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a ESPIRITUALIDADE da ROTINA CONJUGAL, no Cinema: FOI APENAS UM SONHO, de Sam Mendes

"Se correr o bicho pega, se ficar o bicho come", já dizia o ditado popular que bem simboliza as reflexões do cineasta Sam Mendes quando decide pôr a colher no caldeirão existencial do "american way of life", o padrão norte-americano de vida social que se tornou modelo ocidental a partir da segunda metade do século 20. O talentoso diretor britânico joga lenha no fogão caseiro da maioria dos seres humanos do planeta ao abordar duas maneiras possíveis de superação da nossa rotina de homens e mulheres "do lar", oferecendo para ambas tanto uma impactante conclusão como finais sem solução. Os filmes em questão são "Beleza Americana" (American Beauty, 1999), e "Foi apenas um sonho" (Revolutionary Road, 2008). E as indagações acerca de como transformar o tédio familiar da vida diária de quase todo mundo é o que movimenta a alma dos protagonistas. Em "Beleza Americana" vemos Lester Burham (Kevin Spacey) "correr" de sua vida profissional enquanto detalhadamente planeja como escapar de sua rotina conjugal. Já no filme "Foi apenas um sonho" observamos Frank e April (Leonardo DiCaprio e Kate Winslet) imaginarem uma nova vida em Paris enquanto acabam permanecendo em Connecticut mesmo. E como diz o ditado, tanto o que corre quanto os que ficam, o bicho derruba! Eis a aparente conclusão sem solução de Sam Mendes para o "american way of life". E haja reflexão sobre o nosso cotidiano conjugal para meditar espiritualmente nestes filmes, sim senhor. O negócio é que o instigante romance dramático "Foi apenas um sonho" aparenta visualizar bastante as possibilidades de um sonho conjugal enquanto o que desenvolve mesmo são as inquietações do dia a dia familiar. Daí que a oportunidade do casal libertar-se de sua rotina a partir de uma transformação do cotidiano não se torna exatamente seu tema essencial, ou a sua mensagem ideal, seja o que for. Pois o filme é bem mais realista e cruel do que os (bons) entretenimentos escapistas que Hollywood apresenta ao mundo desde sempre. Sam Mendes aponta sua câmera para uma mudança exterior, mas seu olhar investiga, de verdade mesmo, o interior humano. E o que seu filme revela é tanto a grandeza da nossa imaginação e expectativas, quanto a limitação de nossos sentimentos e responsabilidades. Algo que não é necessariamente negativo ou positivo, no fim das contas. Afinal, quem foi que disse que reconhecer seus próprios limites não é uma vitória, também? Dá uma olhada na sinopse: "Frank e April estão bem distantes da convencionalidade dos subúrbios. No entanto, é exatamente isso que os irrita quando compram uma casa em Connecticut. Ele trabalha 10 horas por dia em um emprego que odeia enquanto ela, uma dona de casa na década de 1950, anseia por realização e paixão. Rebelando-se contra o tédio de suas vidas, o casal planeja uma fuga que vai por à prova seus limites." Enfim, assim como o diretor, a espiritualidade judaico-cristã também valoriza o valor analítico da interioridade do ser humano. Eis a razão para que o salmista faça orações afirmativas cantando sobre como Deus o livrou... de si mesmo: "Senhor, meu coração não é orgulhoso, e meus olhos não são arrogantes. Não me envolvo com questões grandiosas ou maravilhosas demais para minha compreensão" (Salmo 133). A solução espiritual deste ansioso clamor de fé é muito clara: "Pelo contrário, acalmei e aquietei a alma...", pois precisamos ser protegidos até dos próprios sonhos, muitas vezes. O Apóstolo São Paulo desenvolve o princípio ao definir para um seguidor de Jesus que a maior transformação de seu destino espiritual irá ocorrer durante a sua permanência no cotidiano de sempre: exatamente ali onde somos pais e filhos, amigos e vizinhos, cidadãos e profissionais, maridos e esposas, uns dos outros. Sim, pois nada é mais revolucionário na fé cristã quanto amadurecer a personalidade sem fugir da responsabilidade de permanecer na mesma localidade e história, de sempre. Eita. Sem desprezar que é sempre melhor saborear um hamburguer durski por aqui do que um croissant seco acolá, quiçá. A conclusão do filme é uma cena dupla de casais partilhando nossos desencontros do cotidiano, na visão de que pratiquemos uma de suas atitudes na busca de melhorar a comunicação e até manter a sanidade após anos de convivência. Pois enquanto um dos maridos tem coragem de avisar o que desagrada, o outro adquire a sábia compreensão de não mais ouvir o que só irrita. E acredite, ainda que sejam opostas uma da outra, as duas formas de lidar com o dia a dia conjugal serão igualmente importantes para se resguardar tanto a continuidade familiar, quanto a serenidade particular. E haja discernimento para decidir qual delas escolher pra melhor vivenciar cada situação da nossa intensa rotina do lar. Mas, acredite, vale a pena! Afinal, casar não é apenas um sonho, mas sim, uma grande experiência existencial espiritual. E que venham os melhores sonhos, então, junto das mais plenas realidades, pois os melhores filés estão junto do osso.

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