terça-feira, 26 de setembro de 2023

A Espiritualidade do ENGANO, no Cinema. CRUZADA, de Ridley Scott, 2005.

O filme "Cruzada", do diretor Ridley Scott é talvez o maior épico do século 21 na Sétima Arte, apresentando com bom enredo e emoções diversas alguns valiosos temas culturais e históricos acerca das Cruzadas Cristãs da Idade Média. Após os muçulmanos terem conquistado diversas regiões no Oriente, vindo a dificultar e proibir a peregrinação dos cristãos até Jerusalém, o Papa Urbano II convocou lideranças monarcas e a população para guerrear em busca da reconquista da cidade e terras santas, aos cristãos. A narrativa do filme utiliza a essência de um fato histórico em que houve batalhas e uma trégua acordada entre cristãos e muçulmanos, a qual foi concluída com a entrega da cidade de Jerusalém ao Líder do Islâ, Saladino, num período ocorrido entre a Segunda (1147-1149) e Terceira (1189-1192) Cruzadas. O título original do filme, Kingdom of Heaven, que se traduz: Reino dos Céus, destaca a importância das regiões denominadas "terras santas" para os cristãos medievais, bem como, do essencial valor religioso da própria Cidade de Jerusalém. No entanto, o título original também nos leva a refletir sobre a Espiritualidade do Engano religioso que podemos anotar ao assistir o filme "Cruzada". Tudo a partir de um raciocínio dado exatamente por Jesus Cristo - fundador do Cristianismo, quando ensinou que a Nova Aliança e Religião que ele estava promulgando na terra para religar os homens aos céus, não deveria estar baseada em lugares, mas sim, na realidade espiritual interior dos seres humanos. Dá uma olhada: "Jesus respondeu: `Creia em mim, mulher, está chegando a hora em que já não importará se você adora o Pai neste monte ou em Jerusalém. (...) Mas está chegando a hora, e de fato já chegou, em que os verdadeiros adoradores adorarão o Pai em espírito e em verdade. O Pai procura pessoas que o adorem desse modo. Pois Deus é Espírito, e é necessário que seus adoradores o adorem em espírito e em verdade`." (Evangelho de João, cap. 4. versos 21-24). Dessa forma, sem desprezar ou ignorar a importância histórica e sacra, artística e social dos lugares e templos do Cristianismo e de qualquer religião, o que importa é estar atento ao tema que iremos refletir: a Espiritualidade do engano! Pois, para o Cristianismo, a religião que conduz a pessoa humana para o Reino dos céus a fim de que encontre-se com Deus e junto d´Ele permaneça até a Ressurreição, e depois na vida eterna, bem, é um relacionamento que ocorre através de uma religação espiritual, não sendo essencial que venha ocorrer de forma localizada em espaços físicos definidos de nosso mundo. Tá entendendo? Por isso que o "reino dos céus" localizado numa região e cidade, como sendo um valor espiritual para o filme e também para as Cruzadas cristãs evidencia uma experiência religiosa que não traduz a essência da religação cristã, já que essa ocorre entre o espírito do ser humano e o Espírito de Deus. Afinal, Deus é Espírito, e assim os seus adoradores deverão adora-lo em espírito (interiormente) e em verdade (com sinceridade). No filme, o jovem francês Balian descobre que é filho de um Barão fiel ao Rei de Jerusalém, algo que o faz honrar essa dedicação familiar através de uma viagem para a cidade santa. Nessa ocasião, ele se vê envolvido nas questões políticas e atos de guerra que dominavam a região e colocavam em lados opostos os Cristãos e Muçulmanos, sendo que Balian irá duelar e tratar do destino de Jesusalém, diante de Saladino, Rei dos Sarracenos. O enredo da experiência existencial de Balian é interessante, pois ele e um bom número de personagens do filme demonstram um padrão ético de honra que se perdeu no decorrer da história, especialmente a partir da razoabilidade da modernidade e do relativismo da pós modernidade. O diretor Ridley Scott conduz a narrativa do filme através de cenas espetaculares, seja na grandeza das batalhas e na realística apresentação de regiões e cidades, e ainda, na intimidade dos olhares e sensações críveis dados na interpretação valorosa de atores e atrizes. A espiritualidade cristã segue afirmando um encontro essencial entre o espírito consciente da personalidade interior do ser humano junto da Pessoa do Espírito de Deus, de modo que localidades e ambientes não devem jamais ser percebidos como o elemento fundamental para que vivenciemos um encontro real e verdadeiro com Deus, ao contrário. Outro engano espiritual percebivel no filme, e que pode-se entender a partir do engano religioso do falso valor dado aos ambientes físicos da fé é um essencial engano institucional da Cristandade. Jesus disse que a partir de sua vinda o Reino dos Céus não seria mais tomado pela força, e igualmente também não iria se mover no espírito humano pela força dos homens. Portanto, qualquer atuação social do Cristianismo como Instituição e qualquer ser humano que venha a ser conquistado para o Reino dos Céus, não é algo que vai ocorrer pela opressão de autoridades religiosas ou pela dominação de lideranças de guerra. Mas sim, pela força do Espírito Santo! De modo que o Cristianismo não promove batalhas de guerra pra dominar o espírito das pessoas e nem conquistar terrenos sacros; somente poderá defender os oprimidos e a liberdade religiosa de expressão, mas jamais iniciar os confrontos. Bom filme. Autor. Ivan S Rüppell Jr é autor do livro, a Espiritualidade de quase todo mundo no cinema, resenhas espirituais de meditações cinematográficas, com quase 40 resenhas espirituais de filmes, publicado em 2022, pela editora Dialética, São Paulo. Professor, advogado e ministro licenciado da Igreja Presbiteriana do Brasil.

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