono da fé". E para concluir e ainda desafiar os cristãos, observe que, se estes dados e proposições, análises e resultados estiverem corretos, eis o modo em que "comunidades religiosas autênticas e cheias de vida podem se tornar, no futuro, verdadeiras ilhas de saúde mental em um mar de solidão e isolamento." Portanto, a questão fundamental não é se a religião irá sobreviver, ou não, mas sim se conseguirá promover a "sua obra de catalisar comunidades, a obra do amor. Se a igreja buscar amar, em vez de apenas existir, não viverá ela para sempre?". (Guilherme de Carvalho, artigo: "E se a "crise da religião" não for uma crise da religião?"). Segue em complemento, breve reflexão sobre os relacionamentos amorosos da humanidade na atualidade, pois mesmo que os cristãos saibam que não devem "amar" o mundo, no entanto, a cobiça dos olhos está sempre mais perto e constante, cada vez mais diversa e inebriante, já que tudo e mais um pouco está a um toque do celular. E como a marca da nossa raça é estarmos numa situação existencial gravemente carente, bem, tudo que for colocado diante de nós, logo será uma "boa" possibilidade pra acalmar o coração vazio e o corpo ansioso. É só dar uma olhada na quantidade diversa de experiências sensuais que a moçada e todo mundo tem praticado cada vez mais cedo neste século 21. Tudo saído de nossa "carência raiz" profunda e da bastante humana "visão nutella" sensual, que só produz mesmo é solidão da alma e confusão relacional. Daí que os cristãos precisam avançar o sinal da religiosidade e buscar nas Escrituras o conhecimento bendito disto tudo, sendo algo que nossos adolescentes e a juventude precisam aprender o quanto antes, melhor. Com todo o conhecimento científico clássico e boa autoridade familiar cristã, lógico. Inicialmente, devemos apresentar a oração do Pai Nosso o quanto antes para as novas gerações, especialmente o pedido maior de nosso tempo; "Não deixa eu cair na tentação". E aqui, valem dois toques: - se os meninos e os rapazes cristãos continuarem transformando meninas e moças em produtos virtuais e buracos físicos de suas necessidades, bem, eles serão os maiores responsáveis pelo crescimento da solidão feminina - cada vez mais em fuga da presença masculina. Pois não há mulher de qualquer idade que consiga aguentar a opressão que hoje os homens chamam de relação, íntima. De outro lado, quanto mais meninas donas do pedaço vão sendo formatadas nas redes masculinizadas e escolas sociais sem identidade, igualmente os homens jovens seguirão perdidos na hora de achar uma menina pra abraçar como namorada, sua. Daí surge a necessidade de orientar os cristãos sobre princípios de sexualidade, cada vez mais cedo, observando sempre a condição intelectual e sensivel, física e emocional da idade deles. Até porque a crise da religião está vinculada com a crise relacional que impulsiona a juventude e todas as gerações para a solidão, enquanto esquecemos que o padrão bíblico do relacionamento íntimo entre homem e mulher orienta o encontro completo de uma só carne, consciência e alma, sentimentos e pensamentos, enquanto não nega o abraço inicial que se torna intimidade total numa relação simples movida pelo contato outrora chamado simplesmente de amor. É isso! Vamos logo ensinar os meninos e meninas a amar Jesus, o próprio corpo e principalmente o próximo. Com respeito e sensibilidade, antes que seja mais tarde do que já ficou. Oremos, bastante! Autor. Ivan S Rüppell Jr é professor, advogado e ministro licenciado da Igreja Presbiteriana, atuando na gestão de parcerias de ação social e evangelização.

MEDITAÇÃO DOMINICAL. Oração da Manhã.

TEXTO Bíblico. "De manhã, Senhor, ouves a minha voz; de manhã te apresento a minha oração e fico esperando." (Salmo 5.3). MEDITAÇÃO. Há um hino antigo que chama os cristãos pra oração logo cedo: "Bem de manhã, embora o céu sereno, pareça um dia calmo, anunciar. Vigia e ora, o coração pequeno, um temporal pode abrigar." O Apóstolo João escreve em sua primeira carta que existe um convite constante no Evangelho para a humanidade ter Comunhão com Deus. João diz aos cristãos do primeiro século que havia uma Comunhão disponível a todos, que é a Comunhão com o Pai e com o Filho. A experiência espiritual desta Comunhão e encontro com Deus é estar na luz e afastar-se das trevas. E a essência deste relacionamento não é tanto, nunca Pecar, mas sim, Confessar os pecados. Pois Deus é fiel e justo para perdoar os pecados que confessamos. De modo que uma Humanidade raiz pecadora vai estar na Luz de Jesus quando buscar o tratamento dos pecados, e não a negação religiosa destes. Assim, ao saber que somos mesmo pecadores, o momento ideal da Oração é logo de manhã. Porque depois que iniciamos nossas conversas nas Redes sociais ou junto de familiares e colegas de trabalho; bem, o mal de cada dia já estará sendo feito, por palavras e atitudes oriundas de um coração pecaminoso irritado. Cuidado! Por isso, então, canta o hino: Bem de manhã, e sem cessar, vigiar e Orar! ORAÇÃO. Santo Deus e Pai Nosso que está nos céus, perdoa e purifica nossos pecados. Limpa o nosso coração e aquieta nossa ira e irritação. Quebra nossa vaidade e maldade, e ilumina a nossa alma. E não deixa a gente cair em tentação, mas livra-nos do mal. Amém! Autor. Ivan S Rüppell Jr é Professor de Ciências da Religião e Teologia.

sexta-feira, 12 de maio de 2023

MEDITAÇÃO DOMINICAL. A Mãe de Deus!

TEXTO Bíblico. "Vendo Jesus, a sua mãe, e junto dela o discípulo amado, ele disse: Mulher, eis aí o seu filho. Depois, disse ao discípulo. Eis aí a sua mãe." (Evangelho de João, cap. 19. 26-27). MEDITAÇÃO. Perto de entregar seu espírito ao Pai na cruz, Jesus dá um filho pra Maria cuidar, e dá para João uma mãe pra cuidar, honrando sua família. Honrar pai e mãe é um daqueles mandamentos de Deus em que os obedientes irão receber bençãos de tudo quanto é jeito. Deus vai se aproximar do filho obediente pra melhorar a nossa comunhão espiritual com Ele, e os Anjos do Senhor também vão acampar ao redor dos obedientes que o temem! Deus promete vida longa aos filhos obedientes, sendo que estes filhos irão viver em harmonia na família. E como as Autoridades foram instituidas por Deus, o entendimento do valor da autoridade desde a infância, também irá nos ensinar a bem contar (viver) os nossos dias, para que alcancemos coração sábio. Além destas bençãos, eis que Jesus ensina pra humanidade um conhecimento pleno de compaixão, quando cuida de sua mãe lhe indicando um filho pra atende-la como sua família. ORAÇÃO. Santo Deus e Pai Nosso que está nos céus. Santificado seja o teu Nome. Abençoa as nossas famílias e lares. Converte o coração dos pais aos filhos e converte o coração dos filhos aos pais. Abençoa e protege as Mães, e revela o conhecimento de Jesus o Messias, para todas elas. Amém! Feliz Dia das Mães. Autor. Ivan S Rüppell Jr é professor de Ciências da Religião e Teologia.

quarta-feira, 10 de maio de 2023

Teologia Apocalíptica. Análise em duas obras. SPS, extensão Curitiba, 2023.

DISCIPLINA Teologia Apocalíptica, Seminário Presbiteriano do Sul, extensão Curitiba. Resumo e citações para uso em aula. Livro: Panorama do Novo Testamento, Robert H GUNDRY, Edições Vida Nova, 1998, São Paulo SP. INTRODUÇÃO GERAL. "O Apocalipse (termo grego que significa "desvendamento") contém profecias mais extensas sobre o futuro do que qualquer outra porção do Novo Testamento. Essas profecias projetam luz sobre o triunfo escatológico de Cristo sobre as forças do Anti-Cristo deste mundo - a começar pela tribulação e atingindo seu clímax na parousia e chegando ao término com a plena concretização do reino de Deus - tudo para decisivo encorajamento dos crentes que enfrentam o antagonismo de uma sociedade incrédula." (p. 407). DESENVOLVIMENTO. Capítulo 3. História Política e Intertestamentária e do Novo Testamento. O Período Romano. "O século VII A.C. viu a fundação de Roma, e no século V A.C. houve a organização de uma forma republicana de governo ali sediada (...)"; sendo que nos dois últimos séculos antes do século I de Cristo, o Império Romano alcançou vitórias e conquistas territoriais na África do Norte, extremo oriente do Mediterrâneo e Gália, até que após a vitória sobre o Egito, Augusto se fez imperador de Roma em 31 A.C., e "dessa maneira, pois, Roma passou de um período de expansão territorial para outro, de paz, o que se tornou conhecido como Pax Romana. A província da Judéia interrompeu essa tranquilidade mediante grandes revoltas, que os romanos esmagaram nos anos de 70 a 135 D.C."; com destaque para como a estabilidade do império romano facilitou a comunicação da mensagem cristã neste período da história. (p. 11). Os seguintes imperadores romanos são citados no Novo Testamento: Augusto, 27 A.C. até 14 D. C.; Tibério, 14 a 37 D.C.; Calígula, 37 a 41 D.C.; Cláudio, 41 a 54 D.C.; Nero, 54 a 68 D.C.; Vespasiano, 69 a 79 D.C., e, "Domiciano (81-96 D.C.), cuja perseguição contra a Igreja provavelmente serviu de pano-de-fundo para a escrita do Apocalipse, como encorajamento para os cristãos oprimidos." (p. 13). Roma definia o modo em que "governantes nativos vassalos" atuavam na Palestina, de forma que Pilatos governou e agiu como Juiz no julgamento de Jesus, enquanto os governantes Félix e Festo atenderam reivindicação do Apóstolo Paulo; "e quando o governador Floro pilhou o tesouro do templo, isso foi o estopim da revolta dos judeus, em 66-73 D.C.", com destaque para o modo em que sacerdotes judeus e componentes do Sinédrio (Tribunal) organizavam o cotidiano social do povo judeu, até que a derrubada do templo e destruição de Jerusalém em 70 D.C. vieram a encerrar a adoração sacrificial judaica. A partir daí lideranças judaicas se reuniam na cidade mediterrânea de Jamnia, enquanto na Palestina o Imperador Hadriano edificou um templo para Júpiter no local do antigo templo de Jerusalém, ocorrendo uma revolta judaica ao redor do ano 132 D.C. sem sucesso, com os judeus sendo expulsos e proibidos de entrar em Jerusalém, de forma que o Estado Judaico somente voltou a existir no século 20, no ano de 1948. (p. 16). Capítulo 3. O Ambiente Religioso do Novo Testamento. "A religião oficial de Roma adotou grande parte do panteão e da mitologia gregos. As divindades romanas vieram a ser identificadas com os deuses gregos (Júpiter com Zeus, Vênun com Afrodite, e assim por diante) (...) Seguindo a prática desde há muito firmada de atribuir atributos divinos aos governantes, o senado romano lançou a ideia do culto ao imperador, ao deificar, após a morte, a Augusto e a subsequentes imperadores que porventura tivessem servido bem como tais. (...) Domiciano (81-96 D.C.) foi o primeiro a tomar providências sérias e generalizadas para forçar a adoração de sua pessoa. A recusa dos cristãos em participarem do que passou a ser tido como um dever patriótico, como uma medida tendente a unificar o preito de lealdade ao imperador, como uma divindade, provocou uma perseguição que foi crescendo de intensidade." (p. 38-39). Capítulo 20. Apocalipse. Ele Vem Vindo! (p. 407). A escrita provável do Apocalipse seria o reinado de Domiciano, entre 81 a 96 D.C., um imperador que não ordenou grandes perseguições, porém, "a sua tentativa de pôr em vigor a adoração ao imperador foi um presságio das violentas perseguições que se seguiriam. O Apocalipse teve por desígnio, portanto, preparar os crentes para a resistência." (...) "O estilo típico da literatura apocalíptica empregado no Apocalipse exibe uma linguagem exaltadamente simbólica na descrição de suas visões. Essas visões retratam o final da história, quando mal houver atingido seu limite máximo e Deus tiver feito intervenção para dar início ao Seu reino, para submeter os ímpios ao julgamento e para galardoar os justos. E tudo isso é exposto não a fim de satisfazer mera curiosidade quanto ao futuro, mas a fim de encorajar o povo de Deus a não fraquejar diante de um mundo dominado pela iniquidade", com João utilizando expressões do AT, particularmente de Daniel, Ezequiel e Isaías. As surpreendentes figuras apresentadas no livro causam estranheza nos leitores atuais, "mas elas transmitem aos leitores as proporções cósmicas dos eventos descritos de maneira muito mais eficaz do que jamais poderia tê-lo feito a linguagem prosaica." (p. 409-410). 4 Olhares de Interpretação do Apocalipse: "O ponto de vista idealista despe a linguagem simbólica de qualquer valor como predição (...) reduz a profecia a um quadro simbólico sobre o conflito contínuo entre o bem e o mal, entre a Igreja e o paganismo, com o triunfo eventual do cristianismo. (...) O ponto de vista preterista (...) limita o Apocalipse à mera descrição das perseguições contra o cristianismo movidas pela antiga Roma (...) mediante a destruição do império romano e a vindicação dos cristãos quando da volta de Cristo, supostamente iminente (como Jesus não voltou), os preteristas procuram redimir o resíduo de significação da obra para os tempos modernos, (abraçando a visão) idealista. (...) O ponto de vista histórico interpreta o Apocalipse como uma simbólica narrativa prévia da história da Igreja, a contar da era apostólica até ao retorno de Cristo e ao juízo final. (...) o quebrar dos selos representaria a queda do império romano, os gafanhotos (...) as invasões muçulmanas, a besta apontaria para o papado (de acordo com os reformadores Protestantes), e assim por diante. (...) O ponto de vista futurista reconhece que o Apocalipse teve começo motivado pela pressão exercida por Roma sobre a Igreja, durante o primeiro século cristão, e que o livro falava diretamente àquela situação; mas também assegura que o volume maior da obra descreve um período futuro angustioso e caótico, que recebe o título de "tribulação", seguido de perto pelo retorno de Cristo, pela inauguração do reino de Deus, pelo julgamento final e pelo estado eterno. (...) O ponto de vista aqui adotado é primariamente o futurista, mas sem esquecer que João estava escrevendo não somente para o fim desta era, mas também para os cristãos a ele contemporâneos e, de fato, para os crentes de cada geração. Em particular, o conflito entre o cristianismo e os césares corresponde à peleja entre o povo de Deus durante a tribulação (quer a Igreja ou outra porção desse povo) e o Anticristo, o qual governará sobre o redivivo império romano. O Apocalipse retém sua relevância de modo perene por causa da possibilidade que tem cada geração sucessiva de ver o cumprimento do livro em suas predições." (p. 410-412). DISCIPLINA Teologia Apocalíptica. Comentário do Novo Testamento. Simon KISTEMAKER. Apocalipse. São Paulo: Editora Cultura Cristã, 2004. Tradução de Valter Martins. São Paulo, SP. Resumo com citações extensas, no objetivo didático. "O título grego deste livro é Apokalypsis (aquilo que está sendo descoberto); os leitores, porém, podem sentir que não há muito a ser revelado. O Livro do Apocalipse não parece concretizar o que seu título promete, confundindo seus leitores com todas as imagens, figuras e números que ali se encontram {...} Quando examinamos cuidadosamente este livro, começamos a compreender que ele não é uma mera composição humana semelhante aos apocalipses de I Enoque (2 Esdras no OT Apocrypha) e 2 Baruque. No Apocalipse, o Deus Triúno está revelando sua Palavra ao leitor, isto é, Deus mesmo está falando ao seu povo. Isso se faz evidente nas palavras introdutórias: "Revelação de Jesus Cristo, que Deus lhe deu" (1.1), e nas cartas às sete igrejas. Ali ouvimos a voz de Jesus, que conclui cada carta com as palavras: "o Espírito diz às igrejas" (2.7, 1, 17, 29, 3.6, 13, 22). O último capítulo registra a voz de Jesus (22.7, 12-20), a voz do Espírito (22.17) e a advertência divina para que não se acrescente ou subtraia nada deste livro (22.18-19). {...} Todo o Livro do Apocalipse chama a atenção para seu compositor primário, Deus. Ele é o artista divino, o principal arquiteto. Este é um volume divinamente construído no qual Deus exibe a obra de sua mão." {p. 14-15). A. PADRÃO (Estrutura). 1. Os Números. A utilização de números e o seu significado chama atenção na leitura do livro do Apocalipse, com grande valor ao número sete, que "deve ser entendido como uma idéia que expressa totalidade ou completude". Jesus envia cartas para sete igrejas, no entanto, se formos avaliar a situação geográfica das igrejas destinatárias das cartas e outras existentes, veremos que há igrejas que são omitidas, como a de Colossos, Heliópolis e Trôade, o que orienta o entendimento de que "Jesus se dirige às igrejas de todos os tempos e todos os lugares. O número sete simboliza completude. O número sete antecede muitos substantivos, inclusive espíritos, castiçais de ouro, estrelas, castiçais, selos, chifres, olhos, anjos, trombetas, trovões, coroas, cabeças, pragas, taças, montes e reis. Além disso, há sete mil pessoas mortas por causa de um terremoto (11.13) {...} Há duas passagens que registram cânticos de louvor entoados por uma hoste celestial, ambas com sete atributos: 5.12 e 7.12. Há sete beatitudes no livro, 1.3, 14.13, 16.15, 19.9, 20.6, 22.7 e 22.14, além de outros elementos, como "o termo a(s) palavra(s) de Deus, (que) aparece exatamente sete vezes (1.2, 9; 6,9; 17.17; 19.9, 13; 20.4)". (p. 15-16). "O número quatro representa as quatro criaturas viventes, quatro anjos, quatro cantos da terra, quatro ventos e quatro anjos atados junto do Eufrates. Categorias de quatro permeiam todo o Apocalipse." - 5.9; 5.13; 6.8; 5.8, 16.18; 9.21; 10.11; 18.22. "O número quatro descreve a criação divina: os quatro cantos da terra, isto é, as quatro direções do vento (7.1; 20.8). Deus é o governante de e em sua criação, o que é evidente à luz do uso da expressão relevante "aquele que vive para todo o sempre", que ocorre quatro vezes (4.9, 10; 10.6; 15.7)." "O número três aparece com frequência: três quartos de cevada, três anjos, três pragas de fogo, fumaça, e enxofre; três espíritos imundos; a grande cidade foi dividida em três partes; três portões de cada lado: leste, sul, norte, oeste. A série de três se refere à Deidade com o tríplice clamor das criaturas viventes, dizendo: "Santo, santo, santo" (4.8); e uma descrição do poder de Deus que era, que é e que há de vir (4.8; ver 1.4,8)." "Dez é o número de completude no sistema decimal. Este número no Apocalipse se refere a dez dias de perseguição (2.10); uma descrição do dragão com dez chifres (12.3); a besta que sai do mar com dez chifres e dez coroas (13.1); e a besta escarlate que tinha dez chifres (17.3, 7, 12, 16). Como dez é o número que se relaciona com os servos e atividades de Satanás, o número doze descreve os eleitos de Deus das doze tribos (7.5-8); a mulher, simbolizando a Igreja, com doze estrelas em sua cabeça (12.1); e a nova Jerusalém com doze portões, doze anjos, doze tribos de Israel (21.12)." A Nova Jerusalém tem 12 fundamentos em que estão inscritos os nomes dos 12 apóstolos, medindo 12 estádios, e ao lado do rio e fluindo do trono, vemos a árvore da vida que gera 12 colheitas de frutos (22.2). (p. 16-17). Há, ainda, mais 5 tópicos do Padrão e Estrutura: 2. Contraste: "Apocalipse é um livro cheio de polaridades: Cristo versus Satanás; luz versus trevas; vida versus morte; amor versus ódio; céu versus inferno. Por todo o livro, este contraste vem a lume em todos os detalhes. João retrata a Trindade como Pai, Filho e Espírito Santo; por comparação, a trindade de Satanás é o diabo, a besta e o falso profeta (...); 3. Ênfase: "Quando realçamos algo em impresso, usamos o ponto de exclamação ou escrevemos em itálico. Essas convenções, porém, não eram disponíveis nos dias dos escritores bíblicos. Empregavam a técnica de repetição para chamar a atenção do leitor. (18.2; 18.10, 16, 19)." 4. Repetição: "O princípio de repetição visando à ênfase e clareza é também evidente na descrição da fuga da mulher para o deserto durante 1260 dias, para um lugar que Deus lhe havia preparado (Ap. 12.1-6). Nos últimos oito versículos lemos novamente que ela fugiu para o deserto, em um lugar que lhe fora preparado por um tempo, tempos e metade de tempo (12.14). João apresenta duas descrições do mesmo evento, pois o lugar que Deus lhe preparara é o deserto, e a extensão de tempo é a mesma: 1260 dias igual a 42 meses (11.2, 3) ou 3 anos e meio." 5. Paralelos: "!Todo o livro do Apocalipse se acha permeado de paralelos que são apresentados em múltiplos de sete. Há sete cartas às igrejas da Ásia Menor; há sete selos seguidos de sete trombetas e concluídos com sete taças. Começando com as cartas às sete igrejas, observamos paralelos em sua estrutura. Cada carta consiste de sete partes: (...)." 6. Divisão: "O paralelismo expresso nos três grupos (selos, trombetas e taças) sugere que o escritor não está apresentando uma sequência cronológica, mas sim, diferentes aspectos dos mesmos eventos." 7. Conclusão. "O último livro da Escritura é único em sua estrutura. Revela um autor humano a quem Deus inspirou para escrever o Apocalipse." Os eventos anunciados por João devem ser entendidos como aspectos distintos de uma mesma sequência, de modo que há melhor e mais profundo entendimento a cada novo grupo de ilustrações. "Não é João, mas Deus, quem põe em relevo sua composição com extraordinário cuidado. Apocalipse revela precisão e clareza inigualáveis com respeito à sua estrutura, ao uso de números e figuras, e à escolha de palavras. O último livro da Bíblia demonstra um Deus que age pessoalmente, do começo ao fim." (p. 14 - 24). Autor. Ivan S Rüppell Jr, Professor de Ciências da Religião e Teologia.

quinta-feira, 4 de maio de 2023

Símbolos de Fé. RESUMO. Harmonia das Confissões Reformadas.

Disciplina: Símbolos de Fé da IPB. Seminário Presbiteriano do Sul - extensão Curitiba. TEXTO. Resumo das Três aulas de "Harmonia das Confissões Reformadas". Da obra: HARMONIA DAS CONFISSÕES REFORMADAS. Esse livro publicado pela Edit Cultura Cristã no Brasil em 2006, foi originalmente organizado por Joel R. Beeke e Sinclair B. Ferguson. O contexto histórico destas Confissões de Fé origina do período em que as igrejas reformadas desenvolveram Sete Confissões, as quais foram comparadas por nossos autores a fim de que seu conteúdo fosse apresentado em sua singularidade e harmonia para conhecimento dos estudantes e fiéis. "As igrejas reformadas dos séculos 16 e 17 produziram várias coleções de confissões reformadas ortodoxas que diferenciavam a fé reformada tanto do Catolicismo Romano como de outros grupos de igrejas protestantes." As Confissões de Fé Cristãs Reformadas limitam o seu texto ao conteúdo das Escrituras, enquanto buscam fundamentar e esclarecer a interpretação bíblica estabelecida por essa vertente cristã oriunda do século 16, a partir da Reforma Protestante. Neste grupo de confissões reformadas que serão base da comparação de harmonia desenvolvida pelo livro base desse texto e aula, temos: as confissões da "família suiça", que são a Primeira Confissão Helvética (1536), a Segunda Confissão Helvética (1566), e a Fórmula de Consenso Helvética (1675). A "família anglo-escocesa", que contém a Confissão da Escócia (1560), com os Trinta e Nove Artigos (1563), a Confissão de Fé de Westminster (1646-47) e os Catecismos Maior e Breve de 1647. E ainda, a denominada "família germânico-holandesa", que apresenta três formas: a Confissão de Fé Belga (1561), o Catecismo de Heidelberg (1563) e os Cânones de Dort (1618-19). Sendo que, "as sete mais adotadas pelas várias denominações reformadas... são as Três Formas de Unidade, a Segunda Confissão Helvética e a Confissão e os Catecismos de Westminster." O propósito dos organizadores da comparação e apresentação da visão singular destas Confissões, é de que "esta harmonia permitirá fácil acesso ao conteúdo das grandes confissões reformadas e também ajudará os cristãos holandeses reformados, os húngaros reformados, os ingleses presbiterianos e outros cristãos reformados a apreciar mais profundamente as confissões desses diversos grupos (...) A beleza deste livro é que ele ressalta a harmonia entre as confissões reformadas, a despeito da diversidade de suas inúmeras tradições históricas." (todas as citações anteriores são do autor, Joel R. Beeke). INTRODUÇÃO HISTÓRICA ÀS CONFISSÕES DE FÉ REFORMADAS. A CONFISSÃO BELGA tem seu nome dado a partir dos países baixos, atualmente denominados Holanda e Bélgica, sendo que seu autor foi o Pastor Reformado Guido de Brès. "Durante o século 16, as igrejas reformadas na Holanda sofreram forte perseguição sob o comando de Filipe II da Espanha, partidário da Igreja Católica Romana. Em 1561, de Brès preparou esta confissão em francês como uma defesa para os crentes reformados perseguidos nos Países Baixos que formaram as assim chamadas "igrejas sob a cruz". (...) A confissão foi moldada a partir da Confissão Gaulesa, uma confissão reformada francesa de 1559 que, por sua vez, se baseava no modelo de Calvino... a Confissão Belga segue o que se tornou a ordem doutrinária tradicional da teologia sistemática reformada: as doutrinas a respeito de Deus (teologia, artigos 1-11), do homem (antropologia, 12-15), de Cristo (cristologia, artigos 16-21), da salvação (soteriologia, artigos 22-26), da igreja (eclesiologia, artigos 27-35) e dos últimos acontecimentos (escatologia, artigo 37)." O professor de teologia Zacarias Ursino desenvolveu o CATECISMO DE HEIDELBERG sob orientação do princípe Frederico III, no interesse de preparar um conteúdo "reformado com o objetivo de instruir os jovens e orientar pastores e professores", sendo considerado um "catecismo de beleza e impacto incomuns, uma reconhecida obra-prima", o qual acabou aprovado pelo Sínodo de Heidelberg no ano de 1563, tendo recebido outras três edições alemãs, além de ter sido traduzido ao holândes. "As 129 perguntas e respostas do Catecismo de Heidelberg estão divididas em três partes, padronizadas de acordo com a Epístola aos Romanos... as perguntas 3-11 se referem à experiência do pecado e à miséria (Rm 1-3, 20); as perguntas 12-85 se referem à redenção em Cristo e à fé (Rm 3.21-11.36), juntamente com uma longa exposição do Credo dos Apóstolos e dos sacramentos: as perguntas 86-129 abordam a verdadeira gratidão pelo livramento dado por Deus (Rm 12-16), basicamente por meio de um estudo dos Dez Mandamentos e da Oração Dominical... seu conteúdo é mais subjetivo que objetivo, mais espiritual que dogmático... (tendo) sido chamado "o livro de conforto" para os cristãos." "A SEGUNDA CONFISSÃO HELVÉTICA é de importância muito maior (que a primeira)", tendo surgido de um testemunho pessoal escrito por Heinrich Bullinger no ano de 1562. A cidade de Zurique estava acometida de grande peste, e Bullinger dedicou-se a revisar o documento diante da morte próxima, que não ocorreu naquela situação, sendo a ocasião em que Frederico III solicitou uma confissão reformada, vindo a receber do líder protestante uma cópia da confissão, a qual Frederico utilizou como defesa na Dieta Imperial de 1566, devido a críticas de Lutero em alguns posicionamentos do príncipe. "Depois de algumas revisões, numa conferência em Zurique no mesmo ano, a confissão foi aceita por Berna, Biel, Genebra, os Grisons, Muhlhausen, Schaffhaunsen e St. Gall. Depois, foi amplamente aprovada na Escócia, na Hungria, na Polônia e em vários outros lugares." Esta confissão é um "manual compacto da teologia reformada"... tendo como cenário a edição definitiva das Institutas de Calvino (1559) e a Contra-Reforma, reunida em Trento (1545-1563)... tendo como ponto de partida as Escrituras, ela avança pelas ideias da teologia sistemática, abordando questões características da Reforma e de Calvino. CÂNONES DE DORT (1618-1619). "O Sínodo de Dort foi realizado para resolver uma série de controvérsias nas igrejas holandesas, iniciada pelo surgimento do Arminianismo. Jacob Armínio... divergia da fé reformada em vários pontos...". A reunião das igrejas reformadas da Holanda na cidade de Dordrecht entre os anos de 1618 e 1619 recebeu vinte e sete delegados de oito países, que se juntaram aos sessenta e dois representantes da Holanda. Armínio viveu até 1609, e em 1610 alguns de seus defensores apresentaram suas postulações na assembleia da Holanda; ensinando uma eleição embasada na fé posterior dos homens que seria base para a decisão anterior de Deus sobre eles, um caráter universal da salvação em Cristo, a condição do livre arbítrio numa visão de depravação parcial da humanidade, a condição do homem resistir diante da graça, e ainda, a possibilidade de ocorrer uma queda do estado de graça. "Eles solicitaram a revisão dos padrões doutrinários das igrejas reformadas e a proteção do governo aos pontos de vista arminianos." As discussões acerca da controvérsia entre arminianismo e calvinismo estavam conduzindo a Holanda para um conflito civil de grandes proporções, até que a assembleia deliberou para que um Sínodo discutisse a questão. "O Sínodo, então, desenvolveu os cânones, que rejeitaram totalmente o Protesto de 1610 e estabeleceram a doutrina reformada segundo os pontos debatidos com base nas Escrituras. Esses pontos, conhecidos como os Cinco Pontos do Calvinismo são: eleição incondicional, redenção limitada, depravação total, graça irresistível e a perseverança dos santos (...) Observe que o contexto doutrinário do surgimento dos Cânones de Dort tornam esse documento uma declaração de fé única em seu conteúdo e características, pois surgiu como conclusão de um julgamento e abordou somente os temas doutrinais em discussão referente ao pensamento de Armínio e de Calvino. DOUTRINA REFORMADA EM COMPARAÇÃO - Harmonia das Confissões de Fé Reformadas: (exemplo do conteúdo das Confissões de Fé). Tema: A SANTA TRINDADE. 1. Confissão Belga: "Deus é um em essência, porém distinguido em três pessoas. De acordo com essa verdade, e com essa Palavra de Deus, nós acreditamos num só Deus, que é de uma só essência, na qual há três pessoas, realmente, verdadeiramente e eternamente distintas, conforme suas propriedades incomunicáveis, ou seja, o Pai, o Filho e o Espírito Santo. 2. Catecismo de Heidelberg: P. 25: Por que você fala do Pai, do Filho e do Espírito Santo se há apenas uma divina essência... R: Porque Deus se revelou desse modo na sua Palavra, que essas três pessoas distintas são o único, verdadeiro e eterno Deus. 3. Segunda Confissão Helvética: "Cremos e ensinamos que o mesmo Deus infinito, uno e indiviso é um ser inseparavelmente e sem confusão, distinto em pessoas - Pai, Filho e Espírito Santo - e, assim como o Pai gerou o Filho desde a eternidade, o Filho foi gerado de modo indescritível, e o Espírito Santo verdadeiramente procede de um e de outro, desde a eternidade e, assim, deve ser adorado como ambos (...) Enfim, aceitamos o Credo dos Apóstolos, porque ele nos comunica a verdadeira fé." 4. Confissão de Fé de Westminster: "Na unidade da Divindade há três pessoas de uma mesma substância, poder e eternidade: Deus o Pai, Deus o Filho e Deus o Espírito Santo. O Pai não é de ninguém - não é gerado, nem procedente; o Filho é eternamente gerado do Pai; o Espírito Santo é eternamente procedente do Pai e do Filho." 5. Breve Catecismo de Westminster: "Há três pessoas na Divindade: o Pai, o Filho e o Espírito Santo, e estas três são um Deus, da mesma substância, iguais em poder e glória." 6. Catecismo Maior de Westminster: "Na Divindade há três pessoas: o Pai, o Filho e o Espírito Santo; essas três pessoas são um só Deus verdadeiro e eterno, da mesma substância, iguais em poder e glória, embora distintas pelas suas propriedades pessoais." TEXTO 2. HARMONIA DAS CONFISSÕES DE FÉ REFORMADAS. Após breve contexto histórico e apresentação das Confissões de Fé Reformadas principais no texto anterior, iremos citar breve introdução à Confissão de Fé de Westminster, para então, seguir com uma comparação em exemplos de conteúdos da harmonia das confissões de fé. CONFISSÃO DE FÉ DE WESTMINSTER. "A confissão de fé produzida pelos teólogos de Westminster foi, sem dúvida alguma, um dos documentos mais influentes do período pós-Reforma da Igreja Cristã. (...) Sob a presidência do Dr. William Twisse, em oposição aos desejos expressos do rei, o objetivo inicial dessa reunião era promover uma maior uniformidade de fé e prática em todo o reino. A tarefa inicial dos delegados era revisar os 39 artigos da Igreja da Inglaterra, mas depois da assinatura da Solene Liga e Aliança essa tarefa se estendeu para algo mais específico e preciso, como elaborar fórmulas teológicas e eclesiásticas que levassem a Igreja da Inglaterra a se enquadrar dentro da doutrina e prática da Igreja Presbiteriana da Escócia. (...) A Confissão de Fé de Westminster representa o ponto alto no desenvolvimento da teologia, e sua dinâmica espiritual está fortemente ligada ao pacto da Aliança. Dividida em 33 capítulos, abrange todo o conjunto da doutrina cristã, começando com as Escrituras como fonte de conhecimento das coisas divinas (de acordo com a Primeira e a Segunda Confissão Helvética, a Fórmula de Concórdia e os Artigos Irlandeses). Prossegue com uma exposição sobre Deus e seus decretos, a criação, a providência e a queda (II-VI) antes de passar a explicar o pacto da graça, a obra de Cristo e finalmente a aplicação da redenção (X-XVIII)... (se fez) cada vez mais conhecida como a primeira confissão na história do Cristianismo que tem um capítulo especialmente dedicado à adoção (XII) - que talvez seja a doutrina menos escolástica de todas. Em inúmeros capítulos, é dada atenção especial à lei e à liberdade, assim como à doutrina da igreja, dos sacramentos (XXV-XXIX) e das últimas coisas (XXXII-XXXIII). Embora a confissão tenha sido elaborada por mentes teológicas disciplinadas, ela também revela a influência de homens com profunda experiência de pregação e vida pastoral. É uma expressão notável da teologia clássica reformada formulada para as necessidades do povo de Deus." (Beeke e Ferguson, 2006, p 13-14). HARMONIA DAS CONFISSÕES DE FÉ REFORMADAS. Teologia: A DOUTRINA DE DEUS. A revelação. 1. Confissão Belga. Como conhecemos a Deus. "Nós o conhecemos por dois meios. Primeiro, pela criação, pela manutenção e pelo governo do universo, o qual está perante os nossos olhos como um livro formoso, em que todas as criaturas, grandes e pequenas, são como letras que nos levam a contemplar os atributos invisíveis de Deus, ou seja, o seu eterno poder, como também a sua própria divindade, como diz o apóstolo Paulo (Rm 1.20)... Em segundo lugar, Deus se dá a conhecer de modo ainda mais claro e pleno por meio de sua sagrada e divina Palavra, ou seja, tanto quanto nos é necessário saber nesta vida, para a sua glória e para a nossa salvação." (Sl 19.2; Ef 4.6; Sl 19.8; 1Co '12.6). 2. Catecismo de Heidelberg. Qual é a primeira petição? "Santificado seja o teu nome", ou seja, que, em primeiro lugar, nos seja concedido que o conheçamos em verdade e o santifiquemos, glorifiquemos e o louvemos em todas as suas obras, nas quais o seu poder, sua sabedoria, a sua bondade, a sua justiça, a sua misericórdia e a sua verdade estão claramente demonstrados." (Mt 6.9; Jo 17.3; Jr 9.23; Mt 16.17; Tg 1.5; Sl 119.137-138; Lc 1.46; Sl 145.8-9). 3. Cânones de Dort. Artigo 6. "O que, portanto, nem a luz natural nem a lei podem fazer, Deus o faz pelo poder do Espírito Santo por meio da Palavra ou do ministério da reconciliação, que é o evangelho do messias, por meio do qual Deus se agradou em salvar os crentes, tanto sob o Antigo como sob o Novo Testamento." Artigo 7. "No Antigo Testamento, Deus revelou a poucas pessoas esse mistério da sua vontade; no Novo Testamento (no qual a distinção entre os povos foi eliminada), ele se revelou a um número muito maior de pessoas, sem qualquer distinção... A causa dessa dispensação... resulta totalmente da soberana boa vontade e do amor imerecido de Deus...". 4. Confissão de Fé de Westminster. Das Santas Escrituras. 1. Embora a luz da natureza e as obras da criação e da providência manifestem de tal modo a bondade, a sabedoria e o poder de Deus, de modo a deixar os homens inescusáveis, contudo elas não são suficientes para dar aquele conhecimento de Deus e da sua vontade que é necessário à salvação. Portanto, aprouve ao Senhor, em diversos tempos e de diferentes modos, revelar-se e declarar à sua igreja a sua vontade, e depois... foi igualmente servido fazê-la escrever toda, o que torna as Escrituras Sagradas indispensáveis, uma vez que cessaram os antigos modos de Deus revelar sua vontade ao seu povo." (Rm 2.14-15; 1.19-20; Sl 19.1-3; Rm 1.32; 2.1; 1Co 1.21; 2.13-14; Hb 1.1; Pv 22.19-21; Lc 1.3-4; Rm 15.4; Mt 4.4-7, 10; Is 8.19-20; 2Tm 3.15; 2Pe 1.19; Hb 1.1-2). 5. Catecismo Maior de Westminster. P.2: De onde se infere que há um Deus? R: A própria luz da natureza no espírito do homem, bem como as obras de Deus, claramente manifestam que existe um Deus; porém, só a sua Palavra e o seu Espírito o revelam de um modo suficiente e eficaz aos homens, para a salvação deles." (Rm 1.19-20; Sl 19.1-3; At 17.28; 1 Co 2.9-10; 2Tm 3.15-17; Is 59.21). HARMONIA DAS CONFISSÕES DE FÉ REFORMADAS. Teologia: A Doutrina de Deus. Os decretos de Deus e a predestinação. 1. Confissão Belga (1561). Artigo 16. A eleição eterna. "Cremos que, quando o pecado do primeiro homem (Adão) o lançou com toda a sua descendência na perdição, Deus se mostrou como ele é, a saber: misericordioso e justo. Misericordioso, porque ele livra e salva da perdição àqueles que ele, em seu eterno e imútavel conselho, somente pela bondade, elegeu em Jesus Cristo nosso Senhor, sem levar em consideração obra alguma deles. Justo, porque ele deixa os demais na queda e na perdição em que eles mesmos se lançaram. (Rm 9.18,22-23; 3.12; Rm 9.15-16; 11.32; Ef 2.8-10; Sl 100.3. 1Jo 4.10; Dt 32.8; 1Sm 12.22; Sl 115.5; Ml 1.2; 2Tm 1.9; Rm 8.29; 9.11,21; 11.5-6; Ef 1.4; Tt 3.4-5; At 2.47; 13.48; 2 Tm 2.19-20; 1Pe 1.2; Jo 6.27; 15.16; 17.9; Rm 9.17-18; 2Tm 2.20). 2. Catecismo de Heidelberg (1563). P. 54: O que você crê a respeito da "santa igreja católica" de Cristo? R: Creio que o Filho de Deus, desde o início e até o fim do mundo, reúne, defende e preserva para si mesmo, pelo seu Espírito e por sua Palavra, dentre toda a raça humana, uma igreja escolhida para a vida eterna, composta de pessoas que concordam quanto à verdadeira fé, e que eu sou, serei para sempre, um membro vivo dessa igreja." (Jo 10.11; Gn 26.4; Rm 9.24; Ef 1.10; Jo 10.16; Is 59.21; Dt 10.14-15; At 13.48; 1Co 1.8-9; Rm 8.35). 3 Segunda Confissão Helvética. (1566). X. Da predestinação de Deus e da eleição dos santos. "Deus, desde o princípio, livremente e movido apenas pela sua graça, sem qualquer acepção de pessoas, predestinou ou elegeu os santos que ele quer salvar em Cristo, segundo a palavra do apóstolo: "Ele nos escolheu nele, antes da fundação do mundo (Ef 1.4); e mais adiante: "nos salvou e nos chamou com santa vocação; não segundo as nossas obras, mas conforme a sua própria determinação e graça que nos foi dada em Cristo Jesus antes dos tempos eternos, e manifestada, agora, pelo aparecimento de nosso Salvador Cristo Jesus (2Tm 1.9-10). (...) "E, quando perguntaram ao Senhor se eram poucos os que seriam salvos, ele não respondeu se poucou ou muitos seriam salvos ou condenados, mas antes exortou cada homem a "esforçar-se por entrar pela porta estreita" (Lc 13.24). É como se ele quisesse dizer: "Não vos compete inquirir precipitamente acerca dessas questões, mas antes esforçar-vos para entrar no céu pelo caminho estreiro". 4. Cânones de Dort. (1619). Artigo 6. "Nesta vida, Deus concede a fé a alguns enquanto não a concede a outros; isso procede do eterno decreto de Deus, pois as escrituras dizem que ele "Faz estas coisas conhecidas desde séculos" (At 15.18) e que "Faz todas as coisas conforme o conselho da sua vontade" (Ef 1.11). De acordo com esse decreto, ele graciosamente quebranta o coração dos eleitos, por duro que seja, e os inclina a crer, enquanto, entretanto, segundo o seu justo juízo, ele deixa os não-eleitos em sua própria iniquidade e obstinação. E aqui especialmente nos é manifesta a profunda, misericordiosa e ao mesmo tempo justa distinção entre homens que estão sob a mesma condição de perdição; ou que o decreto da eleição e reprovação revelado na Palavra de Deus; ainda que seja deturpado por homens perversos, impuros e instáveis, para sua própria perdição, fornece um inexprimível conforto para as pessoas santas e tementes a Deus." 5. Confissão de Fé de Westminster. (1647). III. Dos eternos decretos de Deus. I. "Desde toda a eternidade e pelo mui sábio e santo conselho da sua própria vontade, Deus ordenou livre e inalteravelmente tudo quanto acontece, porém de modo que nem Deus é o autor do pecado, nem violentada é a vontade da criatura, nem é tirada a liberdade ou a contingência das causas secundárias, mas antes estabelecidas." (Ef 1.11; Rm 11.33; Hb 6.17; Rm 9.15-18; Tg 1.13,17; 1Jo 1.5; At 2.23; Mt 17;12; At 4.27-28; Jo 19.11; Pv 16.33). (...) 3. Pelo decreto de Deus e para a manifestação da sua glória, alguns homens e alguns anjos são predestinados para a vida eterna, enquanto outros são preordenados para a morte eterna." (1 Tm 5.21; Mt 25.41; Rm 9.22-23; Ef 1.5-6; Pv 16.4). 6. Breve Catecismo de Westminster. (1647). "P 7: O que são os decretos de Deus? Os decretos de Deus são o seu eterno propósito, segundo o conselho da sua vontade, pelo qual, para a sua própria glória, ele predestinou tudo o que acontece. P 8: Como Deus executa os seus decretos? Deus executa os seus decretos nas obras da criação e da providência." 7. Catecismo Maior de Westminster (1648). "P 12. O que são os decretos de Deus? Os decretos de Deus são os atos sábios, livres e santos do conselho de sua vontade, pelos quais, desde toda a eternidade, ele, para a sua própria glória, imutavelmente predestinou tudo o que acontece, especialmente com referência aos anjos e aos homens. (Ef 1.11; Rm 11.33; 9.14-15,18; Ef 1.4,11; Rm 9.22-23; Sl 33.11). P 13. O que Deus decretou especialmente com referência aos anjos e aos homens? R: Deus, por um decreto eterno e imutável, unicamente do seu amor e para patentear a sua gloriosa graça, que tinha de ser manifestada no tempo devido, elegeu alguns anjos para a glória e, em Cristo, escolheu alguns homens para a vida eterna e os meios para consegui-la; e também, segundo o seu soberano poder e o conselho inescrutável da sua própria vontade (pela qual ele concede, ou não, os seus favores conforme lhe apraz), deixou e predestinou os demais à desonra e à ira, que lhes serão infligidas por causa dos seus pecados, para patentear a glória da sua justiça. (1 Tm 5.21; Ef 1.4-6; 2Ts 2.13-14; Rm 9.17-18, 21-22; Mt 11.25-26; 2Tm 2.20; Jd 4; 1Pe 2.8). P 14: Como Deus executa os seus decretos? R: Deus executa os seus decretos nas obras da criação e da providência, de acordo com a sua presciência infalível e o livre e imutável conselho da sua vontade." (Ef 1.11). TEXTO 3. HARMONIA DAS CONFISSÕES REFORMADAS. DOUTRINA REFORMADA EM COMPARAÇÃO. Três temas em análise. Tema: A SANTA TRINDADE. 1. Confissão Belga: "Deus é um em essência, porém distinguido em três pessoas. De acordo com essa verdade, e com essa Palavra de Deus, nós acreditamos num só Deus, que é de uma só essência, na qual há três pessoas, realmente, verdadeiramente e eternamente distintas, conforme suas propriedades incomunicáveis, ou seja, o Pai, o Filho e o Espírito Santo. 2. Catecismo de Heidelberg: P. 25: Por que você fala do Pai, do Filho e do Espírito Santo se há apenas uma divina essência... R: Porque Deus se revelou desse modo na sua Palavra, que essas três pessoas distintas são o único, verdadeiro e eterno Deus. 3. Segunda Confissão Helvética: "Cremos e ensinamos que o mesmo Deus infinito, uno e indiviso é um ser inseparavelmente e sem confusão, distinto em pessoas - Pai, Filho e Espírito Santo - e, assim como o Pai gerou o Filho desde a eternidade, o Filho foi gerado de modo indescritível, e o Espírito Santo verdadeiramente procede de um e de outro, desde a eternidade e, assim, deve ser adorado como ambos (...) Enfim, aceitamos o Credo dos Apóstolos, porque ele nos comunica a verdadeira fé." 4. Confissão de Fé de Westminster: "Na unidade da Divindade há três pessoas de uma mesma substância, poder e eternidade: Deus o Pai, Deus o Filho e Deus o Espírito Santo. O Pai não é de ninguém - não é gerado, nem procedente; o Filho é eternamente gerado do Pai; o Espírito Santo é eternamente procedente do Pai e do Filho." 5. Breve Catecismo de Westminster: "Há três pessoas na Divindade: o Pai, o Filho e o Espírito Santo, e estas três são um Deus, da mesma substância, iguais em poder e glória." 6. Catecismo Maior de Westminster: "Na Divindade há três pessoas: o Pai, o Filho e o Espírito Santo; essas três pessoas são um só Deus verdadeiro e eterno, da mesma substância, iguais em poder e glória, embora distintas pelas suas propriedades pessoais. Tema. Teologia: A DOUTRINA DE DEUS. A REVELAÇÃO. 1. Confissão Belga. Como conhecemos a Deus. "Nós o conhecemos por dois meios. Primeiro, pela criação, pela manutenção e pelo governo do universo, o qual está perante os nossos olhos como um livro formoso, em que todas as criaturas, grandes e pequenas, são como letras que nos levam a contemplar os atributos invisíveis de Deus, ou seja, o seu eterno poder, como também a sua própria divindade, como diz o apóstolo Paulo (Rm 1.20)... Em segundo lugar, Deus se dá a conhecer de modo ainda mais claro e pleno por meio de sua sagrada e divina Palavra, ou seja, tanto quanto nos é necessário saber nesta vida, para a sua glória e para a nossa salvação." (Sl 19.2; Ef 4.6; Sl 19.8; 1Co '12.6). 2. Catecismo de Heidelberg. Qual é a primeira petição? "Santificado seja o teu nome", ou seja, que, em primeiro lugar, nos seja concedido que o conheçamos em verdade e o santifiquemos, glorifiquemos e o louvemos em todas as suas obras, nas quais o seu poder, sua sabedoria, a sua bondade, a sua justiça, a sua misericórdia e a sua verdade estão claramente demonstrados." (Mt 6.9; Jo 17.3; Jr 9.23; Mt 16.17; Tg 1.5; Sl 119.137-138; Lc 1.46; Sl 145.8-9). 3. Cânones de Dort. Artigo 6. "O que, portanto, nem a luz natural nem a lei podem fazer, Deus o faz pelo poder do Espírito Santo por meio da Palavra ou do ministério da reconciliação, que é o evangelho do messias, por meio do qual Deus se agradou em salvar os crentes, tanto sob o Antigo como sob o Novo Testamento." Artigo 7. "No Antigo Testamento, Deus revelou a poucas pessoas esse mistério da sua vontade; no Novo Testamento (no qual a distinção entre os povos foi eliminada), ele se revelou a um número muito maior de pessoas, sem qualquer distinção... A causa dessa dispensação... resulta totalmente da soberana boa vontade e do amor imerecido de Deus...". 4. Confissão de Fé de Westminster. Das Santas Escrituras. 1. Embora a luz da natureza e as obras da criação e da providência manifestem de tal modo a bondade, a sabedoria e o poder de Deus, de modo a deixar os homens inescusáveis, contudo elas não são suficientes para dar aquele conhecimento de Deus e da sua vontade que é necessário à salvação. Portanto, aprouve ao Senhor, em diversos tempos e de diferentes modos, revelar-se e declarar à sua igreja a sua vontade, e depois... foi igualmente servido fazê-la escrever toda, o que torna as Escrituras Sagradas indispensáveis, uma vez que cessaram os antigos modos de Deus revelar sua vontade ao seu povo." (Rm 2.14-15; 1.19-20; Sl 19.1-3; Rm 1.32; 2.1; 1Co 1.21; 2.13-14; Hb 1.1; Pv 22.19-21; Lc 1.3-4; Rm 15.4; Mt 4.4-7, 10; Is 8.19-20; 2Tm 3.15; 2Pe 1.19; Hb 1.1-2). 5. Catecismo Maior de Westminster. P.2: De onde se infere que há um Deus? R: A própria luz da natureza no espírito do homem, bem como as obras de Deus, claramente manifestam que existe um Deus; porém, só a sua Palavra e o seu Espírito o revelam de um modo suficiente e eficaz aos homens, para a salvação deles." (Rm 1.19-20; Sl 19.1-3; At 17.28; 1 Co 2.9-10; 2Tm 3.15-17; Is 59. Tema Teologia: A DOUTRINA DE DEUS. OS DECRETOS DE DEUS E A PREDESTINAÇÃO. 1. Confissão Belga (1561). Artigo 16. A eleição eterna. "Cremos que, quando o pecado do primeiro homem (Adão) o lançou com toda a sua descendência na perdição, Deus se mostrou como ele é, a saber: misericordioso e justo. Misericordioso, porque ele livra e salva da perdição àqueles que ele, em seu eterno e imútavel conselho, somente pela bondade, elegeu em Jesus Cristo nosso Senhor, sem levar em consideração obra alguma deles. Justo, porque ele deixa os demais na queda e na perdição em que eles mesmos se lançaram. (Rm 9.18,22-23; 3.12; Rm 9.15-16; 11.32; Ef 2.8-10; Sl 100.3. 1Jo 4.10; Dt 32.8; 1Sm 12.22; Sl 115.5; Ml 1.2; 2Tm 1.9; Rm 8.29; 9.11,21; 11.5-6; Ef 1.4; Tt 3.4-5; At 2.47; 13.48; 2 Tm 2.19-20; 1Pe 1.2; Jo 6.27; 15.16; 17.9; Rm 9.17-18; 2Tm 2.20). 2. Catecismo de Heidelberg (1563). P. 54: O que você crê a respeito da "santa igreja católica" de Cristo? R: Creio que o Filho de Deus, desde o início e até o fim do mundo, reúne, defende e preserva para si mesmo, pelo seu Espírito e por sua Palavra, dentre toda a raça humana, uma igreja escolhida para a vida eterna, composta de pessoas que concordam quanto à verdadeira fé, e que eu sou, serei para sempre, um membro vivo dessa igreja." (Jo 10.11; Gn 26.4; Rm 9.24; Ef 1.10; Jo 10.16; Is 59.21; Dt 10.14-15; At 13.48; 1Co 1.8-9; Rm 8.35). 3 Segunda Confissão Helvética. (1566). X. Da predestinação de Deus e da eleição dos santos. "Deus, desde o princípio, livremente e movido apenas pela sua graça, sem qualquer acepção de pessoas, predestinou ou elegeu os santos que ele quer salvar em Cristo, segundo a palavra do apóstolo: "Ele nos escolheu nele, antes da fundação do mundo (Ef 1.4); e mais adiante: "nos salvou e nos chamou com santa vocação; não segundo as nossas obras, mas conforme a sua própria determinação e graça que nos foi dada em Cristo Jesus antes dos tempos eternos, e manifestada, agora, pelo aparecimento de nosso Salvador Cristo Jesus (2Tm 1.9-10). (...) "E, quando perguntaram ao Senhor se eram poucos os que seriam salvos, ele não respondeu se poucou ou muitos seriam salvos ou condenados, mas antes exortou cada homem a "esforçar-se por entrar pela porta estreita" (Lc 13.24). É como se ele quisesse dizer: "Não vos compete inquirir precipitamente acerca dessas questões, mas antes esforçar-vos para entrar no céu pelo caminho estreiro". 4. Cânones de Dort. (1619). Artigo 6. "Nesta vida, Deus concede a fé a alguns enquanto não a concede a outros; isso procede do eterno decreto de Deus, pois as escrituras dizem que ele "Faz estas coisas conhecidas desde séculos" (At 15.18) e que "Faz todas as coisas conforme o conselho da sua vontade" (Ef 1.11). De acordo com esse decreto, ele graciosamente quebranta o coração dos eleitos, por duro que seja, e os inclina a crer, enquanto, entretanto, segundo o seu justo juízo, ele deixa os não-eleitos em sua própria iniquidade e obstinação. E aqui especialmente nos é manifesta a profunda, misericordiosa e ao mesmo tempo justa distinção entre homens que estão sob a mesma condição de perdição; ou que o decreto da eleição e reprovação revelado na Palavra de Deus; ainda que seja deturpado por homens perversos, impuros e instáveis, para sua própria perdição, fornece um inexprimível conforto para as pessoas santas e tementes a Deus." 5. Confissão de Fé de Westminster. (1647). III. Dos eternos decretos de Deus. I. "Desde toda a eternidade e pelo mui sábio e santo conselho da sua própria vontade, Deus ordenou livre e inalteravelmente tudo quanto acontece, porém de modo que nem Deus é o autor do pecado, nem violentada é a vontade da criatura, nem é tirada a liberdade ou a contingência das causas secundárias, mas antes estabelecidas." (Ef 1.11; Rm 11.33; Hb 6.17; Rm 9.15-18; Tg 1.13,17; 1Jo 1.5; At 2.23; Mt 17;12; At 4.27-28; Jo 19.11; Pv 16.33). (...) 3. Pelo decreto de Deus e para a manifestação da sua glória, alguns homens e alguns anjos são predestinados para a vida eterna, enquanto outros são preordenados para a morte eterna." (1 Tm 5.21; Mt 25.41; Rm 9.22-23; Ef 1.5-6; Pv 16.4). 6. Breve Catecismo de Westminster. (1647). "P 7: O que são os decretos de Deus? Os decretos de Deus são o seu eterno propósito, segundo o conselho da sua vontade, pelo qual, para a sua própria glória, ele predestinou tudo o que acontece. P 8: Como Deus executa os seus decretos? Deus executa os seus decretos nas obras da criação e da providência." 7. Catecismo Maior de Westminster (1648). "P 12. O que são os decretos de Deus? Os decretos de Deus são os atos sábios, livres e santos do conselho de sua vontade, pelos quais, desde toda a eternidade, ele, para a sua própria glória, imutavelmente predestinou tudo o que acontece, especialmente com referência aos anjos e aos homens. (Ef 1.11; Rm 11.33; 9.14-15,18; Ef 1.4,11; Rm 9.22-23; Sl 33.11). P 13. O que Deus decretou especialmente com referência aos anjos e aos homens? R: Deus, por um decreto eterno e imutável, unicamente do seu amor e para patentear a sua gloriosa graça, que tinha de ser manifestada no tempo devido, elegeu alguns anjos para a glória e, em Cristo, escolheu alguns homens para a vida eterna e os meios para consegui-la; e também, segundo o seu soberano poder e o conselho inescrutável da sua própria vontade (pela qual ele concede, ou não, os seus favores conforme lhe apraz), deixou e predestinou os demais à desonra e à ira, que lhes serão infligidas por causa dos seus pecados, para patentear a glória da sua justiça. REFERÊNCIA: Beeke, Joel R e Ferguson, Sinclair B. Harmonia das confissões de Fé Reformadas. Edit Cultura Cristã, São Paulo, SP, 2006 (páginas 9 a 12, 20-21). Autor: Ivan S Ruppell Jr é Professor em Ciências da Religião e Teologia.

quarta-feira, 3 de maio de 2023

COSMOVISÃO Reformada. RESUMO de Conteúdo. Parte 1.

Disciplina Cosmovisão Reformada. Seminário Presbiteriano do Sul - extensão Curitiba. Temas e aspectos principais. Resumo. Parte 1. O QUE É COSMOVISÃO? DEFINIÇÕES E CONCEITOS: "A palavra cosmovisão é tradução do termo alemão Weltanschauung (visão de mundo) e foi usada pela primeira vez pelo filósofo iluminista Immanuel Kant em sua obra Crítica da faculdade do juízo (1790)." (Goheen e Bartholomew, p 35, 2016). Segundo o dicionarioinformal.com.br: "É o modo pelo qual a pessoa vê ou interpreta a realidade. A palavra alemã é weltanschau-ung, que significa um mundo e uma visão da vida, ou um paradigma. É a estrutura por meio da qual a pessoa entende os dados da vida. Uma cosmovisão influencia muito a maneira em que a pessoa vê Deus, origens, mal, natureza humana, valores e destino." Conforme a ACSI, do escritor cristão Mauro Meister: "Uma cosmovisão é um compromisso, uma orientação fundamental do coração, que pode ser expresso como uma narrativa ou como um conjunto de pressuposições (suposições que podem ser verdadeiras, parcialmente verdadeiras ou inteiramente falsas) que nós sustentamos (consciente ou subconscientemente, consistente ou inconsistentemente) sobre a constituição básica da realidade, e que provê o fundamento sobre o qual nós vivemos, nos movemos e existimos." FUNÇÕES DA COSMOVISÃO CRISTÃ E SECULAR. Para o filósofo W. P. Alston, a importância das cosmovisões se expressa na seguinte reflexão: "Pode-se argumentar com base em fatos relativos à natureza do homem e às condições da vida humana, que os seres humanos tem uma profunda necessidade de formar algum quadro geral do universo total em que vivem, a fim de poderem, de uma forma que lhes seja significativa, relacionar suas próprias atividades fragmentadas com o universo como um todo; e que uma vida em que isso não é realizado é uma vida empobrecida no aspecto mais significativo." (Nash, p 25 e 27, 2012). Principais Elementos de Uma Cosmovisão: "Uma cosmovisão equilibrada inclui crenças em pelo menos cinco áreas principais: Deus, realidade, conhecimento, moralidade e humanidade." Deus. Esse entendimento é o mais importante para qualquer cosmovisão, pois indaga da existência e personalidade de Deus, de sua natureza e sentimentos, de seu poder e atuação na história. HISTÓRIA DO ESTUDO DAS COSMOVISÕES. Primeiras ideias de cosmovisão, avaliações históricas na área de Cosmovisão e representantes da Cosmovisão Calvinista. TEXTO. Kant entendia que os seres humanos se servem somente do uso da razão para definir "uma compreensão do significado do mundo e de nosso lugar dentro dele", sendo que a sua defesa da autonomia da razão do homem em superioridade ao pensamento religioso e das tradições no momento de perceber e definir a "visão de mundo" seria um princípio bastante utilizado por seus seguidores, como os filósofos alemães do idealismo e romantismo no século 19, que colocaram essa perspectiva no centro de seus sistemas de pensamento: "No final do século 19, o termo já havia alcançado "prestígio de celebridade acadêmica". Para Friedrich Schelling (filósofo idealista), a "visão de mundo" tratava do "respeito ao anseio da humanidade de chegar a um acordo sobre as questões mais profundas da existência e da natureza do universo", num pensamento que propunha uma "compreensão abrangente e coesa do mundo", sendo que os pensadores idealistas e românticos posteriores iriam utilizar o termo "para denotar um conjunto de crenças que estão subjacentes e moldam todo o pensamento e ação humanos." (Goheen e Bart., p 36, 2016). Wilhelm Diltney destacou os aspectos da abrangência e coesão relacionados ao tema da "cosmovisão", no sentido de que "seu objetivo é expressar o significado mais profundo do mundo, responder às questões fundamentais da vida." H. A. Rodges desenvolve um resumo sobre o tema da "cosmovisão" a partir do pensamento de Dilthey: "um complexo de ideias e sentimentos, abrangendo (a) crenças e convicções sobre a natureza da vida e do mundo, (b) hábitos e tendências emocionais baseados naquelas crenças e convicções e (c) um sistema de propósitos, preferências e princípios que governam a ação e dão unidade e sentido à vida". (p 38-39, 2016). Segundo Carlos Souza, o "termo cosmovisão" surgiu na cultura alemã entre os séculos 18 e 19, em uma reflexão de Kant que buscava destacar a "capacidade humana de intuir o mundo exterior à medida que este é apreendido pelos sentidos", sendo que, posteriormente o termo alcançou entendimento mais amplo, indicando "uma concepção do universo a partir do homem conhecedor moralmente livre." Nesse sentido e debaixo da perspectiva do potencial ilimitado da razão humana, em meio ao ambiente intelectual de Schleiermacher, Feuerbach, Volfgan von Goethe etc, o termo traduzido ao português como cosmovisão se tornara abundante na literatura alemã do século 20, "afirmando-se como um conceito que expressava claramente a aspiração humana na busca da compreensão da natureza do universo." A partir da cultura alemã, a expressão e reflexões correlatas se desenvolveram em toda Europa, em que surgiu um entendimento de que o termo tratava de "uma visão metafísica do mundo, considerando uma concepção de vida." A partir disso, no decorrer do séc 20, " a fertilidade do conceito Weltanschauung o fez tornar-se, em apenas sete décadas, uso obrigatório em todo o universo intelectual da Europa e dos Estados Unidos, passando a significar a concepção ou visão de mundo e da vida, compartilhada por um indivíduo ou grupo social." (Edit Ultimato, p 41-43, 2006). COSMOVISÃO CALVINISTA. Nomes e representantes: Para Abraham Kuyper, "dois sistemas de vida estão em combate mortal. O Modernismo está comprometido em construir um mundo próprio a partir de elementos do homem natural, e a construir o próprio homem a partir de elementos da natureza; enquanto que, por outro lado, todos aqueles que reverentemente humilham-se diante de Cristo e o adoram como o Filho do Deus vivo, e o próprio Deus, estão resolvidos a salvar a "herança cristã". Esta é a luta na Europa, esta é a luta na América, e esta também é a luta por princípios em que meu próprio país está engajado, e na qual eu mesmo tenho gasto todas as minhas energias por quase quarenta anos." (...) Segue citação de Kuyper, sobre o tema: "como o Dr. James Orr (na palestra, Conceito Cristão de Deus e do Mundo, Edinburgo, 1897) observa, o termo técnico alemão Weltanschauung não tem equivalente preciso em inglês. Por isso, ele usou a tradução literal conceito do mundo (cosmovisão), (porém), a frase mais explícita: concepção de vida e de mundo parece ser preferível (embora Kuyper faça o destaque de que utiliza ambas as frases em suas palestras: sistema de vida e concepção de vida e mundo.") (Kuyper, p. 19, 2003). (*Abraham Kuyper nasceu na Holanda em 1837, vindo a ser Ministro da Igreja, Líder do Partido Político de viés protestante, sendo eleito como membro do Parlamento em 1874 e vindo a ser Primeiro Ministro da Holanda de 1901 a 1905, além de atuar como Professor Universitário. Kuyper visitou os EUA em 1898 e proferiu as "Palestras Stone", que são a base do livro "Calvinismo", que estamos citando nesse texto e será utilizado nas aulas). COSMOVISÕES COMPARADAS. A DESCRIATINIZAÇÃO DA SOCIEDADE, Século 19. Conforme destaque de Carlos de Souza, a Europa viu o surgimento ao fim do século 19 de um processo de "profunda descriatinização da sociedade. Todas as dimensões da vida social, como as artes, a ciência, a política, a economia e a filosofia se tornaram predominantemente secularizadas, relegando à fé cristã o papel estreito de veículo inspirador de uma devoção subjetiva, desprovida de engajamento com as realidades manifestas da vida. Isso passou a ser aceito por movimentos inteiros, como o pietismo extremo, o liberalismo e existencialismo teológico." Foi nesse período que o teólogo e educador escocês James Orr levantou a voz, "propondo um retorno do cristianismo e um sistema integral de percepção do mundo, vida e pensamento. (...) Nas palavras de Orr: "A oposição que o cristianismo enfrenta não está confinada a doutrinas especiais ou a pontos supostamente em conflito com as ciências naturais... Mas estende-se à forma total de se conceber o mundo, do lugar do homem nele, da maneira de conceber o sistema total das coisas, naturais e morais, das quais nós somos uma parte. Não temos mais uma oposição de detalhes, mas de princípios. Esta circunstância precisa de uma extensão igual na linha de defesa. É a visão cristã das coisas em geral que é atacada, e é apenas pela exposição e vindicação da visão cristã das coisas como um todo que esse ataque poderá ser detido." (p 48-51, 2006). NOVOS PARADIGMAS, DO RENASCIMENTO AO ILUMINISMO, SÉCULOS 15 A 19. "A denominada “Idade da Razão” acabou realizando uma integração da reflexão científica junto da área da filosofia no século 17, a qual foi liderada pelos filósofos Francis Bacon e Thomas Hobbes, sendo que René Descartes, Blaise Pascal e Gottfried Leibniz a desenvolveram valorando a lógica no objetivo de afirmar que o raciocínio matemático era o método mais confiável para se alcançar o conhecimento da realidade. Ao mesmo tempo, nesse mesmo contexto científico-filosófico, John Locke assumia na Inglaterra a liderança das reflexões do movimento do empirismo, que entendia que o conhecimento somente poderia ser adquirido pelos homens a partir da experiência de seus sentidos. Observe que essa contraposição de ideias entre o racionalismo e o empirismo se desenvolvia mediante uma perspectiva comum de ambos os movimentos, que era a base de suas argumentações: a centralidade do ser humano como o agente responsável por refletir acerca do conhecimento a partir de suas faculdades intelectuais. (...) Segundo Gonzalez, a observação da natureza e as reflexões puramente racionais se integravam na busca e demonstração do que era possível conhecer da realidade, pois a ordem da natureza se ajustava à lógica da razão humana, segundo os princípios do racionalismo. Pois quanto mais a análise de dados externos propiciava uma melhor explicação acerca da natureza, igualmente aumentava a confiança dos intelectuais na expectativa de que somente a razão iria prover o conhecimento mais verdadeiro que se poderia alcançar acerca da realidade da existência. (2011, p 319). Nesse contexto e época, houve um movimento racionalista dentro do Cristianismo, denominado de “deísmo”, que pretendia explicar a religião sem utilizar os limites e as regras das doutrinas dogmáticas da Igreja. Os deístas buscavam esclarecer os princípios universais daquela que viria a ser considerada como uma religião natural e cristã, a qual teria suas bases e princípios oriundos dos instintos interiores dos homens, e não das revelações da bíblia ou de acontecimentos históricos “sagrados”. A religiosidade natural do deísmo apregoava a existência de Deus e a obrigação de adora-lo através de princípios éticos, sendo que haveria tanto uma recompensa para os bons, quanto um castigo para os maus. O ILUMINISMO. “O ceticismo é o primeiro passo em direção à verdade”. (Denis Diderot) O Iluminismo; uma expressão surgida apenas no século 19 que origina do alemão “die Aufklärung” (aclarar) e do francês “les lumières” (as luzes), foi um movimento cultural abrangente da Idade Moderna bastante relacionado a uma determinada época do século 18, entre os anos 1720 até 1780. Nesse contexto, o filósofo francês Denis Diderot publicou no ano de 1751 o primeiro dos dezessete volumes da fundamental obra iluminista, “Enciclopédia”, a qual ele organizou numa divisão feita a partir de três grandes temas: os assuntos históricos; a razão e a filosofia; e, a poesia e a imaginação. Diderot se preocupou em editar esta obra tendo em mente que a mesma iria propor reflexões que não deveriam se submeter aos dogmas religiosos e às limitações dadas por autoridades de Estado, sendo que para atingir seu objetivo ele convocou um grande número de escritores, filósofos e intelectuais para que escrevessem artigos sobre os temas mais diversos. (Werner, 2017, p 192) (...) Segundo McGrath, o iluminismo se tornou um movimento que buscou questionar os fundamentos e bases intelectuais da religião cristã, vindo a utilizar conceitos e reflexões oriundas do cartesianismo e do deísmo; o que desafiou a Igreja para que viesse apresentar e expor suas doutrinas segundo um sistema absolutamente racional e coerente. Nesse sentido, o pretenso apoio que o Cristianismo havia recebido dos intelectuais da renascença e do movimento do racionalismo, que acreditavam na existência de Deus e de valores religiosos cristãos oriundos de uma religião natural, acabaram criando a oportunidade para que toda e qualquer doutrina cristã que não fosse completamente explicitada nos limites da razão, viesse a ser fortemente criticada e rejeitada pelo padrão analítico iluminista. (2005, p 127)... Observe que, embora a teologia cristã tenha se desenvolvido historicamente através de uma integração entre os conceitos da revelação natural e revelação sobrenatural (bíblia), esta unidade de pensamento era realizada procurando observar os limites e as funções de cada um destes distintos tipos de conhecimento. De um lado havia a revelação natural acerca de Deus que seria encontrada na Criação, e de outro, havia a revelação sobrenatural (Escrituras) mediante a qual Deus iria se fazer religiosamente conhecido perante a humanidade. No entanto, tanto os mandamentos éticos bíblicos, como as situações históricas narradas pelos profetas e apóstolos nas Escrituras, e especialmente o nascimento, a morte e a ressurreição de Jesus Cristo, vieram a se tornar os elementos da doutrina cristã mais analisados e criticados pela nova vertente intelectual racionalista do século 18. (...) O Iluminismo estava se tornando um grande movimento progressista através do qual os intelectuais entendiam que seria possível estabelecer normas gerais de direitos civis para todos os homens. (Werner, 2017, p 194) (...) As posturas e reflexões oriundas do contexto histórico e ambiente intelectual do iluminismo denunciavam uma ordem social bastante injusta na Europa do século 18, vindo a se tornar uma proposição existencial que iria gerar grandes transformações a partir da Revolução Francesa de 1789." (Ruppell Jr e Andrade, 2020). O ESTADO MODERNO. "O Ocidente havia perdido sua fé (em Deus) - e encontrou uma nova, na ciência e no ser humano." (Tarnas, Passion of the Western mind, p. 286 apud Goheen, 2016). Conforme Goheen, "as mudanças iniciadas pelas Revoluções Industrial e Francesa transformaram a sociedade no estado moderno, baseado no humanismo confessional... "No mundo moderno, o estado é a principal e mais poderosa força institucional na comunidade internacional e, provavelmente, o mais bem-sucedido promotor institucional do processo de modernização." (Walker, Telling the story, p. 110-1, apud Goheen, 2016). Nesse contexto de transformações da cosmovisão do Ocidente, Goheen assinala um pensamento e reflexão valiosos: "A sociedade que experimentou uma reviravolta como triunfo da modernidade não era propriamente cristã, mas a cristandade medieval - uma mistura de elementos cristãos e pagãos. Tal quals os humanistas, os cristãos estão propensos a rejeitar a hierarquia da Idade Média e o poder excessivo da igreja, mas farão isso por razões diferentes... "Com base em que autoridade devemos, então, moldar aquelas áreas da vida que foram emancipadas? Deve ser de acordo com os ditames da razão ou de acordo com a revelação de Deus? (Goheen e Bartholomew, p 153, 2016). MOVIMENTOS contrários e distintos diante da Cosmovisão Cristã: NATURALISMO. "A principal concorrência para a cosmovisão cristã na parte do mundo normalmente tida como a cristandade é um sistema que muitas vezes se conhece pelo nome de naturalismo. A proposição pedra de toque, ou pressuposição básica, do naturalismo afirma: "Nada existe fora da ordem material, mecânica (isto é, sem propósito) e natural". S. D. Gaede, explica: "A cosmovisão naturalista repousa na crença de que o universo material é a soma total da realidade. Para colocar em termos negativos, o naturalismo sustenta a proposição de que o sobrenatural, em qualquer forma, não existe... A cosmovisão naturalista assume que a matéria ou substância que compõe o universo nunca foi criada, mas sempre existiu. Isso porque um ato de criação pressupõe a existência de alguma realidade fora de, ou maior que, a ordem mundial - incompatível com o princípio de que o universo material é a soma total da realidade... O ser humano, como parte do universo natural, também é resultado da matéria, tempo e acaso. Dentro do contexto da cosmovisão naturalista, os milagres, como tais, não existem; são eventos naturais que ainda tem de ser explicados." C S Lewis apresenta no livro Milagres o modo em que todo cidadão ocidental, que se coloca contrário às crenças cristãs, está em verdade assumindo sua decisão por uma cosmovisão naturalista. "O Naturalista acredita que o Fato definitivo... é um vasto processo que se desenrola por conta própria... Dentro de todo esse sistema, cada acontecimento específico ocorre porque houve outro acontecimento; no final das contas, porque o Acontecimento Completo está ocorrendo... Todos os fatos e acontecimentos estão interligados de tal forma que não podem exercer a mínima independência em relação "ao espetáculo completo".... Por isso nenhum naturalista radical acredita em livre arbítrio... A espontaneidade, a originalidade e a ação "por iniciativa própria" são privilégios reservados ao "espetáculo completo", que ele denomina Natureza." (...) "O Naturalismo e a Fé Cristã são inimigos naturais no mundo das ideias. Se um deles é verdadeiro, o outro deve ser falso. (Nash, p 149-164, 2012). DUAS NARRATIVAS DIFERENTES DE PROGRESSO. LIBERAL E MARXISTA. Conforme Goheen e Bart., "a fim de manter a fé na narrativa iluminista, apesar das evidências cada vez mais pessimistas da Revolução Industrial, aqueles que criam fielmente no progresso sentiram a necessidade de reunir todos os sinais visíveis da miséria humana em um mito maior. E duas narrativas pós-iluministas que surgem no século 19 procuram fazer exatamente isso, ambas mantendo a fé no progresso por meio da ciência e da tecnologia e interpretando o testemunho contrário como parte daquela narrativa. Essas duas narrativas são o liberalismo e o marxismo... O liberalismo... oferecia um projeto de sociedade baseado na soberania do indivíduo... valoriza a liberdade do indíviduo em questões econômicas; em sua forma política, valoriza os direitos humanos individuais..."; e sobre as dificuldades e ruínas ocasionadas no decorrer do século 19, os liberais entendem que o sofrimento é um preço a pagar pelo progresso (Herbert Spencer), enquanto que John Mill e Thomas Hill voltaram sua atenção para promover alguma consciência social em meio ao processo liberal, "mas ambas as respostas liberais sustentaram a fé no progresso, e ambas explicaram o sofrimento humano como parte da narrativa." Nesse contexto, "Karl Marx apresentou uma narrativa de progresso que explicava o sofrimento... tal como Spencer, ele apresenta uma explicação racional acerca do sofrimento que também se baseia em Darwin. No pensamento político de Marx, a observação de Darwin da conquista via luta no mundo natural é traduzida em termos sociais: a história é impelida pelo conflito de classes. A narrativa de progresso é uma história de sucessivas revoluções de classe que, no final, conduzirão à igualdade e à distribuição justa e equitativa de toda a riqueza criada pelo desenvolvimento econômico. O liberalismo e o marxismo, duas noções opostas de progresso histórico com raízes no humanismo do século 19, haveriam de se apoderar do mundo durante a maior parte do século 20 - um com sede em Washington; outro, em Moscou." (p 154-155, 2016). O PROBLEMA DO MAL. Conforme Nash, ao tratar do Problema do Mal como tem sido elaborado nos últimos séculos pelos pensadores humanistas; "o mal faz a balança das probabilidades pesar contra o teísmo; a existência do mal torna a crença teísta improvável ou implausível." Nesse contexto, o pensamento cristão propõe desde que, Deus "permite o mal para tornar possível um bem maior, ou para evitar algum mal maior", e também, se referem "ao valor e a importância do livre-arbítrio humano", posto que essa experiência dos homens é uma disposição aprovada por Deus, bem como suas consequências. (...) O pensador cristão reformado Plantinga Jr, faz o seguinte destaque em meio a essas reflexões: "Por que supor que se Deus realmente tem uma boa razão para permitir o mal, o teísta seria o primeiro a saber? Talvez Deus tenha uma boa razão, mas esta razão seja muita complicada para entendermos. Ou talvez ele não a tenha revelado por alguma outra razão. O fato de que o teísta não sabe por que Deus permite o mal é, talvez, um fato interessante sobre o teísta, mas, por si só, mostra pouco ou nada de relevante para a racionalidade em Deus." Em meio a essa intensa reflexão, que traz muitas outras abordagens e pensamentos, Plantinga Jr destaca que, "todos os oponentes do cristianismo histórico, ao que parece, levantam o problema do mal como uma forma de desafiar a crença cristã em Deus", ainda que muitos intelectuais defensores de certos tipos de movimento, como o naturalismo, não tenham qualquer condição racional de fazer esse tipo de argumentação, já que "bem e mal num universo naturalista não podem se referir a qualquer coisa transcendente, qualquer coisa que tenha posição fora da ordem natural das coisas." (p 137-146, 2012) O DESENVOLVIMENTO DO PENSAMENTO NO OCIDENTE. (Alister Mcgrath). Sobre o modo como Deus age no mundo, e dessa forma, como se compreende a realidade e o movimento histórico e transcedente da realidade, destacamos posições variadas, como, o Deísmo, em que "Deus age por intermédio da natureza", de forma que a "posição deísta pode ser resumida" no entendimento de que Deus agiu criando o universo "de forma ordenada e racional", num espelho da pessoa divina, sendo que agora, toda ordem e regularidade do mundo está disponível para a compreensão do homem, pois "as leis da natureza foram estabelecidas por Deus; e apenas restava a um ser humano brilhante descobri-las", conforme declaração de Alexander Pope: "A natureza e suas leis escondem-se na noite. E disse Deus, que haja Newton, e tudo se transformou em luz." "O deísmo defendia a ideia de que Deus havia criado o mundo, dotando-o com a capacidade de evoluir e funcionar sem que houvesse a necessidade da contínua presença e interferência de Deus. Essa perspectiva", bastante influente especialmente no século 18, "via o mundo como um relógio, e Deus como um relojoeiro. Deus havia dotado o mundo como um modelo auto-sustentável para que pudesse funcionar sem a necessidade de sua contínua intervenção." E assim, diante da pergunta, "Como Deus agiria no mundo? A resposta para essa pergunta é bastante simples: Deus não age no mundo." Deus criou todo o sistema e o ordenou e o colocou em movimento, criando um mundo "completamente autônomo e auto-suficiente. Não é necessária nenhuma ação da parte de Deus." (...) Ainda sobre o tema de como Deus age no mundo, temos o "Tomismo", em que "Deus age por intermédio de causas secundárias". O entendimento do teólogo da Idade Média percebe que Deus age utilizando "causas primárias e secundárias", enfatizando que Deus não age diretamente, mas através dessas causas. Assim, para que um grande pianista possa realizar um grande concerto, é preciso tanto a causa primária, o pianista, como a causa secundária, um piano afinado: "a capacidade da causa primária para alcançar o efeito desejado depende da causa secundária a ser usada." Tomás de Aquino reflete a partir desse entendimento sobre o problema do mal: "O sofrimento e a dor não devem ser atribuídos à ação direta de Deus, mas sim à fragilidade e à debilidade das causas secundárias por meio das quais Deus opera. Deus, em outras palavras, deve ser visto como a causa primária, e os vários agentes que existem no mundo, como as causas secundárias a ele relacionadas. (...) O autor faz uma reflexão importante, pois destaca que no pensamento de Aristotéles, em que se baseia a compreensão inicial, mas não total, de Aquino, "as causas secundárias são capazes de agir por si próprias. Os elementos naturais são capazes de agir como causas secundárias em virtude de sua própria natureza", sendo importante salientar que teólogos renomados eram contra essa concepção aristotélica, inclusive Aquino, "que alegava ser Deus o "impulso ontológico inicial", a causa principal de toda ação, sem a qual nada poderia existir... Assim, a interpretação teísta das causas secundárias apresenta a ação de Deus no mundo da seguinte forma. Deus age de maneira indireta no mundo, por meio das causas secundárias. Pode-se notar a existência de uma grande cadeia de causalidade, que aponta para Deus como o impulso originário e principal de tudo o que acontece no mundo. Entretanto, ele não age diretamente no mundo, mas por meio de uma cadeia de eventos que Deus inicia e controla." Aquino parece entender que Deus inicia uma cadeia de ações sob sua orientação, e que a partir daí, Deus "delega a ação divina às causas secundárias existentes dentro da ordem natural. Por exemplo, Deus pode mover a vontade do homem de forma que alguém que esteja doente receba assistência"; assim, uma ação que é da vontade divina será realizada de forma indireta, sendo que a mesma será causada por Deus, mediante uma causa secundária. Nessa visão, Deus age e se mantém atuante durante todo o processo, embora surjam reflexões diversas sobre o modo como isto ocorre. Nesse contexto, iremos estudar nas últimas aulas a compreensão de Calvino nas Institutas e citações da Bíblia de Genebra, sobre o Governo de Deus e as causas secundárias etc. (McGrath, p 222, e 336-338, 2006). NEOCALVINISMO. A EXPERIÊNCIA HOLANDÊSA. Abraham Kuyper foi um pensador reformado que atuou na Holanda como teólogo e político, vindo a ser Primeiro Ministro de seu país no início do século 20, de 1901 até 1905. Acerca de nosso tema, Cosmovisão Reformada, iremos apresentar um resumo e citações do artigo, Abraham Kuyper: Um Modelo de Transformação Social, escrito por Nilson Moutinho dos Santos, do livro: Cosmovisão Cristã e Transformação, 2006. ABRAHAM KUYPER: UM MODELO DE TRANSFORMAÇÃO INTEGRAL. Kuyper surgiu na vida da Holanda no século 19, num período em que o país estava distante dos valores tradicionais da civilização ocidental, num momento em que o liberalismo orientava novos princípios para a cultura da nação. "Kuyper enfatizou o caráter calvinista da nação e apelou para a energia, o destemor e a fé da era da Reforma. Quando morreu, escolas cristãs livres podiam ser encontradas do norte ao sul. Crentes estavam aplicando os princípios em seus lares, igrejas e associações. Homens cristãos de ciência estavam demonstrando que a crença na Bíblia não era antiquada, mas atual. A face do país foi renovada." (p. 81). O propósito desse artigo é refletir pensamentos e atitudes de Kuyper, não no objetivo de aprender com o que houve nos séculos 17 e 19, mas sim, para refletir "como podemos desenvolver uma cosmovisão cristã para os evangélicos brasileiros do século 21 que incorpore aqueles princípios cristãos que animaram os holandeses em sua era gloriosa." (p. 84). Abraham Kuyper nasceu em 1837 na Holanda, filho de um Ministro da Igreja Reformada, e se tornou um escritor capaz e influente ao refletir sobre temas da igreja e política, cultura geral e ainda como jornalista. Houveram três experiências que vieram a transformar a caminhada espiritual de Kuyper até ele se tornar o cristão bíblico e líder social-teológico reformado que conhecemos: ele teve contato com as obras de João de Lasco, reformador escocês renomado, para a feitura de um texto na faculdade; depois, descobriu o valor dos sacramentos e da adoração mediante a leitura da obra clássica O Herdeiro de Redcliffe, em que são narradas as vivências espirituais do protagonista Filipe de Norville. A terceira e fundamental experiência de vida que mudou a jornada espiritual e existencial de Kuyper, ocorreu quando assumiu uma paróquia reformada para ministrar, vindo a observar que os membros da igreja não participavam das atividades "como forma de protesto ao modernismo". Kuyper foi visitar essas famílias e "surpreendeu-se quando percebeu que eles possúiam uma cosmovisão mais coerente que a sua e um profundo conhecimento da Bíblia, muito maior do que o seu." (p. 86). A cosmovisão daqueles irmãos estava embasada no pensamento de João Calvino, e sobre esse momento, comentou Kuyper: "Não havia apenas um conhecimento da Bíblia, mas também conhecimento de uma bem ordenada cosmovisão, bem ao estilo dos reformadores antigos. {...} E o que era, para mim pelo menos, mais atraente, era que aqui falava um coração que não apenas possuía, mas também tinha uma simpatia por uma história e experiência de vida {...} Calvino podia ser encontrado, ainda que de forma velada, entre aquelas simples pessoas do campo, as quais dificilmente tinham ouvido falar dele. Ele tinha ensinado de tal forma que ele podia ser entendido, mesmo séculos depois de sua morte, num país estrangeiro, numa vila esquecida, numa sala coberta de cerâmica, com a mente de um trabalhador comum." (p. 86-87). Quando se referia à cosmovisão que conheceu junto daqueles irmaõs da igreja, Kuyper assim a descreve, como tendo "uma estabilidade de pensamento, uma unidade de discernimento abrangente {...} uma cosmovisão baseada em princípios." (p. 87). A partir dessa experiência, podemos entender que a Igreja local tem a condição e capacidade de: - ensinar uma cosmovisão aos membros; - envolta em uma dinãmica de fé e amor, mais que racional; - uma cosmovisão estabelecida dá fundamentos e força na doutrina; - a cosmovisão atua na mente e coração e assim se torna um conhecimento difícil de negar. Para o autor de nosso texto base, o conhecimento de Kuyper deve ser descrito assim: "que o Cristianismo das Escrituras não se preocupa apenas com a salvação da alma do indíviduo, mas se coloca como um sistema de vida que nada deixa fora do domínio de Jesus Cristo." Kuyper: "Cristo governa não simplesmente pela tradição do que ele outrora foi, falou, fez e suportou; mas por um poder vivo que ainda agora, assentado como ele está à mão direita de Deus, exerce sobre as terras e nações, gerações, famílias e indivíduos." (p. 88). UMA INTRODUÇÃO AO PENSAMENTO DE KUYPER. (p. 92). No destaque de nosso autor, o conhecimento do pensamento de Kuyper se encontra nas Palestras Stone (livro: Calvinismo). Pois o pensador reformado dialoga com uma cultura distinta da sua, ao visitar os EUA, buscando apresentar de forma "concisa, compreensiva e sistemática", a sua reflexão para uma cosmovisão cristã. Foram seis palestras: Calvinismo como Sistema de Vida, Calvinismo e Religião, Calvinismo e Política, Calvinismo e Ciência, Calvinismo e Arte, Calvinismo e Futuro. A tese de Kuyper era "que o calvinismo se coloca como uma concepção de vida e de mundo, um sistema de vida." (p. 92). Ao utilizar a palavra "calvinismo", Kuyper reflete "os aspectos histórico, filosófico e político da questão. O primeiro mostra o canal pelo qual a Reforma fluiu. O segundo revela o sistema de concepções estabelecido para dominar as diversas esferas da vida. E o terceiro indica "o movimento político que tem garantido a liberdade das nações em governo constitucional." (p. 92). Dessa forma, o conteúdo das Palestras Stone tem sido reconhecido como o texto essencial acerca do pensamento de Kuyper e do neocalvinismo, vindo a influenciar toda a América do Norte e Brasil, Inglaterra e África do sul, além da Coréia do sul, refletindo temas jurídicos e educacionais, de ciência e das artes, além de jornais e publicações. "Kuyper reivindicava que suas ideias foram derivadas de Calvino e aclimatadas no ambiente intelectual ocidental do final do século 19. Uma questão interessante é examinar como ele teria "modernizado" o calvinismo." (p. 93). Kuyper utilizava a expressão reformado para temas da igreja e teologia, enquanto a expressão calvinismo tratava das situações integrais da vida. O Calvinista era o cristão reformado que agia segundo esse pensamento na igreja e teologia, e também nas situações sociais e políticas, diante do conhecimento e nas artes. No interesse de atualizar o pensamento calvinista para os séculos 19 e 20, Kuyper adotou o termo "neocalvinismo" acerca de suas reflexões, a fim de "despertar a teologia reformada de seu sono e tornar acessíveis para ela novas perspectivas até aqui não consideradas." (p. 94). Neste sentido, Kuyper apresentou uma proposição peculiar acerca do que fora ensinado, ao utilizar a doutrina exposta por Calvino na defesa da existência de igrejas em formas diversas. Sendo "um desenvolvimento natural do "princípio calvinista de liberdade, o qual, na esfera eclesiástica, permitiu a cada congregação local experimentar uma completa autonomia". (p. 95). Kuyper: "{...} a soberania de Cristo mantém-se absolutamente monárquica, mas o governo da Igreja na Terra torna-se democrático para seus ossos e medulas (Kuyper estabelece duas implicações lógicas: primeira); {...} todos os crentes e todas as congregações estão numa posição igual, nenhuma igreja pode exercer domínio sobre outra. Todas as igrejas locais são da mesma classe e, como manifestações de um mesmo corpo, somente podem estar unidas {...} por meio de confederação; {...} (segunda:) se a Igreja consiste na congregação de crentes {...} então as diferenças de clima e nação, de passado histórico e de disposição mental contribuem para exercer uma influência que produz variedade, e a multiformidade em questões eclesiásticas deve ser a consequência." (p. 95). O princípio da liberdade refletido por Kuyper demonstra que ele percebia as variações culturais de pensamento e hábitos que surgiam na Europa nos últimos cinquenta anos do século 19. Ao invés de se buscar uma total unidade na organização eclesiástica, "a única solução viável era o estabelecimento de igrejas livres, nas quais pessoas da mesma mentalidade poderiam voluntariamente manter-se juntas. A sensibilidade particular de Kuyper para a diversificação social e intelectual de seu tempo era devida, em parte, ao fato de que foi precisamente esse processo que ameaçou marginalizar o lugar da religião na sociedade. {...}". (p. 95). Kuyper buscava desenvolver princípios calvinistas diante das transformações culturais e sociais do século 19. Numa outra perspectiva acerca do modo como desenvolvia o pensamento calvinista para sua época, "a cosmovisão calvinista que ele abraçara não se limitava a restabelecer as doutrinas calvinistas tradicionais. Ao contrário, elas eram reinterpretadas radicalmente e reaplicadas, de maneira que sua relevância era estendida para abranger a totalidade da existência humana {...}". (p. 96). Para nosso autor, Kuyper jamais defendeu um novo calvinismo, mas sim, "ele via a necessidade de modernização, aplicando os princípios do calvinismo em todas as disciplinas científicas, especialmente no desenvolvimento de uma moderna teoria calvinista do conhecimento, para fazer frente às questões epistemológicas levantadas pelos filósofos protestantes desde Kant." (p. 96, 97). A doutrina calvinista da Graça Comum se relaciona intimamente com os cinco pontos do calvinismo, do cânone de Dort (1618-19), pois a Depravação Total do homem demonstra a força radical do pecado sobre o ser humano, em contrariedade ao pensamento modernista que indica a capacidade do homem ser bom o bastante para alcançar o progresso; sendo que, a graça comum aponta para o modo como Deus sustenta valores e bondade no mundo e no homem, segundo a sua Soberania e propósito. Para Kuyper, o calvinismo não é uma doutrina eclesial, mas "uma concepção de vida e do mundo capaz de fornecer não só orientação para o pensamento, mas também direção para a ação em todas as áreas da vida." (p. 97). ABRAHAM KUYPER: UM MODELO DE TRANSFORMAÇÃO INTEGRAL. Apresentamos agora, alguns tópicos do pensamento de Kuyper acerca de uma Cosmovisão Reformada. O primeiro item trata da relação do Cristianismo diante do Estado na sociedade. Kuyper desenvolve três princípios sobre a Soberania de Deus, para que possamos entender o modo como os cristãos devem atuar e se relacionar diante das autoridades de governo. "Existe um princípio dominante no calvinismo, do qual nascem as suas convicções políticas. Trata-se da soberania primordial que se irradia numa tríplice supremacia, a saber: a soberania do Estado; a soberania da sociedade; e a soberania da igreja." (p. 99-100). Segundo Kuyper, toda a humanidade é somente uma raça e um sangue, e por isso, toda a existência humana deveria ocorrer "segundo um modelo patriarcal de vida familiar." No entanto, devido ao pecado e suas corrupções estarem no homem e no mundo, surgiu a necessidade do magistrado e da polícia, das forças armadas etc; posto que num mundo sem pecado, "toda regra, ordenança e lei caducaria, assim como todo controle e afirmação do poder magistrado desapareceria." (p. 100). Segue o resumo das teses calvinistas de Kuyper sobre uma fé diante da política: Somente Deus é soberano sobre o destino das nações, pois Ele as criou e sustenta, e já que o pecado tem arruínado o governo direto de Deus na arena política, o Senhor estabelece autoridades humanas nessa situação. Uma autoridade que não pode gerar uma submissão ilimitada dos homens uns perante os outros, pois trata-se de uma autoridade dada conforme a soberana majestade de Deus. Assim, em decorrência e pela razão de que a autoridade do Estado surgiu na realidade humana devido ao pecado, e pela necessidade de trazer ordem à vida social da humanidade; então, "num sentido calvinista, nós entendemos que a família, os negócios, a ciência, a arte e assim por diante, todas são esferas sociais que não derivam sua existência ao Estado; e a lei de sua vida da superioridade do Estado, mas obedecem a uma alta autoridade de seu próprio seio; uma autoridade que governa pela graça de Deus, do mesmo modo como faz a soberania do Estado." (p. 101). Neste sentido, "segundo Kuyper, é da mais alta importância saber diferenciar a autoridade orgânica da sociedade da autoridade mecânica do governo." Nas outras esferas da vida, a autoridade é decorrente de uma capacidade oriunda da própria natureza de cada campo da existência, ao contrário do Estado, que recebe autoridade devido à necessidade de ordem no caos do pecado. Assim, "{...} toda ciência é apenas a aplicação, no cosmos, dos poderes de investigação e pensamento criados dentro de nós; e a arte nada mais é do que a produtividade natural dos poderes da imaginação. {...} Nesse contexto, Kuyper entende que a legítima soberania do Estado sobre o indivíduo e áreas da vida humana, ocorre de três formas: - quando há conflitos entre áreas particulares, para orientar respeito entre elas; - na defesa das pessoas que são submetidas pelo abuso de poder de outros, em suas próprias esferas de convivência; e ainda, - "3. (Para) constranger a todos a exercerem as obrigações pessoais e financeiras para a manutenção da unidade natural do Estado." (p. 102). Acerca da soberania do indivíduo, Kuyper ensina que todo ser humano é soberano sobre as decisões de sua vida, e somente Deus está acima dele; sendo um "dever do Estado, pois, garantir a liberdade de consciência, garanti-la até perante a igreja e conta o despotismo." (p. 102). Kuyper buscou esclarecer qual era o conflito maior que o Cristianismo enfrentava na sua época, vindo a definir que o mesmo se dava diante do modernismo. Kuyper: "Dois sistemas de vida estão em combate mortal. O modernismo está comprometido em construir um mundo próprio a partir de elementos do homem natural, e a construir o próprio homem a partir de elementos da natureza; enquanto que, por outro lado, todos aqueles que reverentemente humilham-se diante de Cristo e o adoram como o Filho do Deus vivo, e o próprio Deus, estão resolvidos a salvar a "herança cristã". Esta é a luta na Europa, esta é a luta na América, e esta é a luta por princípios em que meu próprio país está arraigado, e na qual eu mesmo tenho gastado todas as minhas energias por quase quarenta anos." (p. 102-103). CIÊNCIA E ARTES. Na área científica, a proposição calvinista de kuyper para a busca do conhecimento trouxe grandes conflitos com o modernismo, pois o autor reformado defendia que o real entendimento dos fatos requer descobrir o modo como Deus governa e sustenta a realidade. Ele argumenta que não há conflito entre fé e ciência, posto que o conhecimento adquirido pelos sentidos do ser humano é uma experiência viva e verdadeira da realidade. Sendo oriunda do fato de que somos pessoas conscientes de que estamos debaixo de uma realidade superior, a qual devemos perceber e utilizar na busca e apreensão de todo conhecimento. Para Kuyper, o conflito entre os modelos de ciência e conhecimento origina do fato de se acreditar, de um lado, que o universo e mundo estão em um progresso natural, ou de outra forma, que a história se desenvolve a partir de uma corrupção ocorrida na antiguidade, e que agora precisa ser reparada; sendo que estas "duas elaborações científicas opostas uma à outra, cada uma tendo sua própria fé {...} ambas estão disputando com perseverança todo domínio de vida...". (p. 106). Kuyper destaca o valor calvinista de que a arte é uma experiência humana universal que ocorre conforme à realidade social e natural em que se desenvolve. Explica a diferença entre avaliar a arte no interesse de valorar a moral do ser humano em uma determinada prática artística, do que somente depreciar um movimento cultural por sua técnica e estética. Sendo que, para o pensador reformado, a própria "aliança entre religião e arte representa uma baixa forma de religiosidade": "Em cada país onde o calvinismo surgiu, ele levou a uma multiformidade de tendências da vida, quebrou o poder do Estado dentro do campo da religião e, numa grande extensão, pôs fim ao sacerdotalismo...". (p. 107-108). Kuyper entende que o momento na história em que a Arte esteve subordinada à religiosiade foi uma experiência de religião inferior, como da antiga aliança, em contraste com a religiosidade verdadeira da nova aliança. Da mesma forma, não se pode tutelar e utilizar a arte para promover a religião como ocorreu na idade média, posto que são símbolos de uma religião dependente da estética; sendo algo inferior e que cujo período e tempo ficou para trás. "Concordando basicamente com Hegel e von Harmann, Kuyper conclui que religião e arte tem suas próprias esferas de vida, não podendo ser separadas no início, mas adquirindo identidades próprias ao atingirem a maturidade. Esse processo de maturidade e separação, segundo ele, é o "processo de Arão para Cristo, de Bezaleel e Aoliabe para os apóstolos". (p. 108). Eis o motivo porque o calvinismo buscou libertar a arte para que viesse a se desenvolver dentro de sua esfera própria pela experiência humana, ao invés de edificar uma específicia "arte calvinista". Acerca do modo como a arte pode ser integrada à religião, Kuyper faz duras críticas aos que buscam maior espiritualidade nos cultos procurando trazer as representações simbólicas e "formas de adoração sensorial" para as celebrações. Ao contrário, argumenta que "esta fraqueza da vida religiosa deve inspirar à oração por uma obra mais poderosa do Espírito Santo." (p. 109). Ao concluir, explica que, "nossa vida intelectual, ética, religiosa e estética, cada uma comanda uma esfera própria. Essas esferas correm paralelas e não permitem derivação de uma para a outra. É a emoção central, o impulso central e o entusiasmo central, na raiz mística do nosso ser, que procura revelar-se para o mundo exterior nessa quádrupla manifestação...". (p. 110). Desta forma, Kuyper diferencia e valoriza as áreas autonômas da religião, da arte e outras, como também, apresenta o modo em que o cristão calvinista não irá perceber e desenvolver nenhuma dessas áreas em contrariedade diante da realidade última, Deus, que ele reconhece segundo seu conhecimento religioso. AGENDA PARA O FUTURO. Kuyper observou que a sociedade ocidental estava desprezando o cristianismo como fonte de conhecimento, ao mesmo tempo em que negava algumas virtudes e bençãos históricas que essa religião havia ofertado para a humanidade. "A filosofia moderna considerava o cristianismo como superado, supérfluo, entrando na era pós-cristã." (p. 110). Nesse contexto e situação, Kuyper buscou um conteúdo religioso cristão que pudesse orientar os cristãos e sociedade no conhecimento do Cristianismo bíblico, e entendeu que seria o calvinismo. O autor do artigo faz breve análise sobre as mudanças sociais que Abraham Kuyper liderou na Holanda, destacando a organização de um partido político conservador e democrático, além da criação da Universidade Livre de Amsterdã. Kuyper também foi o responsável por uma transformação social inovadora, na qual as diferenças entre as pessoas e comunidades foram mais ideológicas do que baseadas na economia e classe social. Desta forma, cada movimento de pensamento tinha a liberdade e a condição de criar e administrar "instituições sociais e políticas com mínima interferência governamental e de acordo com suas próprias persuasões ideológicas." (p. 114). "Ele pretendia oferecer um programa alternativo para uma renovação cultural e política, diferente daquele oferecido pelos ideais iluministas da Revolução Francesa, a qual, acreditava-se, estava fazendo um estrago na sociedade holandesa em todos os níveis. Com sua persistente agitação para maiores liberdades educacionais, sociais e políticas para os grupos minoritários na sociedade, Kuyper pretendeu ser um líder progressista e inovador." (p. 115). Conclusão. Citações. "As ideias teológicas de Kuyper não devem ser simplesmente copiadas para os dias de hoje. Ele mesmo se oporia a isso. O que deve ser feito é um estudo dos princípios por trás dos seus ensinamentos para poder aplica-los em nossa realidade presente, em concordância com os ensinamentos da Palavra. {...} boa prática seria promover estudos aprofundados da vida e obra de Calvino para poder avaliar de que forma Kuyper se apropria dos princípios calvinistas na sua cosmovisão. {...} Finalmente, se Kuyper está certo quanto a ser o calvinismo atualizado uma legítima biocosmovisão, em condições de poder representar de maneira consistente o cristianismo, então ele pode ser aplicado a todas as áreas da vida, de maneira a revitalizar profundamente o relacionamento do homem com Deus, consigo mesmo e com o próximo - por fim, com o mundo onde ele vive " (p. 119 - 122). REFERÊNCIAS. RIBEIRO DE CARVALHO, Guilherme Vilela e outros (organizadores) Cosmovisão Cristã e Transformação. Viçosa, MG : Ultimato, 2006. Artigo: Abraham Kuyper: Um modelo de transformação integral, por Nilson Moutinho dos Santos. Goheen, Michael W e Bartholomew, Craig G. Introdução à Cosmovisão Cristã. São Paulo, Vida Nova, 2016. McGrath, Alister. Teologis sist, hist e filosófica. Sheed Publicações, São Paulo SP, 2005. Nash, Ronald. Cosmovisões em conflito. Brasília, Edit Monergismo, 2012. Leite, Carvalho e Cunha (org). Cosmovisão Cristã e Transformação. Carlos Souza, artigo. Viçosa,MG, Edit Ultimato, 2006. Kuyper, Abraham. Calvinismo. São Paulo, Edit Cultura Cristã, 2003. Ruppell Jr, Ivan Santos e Andrade, Marli. O Cristianismo e a Civilização Ocidental. Edit Intersaberes, Curitiba Pr, 2020. Carlos Souza, artigo. Viçosa,MG, Edit Ultimato, 2006. Kuyper, Abraham. Calvinismo. São Paulo, Edit Cultura Cristã, 2003. Autor. Ivan Santos Rüppell Jr é Professor de ciências da religião e Teologia.