terça-feira, 10 de agosto de 2021

JOÃO CALVINO, Introdução. Contexto histórico e formação teológica.

João Calvino nasceu em Noyon, França em 1509; “educado na Univ de Paris, ele transferiu-se para a Univ de Orleans, de tendência mais humanista, na qual estudou Direito Civil.” Após sua conversão ao redor dos anos 1530-35, se aproximou dos movimentos protestantes, vindo a se exilar na Basiléia em meio a conflitos religiosos. Segundo McGrath, “a segunda geração de reformadores tinha uma consciência muito maior que a anterior a respeito da necessidade de obras que tratassem da teologia sistemática. João Calvino... percebeu a necessidade de produzir uma obra que introduzisse de forma clara, os fundamentos da teologia evangélica, justificando-a com base nas Escrituras e defendendo-os da crítica católica.” (Teologia sist., hist. e filosófica, 2005). Havia dois movimentos de reforma do cristianismo "católico" em desenvolvimento na Europa na década de 1530; com o luteranismo mais ligado à regiões da Alemanha tendo base nos "catecismos de Martinho Lutero e nos escritos teológicos de Philip Melanchton", e com a "facção reformada" ocorrendo ao sul da Alemanha e na Suiça, tendo por líderes a Ulrico Zuinglio, Heinrich Bullinger e Martin Bucer. (McGrath, p. 87, 2012). AS ORIGENS DA REFORMA EM GENEBRA. "Durante a década de 1520, os movimentos reformistas evangélicos alcançaram considerável sucesso nas cidades da Suiça. Apesar de o movimento ter começado em Zurique, no final da década de 1520, ele conquistara algumas das principais cidades da região, incluindo Basileia e Berna. No entanto, essas eram cidades de língua alemã." (p. 92, 2012). No decorrer desta década um grupo de cidades francesas e suiças começaram a se interessar pela causa reformista e por interesses comerciais junto aos suiços vieram a pressionar lideranças em favor do protestantismo, algo ocorrido nas regiões de Pays de Vaud e cidades de Neuchatel, Lausane e Genebra. Como não havia reformadores fluentes em francês, buscaram Guilherme Farel na diocese francesa de Meaux, trazendo-o para Basileia em 1534, de onde foi expulso por radicalismos, vindo a residir em Berna. "Genebra, tendo conquistado sua independencia do vizinho Ducado de Savoia naquele ano, estava determinado a moldar seu próprio futuro, em vez de ser dominada por um de seus vizinhos. Em agosto de 1535, o conselho da cidade votou que a República de Genebra aceitaria os princípios da Reforma protestante e aboliria a missa." Neste momento, Farel buscou alguém que pudesse ajuda-lo na tarefa de implementar a visão religiosa protestante na cidade, vindo a pensar em João Calvino para a empreitada. Calvino nasceu na cidade francesa de Noyon, e ao passar pela Univ. de Paris teve contato com conceitos de reforma da igreja, antes de estudar e concluir Direito em Orléans, tendo voltado a Univ. de Paris então, e se aproximado do Reitor Nicholas Cop que fez palestras reformistas, o que causou grave conflito junto às autoridades, de modo que Calvino teve que fugir para a cidade suiça da Basileia, refúgio protestante; sendo esse um período de muita desinformação e gerador de conflitos entre as autoridades e líderes protestantes, de modo que até o Rei Francisco I acabou perdendo o interesse pelo protestantismo. Neste contexto Calvino buscou escrever um livreto "que expunha os elementos básicos da percepção reformista da fé cristã que ele pessoalmente abraçava. Calvino, em acréscimo à exposição de sua percepção sobre o Credo e o Pai Nosso, escreveu um prefácio dirigido a Francisco I, pedindo tolerância para essa forma evangélica moderada de cristianismo e distinguindo-a dos excessos e da violência do anabatismo. A obra Institutas da Religião Cristã, publicada pela primeira vez em maio de 1536, no fim, tornar-se-ia uma das publicações mais influentes do século 16 - não por causa de seu prefácio gracioso, mas por causa de seu relato lúcido, sistemático e convincente dos elementos básicos do cristianismo reformado." (p. 92-93, 2012). Ao passar por Genebra em 1536 Calvino foi convidado por Farel para ajudar nas reformas que a cidade buscava, exatamente a partir dos conhecimentos de Calvino da língua francesa, do valor da escrita teológica das Institutas e do entendimento de Direito Civil; sendo que Calvino aceitou o convite. O conhecimento teológico de Calvino e seu respeito, citação e utilização dos pensamentos dos pais da Igreja surgiu como conteúdo relevante da liderança que viria adquirir no movimento reformado de Genebra e região, especialmente a partir de um debate em que ele participou na cidade de Lausane. "Lausane foi conquistada para a Reforma, e Genebra foi conquistada por Calvino." (p. 94). No entanto, Farel buscou definir estruturas religiosas na sociedade de Genebra que não foram bem recebidas pela liderança, já que haviam se separado do Ducado de Savóia e não aceitavam facilmente serem governados por estruturas que entendiam dominantes demais; especialmente pela grande quantidade de estudos teológicos e reflexões que formavam os demorados sermões na Igreja, de modo que a cidade expulsou Calvino e Farel, numa situação que deixou Calvino perplexo e triste. Calvino vai até a cidade de Estrasburgo e se dedica à teologia, escrevendo uma nova edição ampliada das Institutas (1539), além da versão em francês (1541), atuando como pastor dos moradores e refugiados de língua francesa, vindo a vivenciar a realidade das dificuldades porque passavam os sacerdotes reformados naquele período. De modo especial, "por meio de sua amizade com o principal reformador de Estrasburgo, Martin Bucer, Calvino conseguiu desenvolver seu pensamento sobre a relação entre a cidade e a igreja e também os fundamentos intelectuais para seu programa de reforma. (...) A igreja e a comunidade reformadas que existiram apenas na mente de Calvino em Genebra em 1538 eram, agora, realidades concretas. Teoria abstrata e puras divagações deram lugar à experiência prática. Calvino estava pronto para começar tudo de novo - mas, dessa vez, ele estava determinado a fazer certo. Por fim, no outono de 1541, veio o convite para que retornasse a Genebra." (p. 95). A cidade estava sem rumo e direção, também em meio aos conflitos graves diante dos anabatistas, de modo que a liderança da cidade abraçou o projeto de reforma de Calvino; e assim, "na última década de sua vida, ele teve praticamente liberdade nos assuntos religiosos da cidade." (McGrath, p. 95, 2012). AS INSTITUTAS DA RELIGIÃO CRISTÃ. Calvino se fez um notável líder da Reforma Protestante do século 16 a partir de seu tratado teológico “As Institutas da Religião Cristã”, bem como por sua atuação como líder religioso e social na cidade de Genebra, até sua morte em 1564. O denominado "Exegeta da Reforma" devido à sua "clareza, simplicidade e fidelidade textual", escreveu sua maior e mais conhecida obra, Institutas, num período de 23 anos (1536-1559), ao mesmo tempo em que comentava praticamente todos os livros da bíblia. (Herminsten, Maia. O Pensamento de João Calvino, 2000, p 37). Nessa perspectiva, a partir da reflexão exposta nos comentários, Calvino extraiu as verdades e princípios de Deus que veio a desenvolver e apresentar nas Institutas, conforme o seu propósito de escrever uma obra didática, segundo explica Timothy George, como se fora "um manual de instrução... que apresentasse os rudimentos de uma teologia bíblica e levasse os jovens cristãos a uma maior compreensão da fé." (1993, p. 178). Nesse sentido, Calvino expõe o conteúdo bíblico, buscando manter integrado e uniforme todo o conhecimento das Escrituras, procurando formular um sistema de aprendizado acerca do conhecimento de Deus, que ao ser apresentado de forma progressiva nas Institutas, orienta uma compreensão correlata e contínua de temas amplos sobre Deus e a existência do homem. (Herminsten, Raízes da Teologia Contemporânea, 2004, p. 139-141). Entendemos que João Calvino desenvolvia uma teologia bíblica – estudo objetivo e particular de cada texto bíblico para extrair unicamente o tema ali exposto, à luz da orientação e contexto doutrinais das Escrituras, sendo que essa teologia bíblica era organizada em temas gerais – conforme Calvino entendia que a Bíblia mesmo os indicava, pelo pensamento dos Profetas e Apóstolos. “O primeiro livro, tratava do Deus criador e de sua soberania em relação àquilo que havia criado. O segundo livro, trata da necessidade de salvação do ser humano e de como alcançar essa redenção por meio de Cristo, o mediador. O terceiro livro, trata da maneira pela qual o ser humano se apropria dessa redenção, enquanto o último livro trata da igreja e de seu relacionamento com a sociedade (...) o único princípio que parece nortear a forma como ele organizou seu sistema teológico é, por um lado, a preocupação de ser fiel às Escrituras e, por outro lado, a obtenção de máxima clareza possível na apresentação dos temas.” (McGrath, p 103, 2005) “Em as “Institutas”, Calvino afirma claramente as crenças do protestantismo. Em um volume, o reformador aborda as crenças principais... Ele começou com o Credo apostólico, destacando quatro pontos: “Creio em Deus Pai (...) Jesus Cristo (...) o Espírito Santo (...) e na santa igreja universal” – que correspondem às quatro sessões do livro. Em cada uma, Calvino buscava não apenas afirmar uma teologia, mas procurava aplica-la à vida cristã. (...) Calvino concentrou-se de forma veemente na soberania de Deus... o reformador repetia: “Você não pode manipular Deus ou torna-lo seu devedor. Ele é quem o salva; pois você não pode fazer isso por si mesmo.” (...) No livro quatro, Calvino criou uma ordem eclesiástica baseada no que ele observava nas Escrituras. A congregação deveria eleger homens de boa moral – os presbíteros ou anciãos – que seriam os responsáveis por guiar a igreja. Ele também abordou a questão dos pastores, doutores (mestres) e diáconos. As doutrinas e a política reformada, que criou, espalharam-se pela Escócia, Polônia, Holanda e América.” (Curtis, Os 100 acontecimentos mais importantes da história do cristianismo, p 117-119, 1991) Sendo fundador da Universidade de Genebra, humanista cristão, dedicado estudioso da Bíblia e reconhecido como literato entre acadêmicos, Calvino fomentou através de sua doutrina e liderança o início de um movimento de transformação na religião e sociedade que influenciou gerações em diversas nações. As Igrejas Reformada e Presbiteriana do Brasil carregam consigo as doutrinas deste reformador, conquanto, porém, qualquer movimento protestante jamais possa negar diversas influências teológicas ou éticas que saíram do entendimento deste homem que, junto a Martinho Lutero, tornou-se um dos líderes da Reforma Protestante. Acerca das Confissões de Fé, anotamos o seguinte pensamento de Calvino: "De bom grado concedemos que, se há disputa acerca de algum dogma, não existe melhor e mais correto meio do que reunir um concílio de bispos verdadeiros, no qual se examine o dogma em litígio; pois muito maior autoridade terá a determinação conveniada em comum pelos pastores das igrejas, depois de invocar o Espírito de Cristo, do que se cada um ensinasse ao povo por sua iniciativa particular, ou que o fizessem uns tantos em particular. Além do mais, quando os bispos se reúnem, tem mais oportunidade para comparar e observar o que devem ensinar, e em que forma, e assim conseguir unanimidade, a fim de que a diversidade não engendre escandâlo". (Simões apud Institutas, vol. II, p. 65, 2012). Referências. MCGRATH, Alister. A Revolução Protestante. tradução Lena e Regina Aranha. Brasília - DF: Palavra, 2012. SIMÕES, Ulisses. A Subscriação Confessional. Necessidade, Relevância e Extensão. Belo Horizonte: Efrata Publicações e Distribuição, 2002. Autor. Ivan S Ruppell Jr é Professor de Ciências da Religião e Teologia no Seminário Presbiteriano do Sul extensão Curitiba e Uninter.

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